Junho – Mês dedicado ao Sagrado Coração de Jesus

Ao longo deste mês de junho, e sobretudo no dia dedicado ao Sagrado Coração de Jesus, somos convidados a rezar por todo o clero — bispos, padres e diáconos. Inclusive, no dia do Sagrado Coração de Jesus, a Igreja celebra o Dia Mundial de Oração pela Santificação do Clero.

O mês de junho é especial para a Igreja, pois, além de ser dedicado ao Sagrado Coração de Jesus, celebramos outros três santos importantes e bem conhecidos de nosso povo: no dia 13, Santo Antônio; no dia 24, São João Batista; e no dia 29, São Pedro.(…)

Ao longo deste mês de junho, e sobretudo no dia dedicado ao Sagrado Coração de Jesus, somos convidados a rezar por todo o clero — bispos, padres e diáconos. Inclusive, no dia do Sagrado Coração de Jesus, a Igreja celebra o Dia Mundial de Oração pela Santificação do Clero. Portanto, reze por seu pároco, pelo padre que você conhece ou que já fez parte de sua vida, pelo bispo e por todo o clero, para que todos os padres busquem viver a santidade no dia a dia, a exemplo de Jesus.

É necessário sempre rezar pela santificação do clero e pelas vocações de maneira geral. É preciso rezar para que os sacerdotes perseverem em sua vocação, caminhantes para a santidade e sejam mansos, humildes e acolhedores, à semelhança de Jesus. Devemos pedir ao Sagrado Coração de Jesus que nunca faltem sacerdotes entre nós, pois, sem eles, não há Eucaristia nem os demais sacramentos.

A festa do Sagrado Coração de Jesus, neste ano, será no dia 27 de junho, pois ocorre sempre uma semana após a Solenidade de Corpus Christi, que, por sua vez, acontece sessenta dias após a Quinta-feira Santa. É por isso que a Páscoa é o centro do calendário cristão: todas as demais festas e solenidades se organizam a partir dela. Assim, temos o mês inteiro para rezar e pedir a intercessão do Sagrado Coração de Jesus.

Ao longo deste mês, também são chamados novos membros para compor o grupo do Apostolado da Oração e, na Solenidade do Sagrado Coração, os novos integrantes recebem a fita. O grupo do Apostolado da Oração se reúne durante o ano, em geral, todas as primeiras sextas-feiras de cada mês — dia votivo ao Sagrado Coração de Jesus — para participar da Hora Santa e da Santa Missa. Durante a Hora Santa, unem-se em oração pela Igreja e por todo o clero.

É importante trazer novos membros a cada ano, para renovar o grupo e garantir sua continuidade. Todas as paróquias devem ter um grupo ativo do Apostolado da Oração, pois ele reza pelas intenções do padre e de todos os paroquianos.

Seria interessante que, ao longo deste mês, as paróquias colocassem em destaque a imagem do Sagrado Coração de Jesus, junto à bandeira do Apostolado da Oração, e que se intensificassem as orações por toda a Igreja, especialmente para que os padres sejam santos, conforme o Coração de Jesus.

No dia dedicado ao Sagrado Coração, as paróquias podem promover uma Hora Santa vocacional com o grupo do Apostolado da Oração e, em seguida, celebrar a Eucaristia, conforme já acontece nas primeiras sextas-feiras do mês. O dia do Sagrado Coração de Jesus, e o mês de junho como um todo, é tempo de alegria para o Apostolado da Oração, pois seus membros renovam o compromisso de rezar pelos sacerdotes e pela Igreja, além de acolher novos participantes.

Quem participa de qualquer pastoral na Igreja deve ser alegre, por servir à Igreja de Cristo. Servir deve ser um gesto de amor, jamais de obrigação. E tudo o que fazemos por amor, fazemos com alegria.

O dia do Sagrado Coração de Jesus é também um momento de recolhimento e oração, em que devemos agradecer a Deus pelo Papa, por nosso bispo diocesano e por nosso pároco. Devemos rezar pelos seminaristas que se preparam para o sacerdócio, para que sejam bons padres e atendam com fidelidade ao povo que lhes for confiado. Os sacerdotes precisam muito de oração; é a oração do povo de Deus que sustenta a vida do padre.

Além do Apostolado da Oração, algumas paróquias também possuem o MEJ (Movimento Eucarístico Jovem), voltado para adolescentes e jovens que se unem em oração diante do Santíssimo.

Não podemos deixar que o grupo do Apostolado da Oração se enfraqueça ou acabe em nossas comunidades. Devemos buscar constantemente renovar suas forças e atrair novos membros, para que essa missão continue. Por isso, é essencial celebrar, a cada ano, a entrada de novos participantes. O Apostolado da Oração é muito importante, pois intercede pela Igreja de modo especial: cuida e zela da Eucaristia, estando intimamente ligado a Jesus.

Para participar do grupo do Apostolado da Oração é a disponibilidade para rezar, em especial o oferecimento do dia, participar uma vez por mês da Adoração ao Santíssimo e da reunião mensal com o grupo. Outra missão que os membros podem realizar é visitar os doentes junto com os Ministros da Eucaristia — inclusive, alguns são também ministros extraordinários da Comunhão — visitar os idosos e oferecer alimento aos que mais necessitam.

O Apostolado da Oração, além de rezar pela Igreja e pelo sacerdote, intercede por toda a paróquia e por suas diversas atividades. Algumas comunidades têm apenas 4, 5 ou 6 membros nesse grupo; por isso, é preciso que o padre incentive, ao longo do ano, a adesão de novos integrantes, para que, no próximo ano, o grupo esteja ainda mais forte.

O mês dedicado ao Sagrado Coração de Jesus é mais do que uma devoção. Que o amor de Cristo, que brota de seu Coração, inunde a Igreja e toda a terra. A humanidade precisa de mais amor e menos guerra — e só alcançaremos a paz se nos unimos em oração diante do Sagrado Coração de Jesus.

Cardeal Orani João Tempesta,
O. Cist. - Arcebispo Metropolitano de São Sebastião do Rio de Janeiro, RJ

O Conclave, passo a passo

O Conclave que se vai iniciar a 7 de maio, para eleição do Papa, obedece a rituais precisos, marcados por um clima de silêncio e segredo, seguindo as normas da Constituição Apostólica ‘Universi Dominici Gregis’, assinada por João Paulo II em 1996.

O documento foi alterado, nalguns pormenores, por Bento XVI, em 2007 e em fevereiro de 2013, poucos dias antes do fim do pontificado.

O Conclave, palavra com origem no latim ‘cum clavis’ (fechado à chave), pode ser definido como o lugar onde os cardeais se reúnem em clausura para eleição do Papa.

Segundo as normas atuais da Igreja Católica, apenas cardeais com menos de 80 anos podem votar, numa cerimónia que decorre em estrita confidencialidade na Capela Sistina.

Para a eleição de um novo Papa é necessária uma maioria de dois terços [89 dos atuais 133 eleitores] e as votações continuam até que um candidato obtenha a maioria necessária.

Salvo na tarde da entrada no Conclave (7 de maio, pelas 16h30 de Roma), tanto na parte da manhã como na parte da tarde, imediatamente depois de uma votação na qual não se tenha obtido a eleição, os cardeais eleitores procedam logo a uma segunda – sem a obrigação de prestar um novo juramento.

Se após três dias e escrutínios o resultado continuar a ser inconclusivo, as votações serão suspensas durante um dia, no máximo, para uma pausa de oração, de colóquio entre os votantes e de reflexão espiritual.

Estão previstas três séries de sete escrutínios, com novas pausas, caso a eleição se prolongue. 

Escolha da data

João Paulo II determinou que desde o momento em que a Sé Apostólica ficar legitimamente vacante [morte ou renúncia do Papa], os cardeais eleitores presentes em Roma devem esperar, durante 15 dias completos, pelos ausentes; decorridos, no máximo, 20 dias desde o início da Sé vacante, todos os cardeais eleitores presentes são obrigados a proceder à eleição.

Bento XVI abriu a possibilidade deste tempo ser antecipado desde que estejam presentes “todos os cardeais eleitores”.

No início do Conclave, os cardeais tomam Deus e os Evangelhos como suas testemunhas num juramento de “segredo absoluto” sobre todos os procedimentos que ali irão ter lugar.

 

Os eleitores

Entram em Conclave para eleger o Papa apenas os cardeais que não tenham já cumprido 80 anos de idade no primeiro dia da Sé vacante.

O número máximo de cardeais eleitores fixado por Paulo VI em 120 tem sido derrogado, na prática, pelos seus sucessores.

O Colégio Cardinalício tem hoje 252 membros (133 eleitores).

No Conclave vão estar presentes D. Manuel Clemente, patriarca emérito de Lisboa; D. António Marto, bispo emérito de Leiria-Fátima; D. José Tolentino Mendonça, prefeito do Dicastério para a Cultura e Educação; e D. Américo Aguiar, bispo de Setúbal, todos criados pelo Papa Francisco.

108 dos cardeais eleitores foram escolhidos pelo Papa Francisco, 21 por Bento XVI e 4 por São João Paulo II.

Ao longo do seu pontificado, Francisco convocou dez Consistórios, nos quais criou 163 cardeais, entre eles os quatro eleitores portugueses.

Se um cardeal tiver recusado entrar no Conclave, não poderá ser posteriormente admitido no decorrer nos trabalhos, mas o mesmo não acontece se um cardeal adoecer durante o processo da eleição do novo Papa.

Segundo a legislação da Igreja, “nenhum cardeal eleitor poderá ser excluído da eleição, quer ativa quer passiva, por nenhum motivo ou pretexto”.

Desde 2013, quando os cardeais eleitores da Europa representavam 56% do total, Francisco tem vindo a alargar as fronteiras das suas escolhas, com uma mudança mais visível no peso específico da África, Ásia e Oceânia – então com 22 cardeais eleitores na soma dos três continentes.


Neste Conclave, a Europa representa 38% do total, com 51 eleitores (alguns dos quais com responsabilidades eclesiais noutros continentes), a América com 37, a Ásia com 23, África com 18 e a Oceânia com 4.

Os países com mais cardeais no Conclave, entre as 71 nações representadas (49, em 2013)  são  Itália (17 cardeais), EUA (10), Brasil (7), França (5), Argentina, Canadá, Espanha, Índia, Polónia e Portugal (4 cada), num total de 63 cardeais (47% do total).

 

Quem pode ser eleito Papa?

Ainda que, em teoria, qualquer homem batizado, solteiro e em comunhão com a Igreja Católica possa ser eleito Papa, há quase 650 anos que o escolhido é um cardeal: o último pontífice vindo de fora do Colégio Cardinalício foi Urbano VI, arcebispo de Bari (Itália) em 1378.

O último não cardeal sem qualquer ordem sacra no momento da eleição pontifícia foi Leão VIII, a 4 de dezembro de 963, consagrado bispo dois dias depois.

O último não cardeal a ser eleito, como diácono, para o pontificado romano foi Gregório X, a 1 de setembro de 1271, que seria ordenado bispo em março do ano seguinte; o último cardeal a ser eleito Papa, ainda diácono, foi Leão X, em 1513.

A última vez que um cardeal, ainda padre, foi eleito Papa aconteceu a 2 de fevereiro de 1831, com Gregório XVI, ordenado bispo quatro dias depois.

Cada cardeal é inserido na respetiva ordem (episcopal, presbiteral ou diaconal), uma tradição que remonta aos tempos das primeiras comunidades cristãs de Roma, em que os cardeais eram bispos das igrejas criadas à volta da cidade (suburbicárias) ou representavam os párocos e os diáconos das igrejas locais.

 

Pessoas no Conclave

Além dos cardeais eleitores, está prevista no Conclave a presença de outros elementos, “para acudirem às exigências pessoais e de serviço, conexas com a realização da eleição”: o secretário do colégio cardinalício (D. Ilson de Jesus Montanari), que desempenha as funções de secretário da assembleia eleitoral; o mestre das celebrações litúrgicas pontifícias (D. Diego Ravelli), com oito cerimoniários (número determinado por Bento XVI) e dois religiosos adscritos à sacristia pontifícia; um eclesiástico escolhido pelo cardeal decano (D. Giovanni Battista Re) ou quem o substitui, para lhe servir de assistente; alguns religiosos de diversas línguas para as confissões, bem como dois médicos e enfermeiros para eventuais emergências; as pessoas adscritas aos serviços técnicos, de alimentação e de limpeza; os condutores que transportam os eleitores entre a Casa de Santa Marta e o Palácio Apostólico.

Todas elas são “devidamente advertidas sobre o significado e a extensão do juramento a prestar, antes do início das operações para a eleição”, pelo que prestam e subscrevem o juramento de segredo sobre tudo o que rodear o processo de eleição do novo Papa, sob pena de excomunhão.

 

Lugares do Conclave

João Paulo II decidiu que os cardeais ficassem alojados na denominada Casa de Santa Marta, situada no Vaticano, junto à Basílica de São Pedro.

Em 2005, pela primeira vez na história, os lugares do Conclave estenderam-se a todo o espaço do Vaticano.

Os cardeais eleitores continuam a estar submetidos à interdição de qualquer contacto com o exterior, mas não ficam encerrados num único local.

Com estas normas, os cardeais ocupam vários sítios consoante as suas atividades: o alojamento é na Casa de Santa Marta, as celebrações litúrgicas na Capela de Santa Marta – eventualmente noutras capelas -, e a eleição na Capela Sistina.

Os lugares do Conclave serão fechados por dentro (responsabilidade do cardeal camerlengo, D. Kevin Joseph Farrel) e por fora (responsabilidade do substituto da Secretaria de Estado, o arcebispo Edgar Peña Parra).

Desde as primeiras assembleias cristãs romanas aos cardeais, em 1179, a eleição de um novo Papa aconteceu quase sempre em Roma, em particular na Capela Sistina.

Nem todos os conclaves, contudo, tiveram lugar no Vaticano: cinco aconteceram no Quirinal, atual palácio da presidência da República Italiana; 16 decorreram noutras cidades italianas e sete em França, no período de Avinhão.

Esta será a 26ª vez que o Conclave decorre na Capela Sistina, que foi encerrada ao público e inspecionada para detetar equipamentos audiovisuais destinados a espiar os escrutínios.

As janelas foram obscurecidas, sobre o pavimento original foi construída uma plataforma e introduziram-se duas salamandras: numa queimam-se os boletins de voto e notas escritas pelos prelados, enquanto que noutra é produzido o fumo negro ou branco que manifesta para o exterior o resultado dos sufrágios.

São João Paulo II (1920-2005) referiu-se ao ‘Juízo Final’ na constituição ‘Universi Dominici Gregis’, que regula a escolha do Papa: “Disponho que a eleição continue a desenrolar-se na Capela Sistina, onde tudo concorre para avivar a consciência da presença de Deus, diante do qual deverá cada um apresentar-se um dia para ser julgado”.

Capela Sistina deve o seu nome a Sisto IV, Papa entre 1471 e 1484, que promoveu as obras de restauro da antiga Capela Magna a partir de 1477.

 

Início do Conclave

Está previsto que todos os cardeais se encontrem na Basílica de São Pedro para celebrar a Missa votiva ‘pro eligendo Romano Pontifice’ (para a eleição do Papa), sob a presidência do decano do Colégio Cardinalício, D. Giovanni Battista Re, às 10h00 (menos uma em Lisboa) do dia 7 de maio.

Pelas 16h30 do mesmo dia, os cardeais eleitores reúnem-se na Capela Paulina do Palácio Apostólico, de onde se dirigem para a Capela Sistina, em procissão solene, entoando o canto ‘Veni Creator’, para pedir a assistência do Espírito Santo.

Participam na procissão o vice-camerlengo (o arcebispo brasileiro D. Ilson de Jesus Montanari), o auditor geral da Câmara Apostólica e dois membros de cada um dos Colégios dos protonotários apostólicos, dos prelados auditores da Rota Romana e dos prelados clérigos de Câmara.

Os cardeais eleitores prestam, em primeiro lugar, o juramento de segredo sobre tudo o que diz respeito à eleição do Papa e comprometem-se a desempenhar fielmente o ‘munus Petrinum’ casos sejam escolhidos como o novo pontífice.

Terminado o juramento, todas as pessoas estranhas à eleição saem após a ordem ‘Extra Omnes’ (todos fora), dada pelo mestre das celebrações litúrgicas, D. Diego Ravelli, que permanece na sala junto com o eclesiástico escolhido para a segunda meditação, o cardeal Raniero Cantalamessa, saindo ambos no final da reflexão.

Estes momentos de reflexão estão previstos na Constituição Apostólica ‘Universi Dominici Gregis’ (UDG, n. 13) e são outra das novidades da Sé Vacante, introduzidas por João Paulo II: a última meditação diz respeito à escolha “iluminada” do Papa.
Os lugares do Conclave serão fechados por dentro (responsabilidade do cardeal camerlengo, D. Kevin Joseph Farrel) e por fora (responsabilidade do substituto da Secretaria de Estado, o arcebispo Edgar Peña Parra).

A partir desse momento, os cardeais eleitores encontram-se a sós, na Capela Sistina, com os seus pares e todos os meios de comunicação com o exterior são proibidos.

O primeiro dos cardeais por ordem e por antiguidade [D. Pietro Parolin, secretário de Estado do Vaticano] pronuncia um juramento em que se compromete a “observar com a máxima fidelidade para com todos, seja clérigo ou leigo, o segredo sobre tudo aquilo que de qualquer modo diz respeito à eleição do Romano Pontífice e sobre aquilo que estiver no lugar da eleição”.

O cardeal Parolin preside à eleição – dado que o decano, D Giovanni Battista Re, que dirigiu a eleição de 2013, e o vice-decano, D. Leonardo Sandri, têm mais de 80 anos de idade – verificando se não há obstáculos e procede-se à primeira votação; preside também aos momentos previstos pela liturgia própria.

Os conclaves do século XX tiveram uma duração sempre inferior a cinco dias e 14 votações.

 

Votação

O processo do escrutínio compreende a preparação e a distribuição das fichas pelos cerimoniários, – entretanto chamados para dentro do lugar da eleição juntamente com o secretário do Colégio dos Cardeais e com o mestre das celebrações litúrgicas pontifícias – que entregarão ao menos duas ou três a cada um dos cardeais eleitores; a extração à sorte entre todos os cardeais eleitores de três escrutinadores (responsáveis pela soma dos votos), três encarregados de ir recolher os votos dos doentes (infirmarii) e três revisores; esse sorteio é feito em público pelo último cardeal da ordem dos diáconos, o qual extrairá sucessivamente os nove nomes daqueles que deverão desempenhar tais funções.

Pela terceira vez na história da Igreja está prevista apenas uma modalidade de votação, ‘per scrutinio’, abolindo modos de eleição anteriormente existentes (por inspiração e por compromisso).

Para a eleição é requerida uma maioria de “pelo menos dois terços dos sufrágios, calculados com base nos eleitores presentes e votantes”.

No primeiro dia haverá apenas uma votação e, se o Papa não for eleito, terão lugar nos dias seguintes duas eleições de manhã e outra duas de tarde.

Se após três dias não houver consenso, há uma interrupção, no máximo de um dia, para oração, diálogo entre os eleitores e reflexão espiritual; prossegue-se, depois, para outros sete escrutínios antes de outra pausa e assim sucessivamente.

Se as votações não tivessem êxito, após um período máximo de nove dias de escrutínios e “pausas de oração e livre colóquio”, o documento de João Paulo II abria a hipótese de a eleição ser feita “com a maioria absoluta dos sufrágios”, situação que foi revogada por Bento XVI em 2007, mantendo-se a opção de se votarem “somente os dois nomes que, no escrutínio imediatamente anterior, obtiveram a maior parte dos votos”, mas neste caso sem que os candidatos em causa possam votar.

 

Voto

A votação acontece com o preenchimento anónimo de um boletim retangular, que apenas traz impressa a menção ‘Eligo in Summum Pontificem’ (elejo como Sumo Pontífice) na parte superior.

Na metade inferior está o espaço para escrever o nome do eleito, pedindo-se que os cardeais disfarcem a sua caligrafia.

O boletim é dobrado em dois e é levado de forma visível ao altar, onde está colocada uma urna, onde os cardeais, por ordem de criação, pronunciam o juramento: “Invoco como testemunha Cristo Senhor, o qual me há de julgar, que o meu voto é dado àquele que, segundo Deus, julgo deve ser eleito”.

O cardeal deposita o seu voto na urna, tapada pelo prato no qual o boletim tinha sido colocado.

 

Recolher e queimar

Os três escrutinadores sorteados no início do processo abrem cada um dos boletins, lendo o seu conteúdo em voz alta; os votos são perfurados onde está escrita a palavra “eligo” e presos num fio.

No final da recontagem são ligados com um nó, colocados num recipiente e posteriormente queimados.

Se houver lugar a uma segunda votação, contudo, os votos dos dois escrutínios e “os escritos de qualquer espécie relacionados com o resultado de cada escrutínio” são queimados.

 

Fumata

Se o fumo que sai da chaminé da Capela Sistina for negro, significa que não houve acordo entre os cardeais; se for branco, que foi escolhido o novo Papa.

O Vaticano usa desde 2005 uma salamandra para queimar boletins de votos e eventuais anotações dos cardeais e outro aparelho auxiliar, com fumígenos, para que a cor dos fumos se possa distinguir da melhor maneira possível.

O fumo branco é produzido num equipamento eletrónico através da mistura de clorato de potássio, lactose e resina, mistura que substitui a tradicional utilização de palha molhada na queima dos votos.

O fumo negro é obtido pela mistura de perclorato de potássio (usado em fogo de artifício), antraceno (hidrocarboneto aromático) e enxofre.

 

Eleição

Uma vez ocorrida a eleição, resta ao novo eleito responder a duas questões:’Acceptasne eletionem de te canonice factam in Summum Pontificem?’ (Aceitas a tua eleição, canonicamente feita, para Sumo Pontífice?) e  ‘Quo nomine vis vocari?’ (Como queres ser chamado?), naquele que é o último ato formal do Conclave.

O mestre das cerimónias litúrgicas é chamado, desempenhando funções de notário, e redige um documento de aceitação; dois cerimoniários entram e servem de testemunhas.

Este documento entrará em vigor imediatamente depois da sua publicação no jornal do Vaticano, ‘L’Osservatore Romano’, por determinação de Bento XVI.

Após a escolha do nome, cardeais prestam homenagem um a um os e apresentam a sua obediência ao novo Papa.

O anúncio é feito, em seguida, pelo cardeal protodiácono (Dominique Mamberti, cardeal francês de origem marroquina, presidente do Supremo Tribunal da Assinatura Apostólica) aos fiéis: ‘Annuntio vobis gaudium magnum: Habemus papam’ (Anuncio-vos uma grande alegria: temos Papa).

 

Fim do Conclave

O Conclave termina oficialmente com o assentimento dado pelo Papa eleito à sua eleição, a não ser que o próprio determine outro procedimento.

Catequese Quaresmal - Penitência

(Breves apontamento da Catequese do dia 09 de Abril)

Ide aprender o que significa: «Prefiro a misericórdia ao sacrifício. Porque Eu não vim chamar os justos, mas os pecadores.» Mt 9, 13

 «Porque Eu quero a misericórdia e não os sacrifícios, o conhecimento de Deus mais que os holocaustos.» Os 6, 6

 A Penitência leva à conversão, ou melhor, faz parte da conversão.

 Por isso mesmo, e porque a conversão começa no nosso interior, não se limita a aparências externas, é que a penitência também deve começar no nosso interior, embora depois tenha ou possa ter actos e gestos exteriores.

 Isso mesmo nos diz o Catecismo:
«Como já acontecia com os profetas, o apelo de Jesus à conversão e à penitência não visa primariamente as obras exteriores, «o saco e a cinza», os jejuns e as mortificações, mas a conversão do coração, a penitência interior: Sem ela, as obras de penitência são estéreis e enganadoras; pelo contrário, a conversão interior impele à expressão dessa atitude com sinais visíveis, gestos e obras de penitência.»

 

E depois afirma ainda

«A penitência interior é uma reorientação radical de toda a vida, um regresso, uma conversão a Deus de todo o nosso coração, uma rotura com o pecado, uma aversão ao mal, com repugnância pelas más acções que cometemos. Ao mesmo tempo, implica o desejo e o propósito de mudar de vida, com a esperança da misericórdia divina e a confiança na ajuda da sua graça. Esta conversão do coração é acompanhada por uma dor e uma tristeza salutares, a que os Santos Padres chamaram animi cruciatus (aflição do espírito), compunctio cordis (compunção do coração)».

 A conversão nasce do coração, mas não fica encerrada no interior do homem, e sim frutifica em obras exteriores, envolvendo a pessoa inteira, corpo e alma.

 O Senhor chama-nos, então, na Quaresma, mas também sempre, para que nos aproximemos d'Ele.

Quando nos aproximamos d’Ele somos colocados perante as nossas faltas, os nossos erros, (aproximamo-nos da Luz e por isso vemos mais claramente o que está mal em nós), mas isso não é para Ele nos condenar, mas antes pelo contrário, nos salvar, mostrando-nos o que precisamos mudar em nós.

 «A partir desse momento, Jesus começou a pregar, dizendo: «Convertei-vos, porque está próximo o Reino do Céu.» Mt 4, 17

Podemos perfeitamente trocar o “convertei-vos” por “fazei penitência” que aliás está em algumas traduções.

 Arrependei-vos e acreditai no Evangelho «Completou-se o tempo e o Reino de Deus está próximo: arrependei-vos e acreditai no Evangelho.» Mc 1, 15

 Nínive – fazei penitência Jn 3

Catecismo:

A penitência interior do cristão pode ter expressões muito variadas. A Escritura e os Padres insistem sobretudo em três formas: o jejum, a oração e a esmola que exprimem a conversão, em relação a si mesmo, a Deus e aos outros. 

 A penitência exige de nós um bom exame de consciência, que verdadeiramente até nos serve, depois, para o Sacramento da Penitência ou Confissão.

 Procuramos assim, em oração, pedindo o discernimento do Espírito Santo, tudo aquilo que precisamos mudar e a melhor forma de o fazer.

 Então, obviamente, em primeiro lugar vem a oração quer nos liga a Deus e nos ajuda a encontrar o caminho de Sua vontade – Eucaristia, adoração ao Santíssimo “no sacrário” e  a oração perseverante.

 Depois procurarmos o que podemos fazer connosco e com os outros para mudarmos o que está mal em nós, mas dando testemunho silencioso com a nossa vida para que outros encontrem também o caminho da salvação.

Percebermos que a penitência não deve prejudicar-nos – não devemos cometer excessos, mas aquilo que realmente podemos fazer.

 Não querer fazer tudo, mas encontrar o que realmente me muda, me converte e de alguma forma pode ajudar o outro – a esmola.

Por exemplo com a nossa vida comprometer-nos a:
Fazer aquilo que temos de fazer sem preguiça nem deixar andar.
Cumprir o plano que traçámos para a nossa oração e leitura da Palavra
Usar então da máxima caridade para com os outros a começar em casa
Reagir com bom humor e paciência aos imponderáveis da vida
Não querer falar primeiro que os outros
Ser capaz de escutar até aqueles que são incómodos
Ouvir criticas e conselhos não os colocando logo de lado mas reflectindo sobre eles
Estar atento aos gestos de enfado
Estar atento à inveja que todos julgamos não ter mas ….
E, claro, controlar a comida, a bebida, enfim, os prazeres do mundo
Mansidão Aceitação Paciência Silêncio

Há uma outra palavra que é praticamente sinônimo de penitência: MORTIFICAÇÃO.

Não falamos, obviamente, de usar cilícios ou coisas parecidas, mas sim em “morrermos” para determinadas coisas que nos afastam de Deus.

Quanto nos mortificamos, fazemos morrer as nossas pequenas vontades, como uma espécie de “treinamento do espírito”. 

 

Fazer penitência é morrer um pouquinho a cada dia, por amor. 

 E assim, a cada pequena morte diária, mais damos espaço em nosso coração para que o Espírito Santo viva em nós, pois “é morrendo que se vive para a vida eterna”!

 A Penitência é um treino para a santidade.
A mortificação não é um fim, mas sim um meio de chegar à santidade.

 E depois, claro, o Sacramento da Penitência bem celebrado.
Lembremo-nos de uma das mensagens de Fátima:

“Penitência, penitência, penitência!”, pedia o anjo com voz forte, segurando uma espada de fogo na mão esquerda, com chamas que ameaçavam incendiar o mundo. Essa foi a visão dos Três Pastorinhos, o Terceiro Segredo de Fátima.

 

 Joaquim Mexia Alves

 

 

 

 

Jejum e Abstinência: Como, porquê e para quê?

Jejum e abstinência são, antes de tudo, formas de penitência e instrumentos de conversão que Cristo e a Igreja nos propõem em especial neste tempo da Quaresma. São oportunidades para nos tornarmos melhores, para repormos equilíbrios perdidos na nossa vida. Toda a penitência constitui também uma forma de união ao Mistério da Cruz. Com Jesus, morremos para o que nos faz mal e preparamo-nos para a Vida verdadeira que Ele nos oferece.

Muitas vezes, jejum e abstinência são práticas muitas vezes confundidas entre si, por ambas dizerem respeito, na origem, à alimentação. Tradicionalmente, fazia-se jejum limitando a alimentação diária a uma refeição, embora não se excluísse que se pudesse tomar alimentos ligeiros às horas das outras refeições.

Durante muito tempo, a abstinência traduzia-se em não comer carne, alimento tradicionalmente mais caro e conotado com ocasiões festivas. A industrialização da produção de carne tornou-a mais acessível em termos de preço e de disponibilidade no dia a dia. Ao mesmo tempo, certos peixes e mariscos tornaram-se alimentos de luxo, pelo custo e raridade. Até uma dieta vegetariana pode mais dispendiosa.

Mais importante do que aquilo que comemos é o espírito com que o fazemos. A abstinência deve ser entendida como privação voluntária de alimentos requintados e saborosos (ou que sejam os nossos favoritos, independentemente do preço e sofisticação), em favor de uma alimentação mais simples e pobre.

Somos convidados ao jejum em dois dias: na Quarta-Feira de Cinzas, primeiro dia da Quaresma, e na Sexta-Feira Santa, ocasião em que contemplamos a Paixão e Morte de Jesus. 

A abstinência é praticada em todas as sextas-feiras da Quaresma. A Igreja propõe que seja estendida a todo o ano, com exceção de datas que a Liturgia considera solenidades.

O jejum e a abstinência podem ser entendidos de forma mais abrangente, para lá do simples contexto da alimentação. Na Carta aos Filipenses, diz-nos São Paulo: “Sei passar por privações, sei viver na abundância. Em toda e qualquer situação, estou preparado para me saciar e passar fome, para viver na abundância e sofrer carências. De tudo sou capaz naquele que me dá força”. (Fil 4, 12-13). Não é a simples falta ou fartura de algo que faz de nós melhores ou piores seguidores de Cristo!

A prática da moderação é sempre virtuosa, à mesa e não só. Além das questões da saúde, os prazeres e alegrias da vida são legítimos desde que fundados numa relação equilibrada com Deus e com os outros. Os abusos acabam sempre por nos condicionar e prejudicar, a nós e aos que vivem connosco. Jejuar e praticar a abstinência são formas de pormos à prova as nossas dependências, os nossos apegos. Se como ou bebo em excesso, fazendo dos momentos à mesa o centro da minha vida, preciso de fazer mudanças profundas. O mesmo é válido para outros hábitos: o uso do telemóvel e das redes sociais, as horas passadas em frente à televisão, a relação com os jogos de sorte e de azar – tudo isso pode ser inocente ou resvalar para o abuso, para a obsessão.

Procuremos também ganhar consciência daquilo que, não sendo em si mau, tão-pouco acrescenta qualquer valor à nossa vida, acabando por ser um desperdício de tempo e energia.

Até nas coisas aparentemente mais saudáveis podemos cair em excessos nocivos: o desporto e o exercício físico, por exemplo, são recomendáveis para quase toda a gente, em função da sua idade e condições físicas, mas é comum vermos pessoas completamente dedicadas ao culto do corpo, da juventude e da beleza, ou obcecadas com superar os seus próprios limites, num jogo de fuga ou vaidade em que não estão a vencer, muito pelo contrário.

A moderação e a privação voluntária de algo, definitiva ou não, são formas de exercitarmos a nossa liberdade e autodomínio, e de avaliarmos o estado da nossa relação com as pessoas e com as coisas. Muitas vezes, temos hábitos tão enraizados que só percebemos que são maus quando experimentamos interrompê-los. Há quem não passe sem vários cafés diários ou sem um copo de vinho a todas as refeições. Há quem fique surpreendido com o tempo que passa a olhar para o telemóvel, a navegar na internet ou a assistir a programas televisivos sobre o seu desporto preferido.

Há hábitos que são verdadeiros vícios. Uns, mais óbvios: o alcoolismo, o tabagismo, as toxicodependências. Outros vícios, como lembrava o Papa Francisco há alguns anos, são mais discretos, mas nem por isso menos nefastos. Sem dar por isso, posso ser viciado no interesse ilegítimo e desproporcionado na vida alheia e na pura maledicência. Ou na inveja.

Posso ter-me viciado em andar sempre com o tempo contado: saio de casa demasiado tarde para o trabalho, para a escola ou outros compromissos, deixo as pessoas sistematicamente à minha espera, faço uma condução perigosa…

Talvez tenha como vício uma certa atitude de vitimização e dependência crónica da ajuda alheia, abusando da boa-vontade dos outros.

Neste sentido, a penitência e, em especial, o jejum e a abstinência podem ajudar-me a combater os meus defeitos, os meus pecados “de estimação” (aqueles que parece que já fazem parte de mim, da minha identidade e das minhas rotinas, que eu já tenho vergonha de confessar uma e outra vez). Sem me privar do necessário descanso do corpo e da mente, posso esforçar-me para começar o meu dia mais cedo, para combater a preguiça e a inércia. Posso fazer jejum de filmes, programas, conversas ou navegações online que alimentam a minha tendência para algum pecado específico. Posso abster-me de certas redes sociais que só me fazem mais vaidoso (ou, pelo contrário, mais inseguro sobre a minha vida ou o meu aspeto físico). Posso olhar de forma crítica para os meus gastos e ver em que é que posso ser mais poupado, menos consumista e até mais amigo do ambiente (prolongando a vida útil das roupas ou do telemóvel, por exemplo).

Há já muitos anos que se desafia os fumadores a aproveitarem a Quaresma para acabarem com o vício, dando o dinheiro que poupam aos mais necessitados. O jejum e a abstinência têm um sentido de renúncia a favor dos outros. As compras que eu evitar fazer neste período quaresmal vão libertar quantias que posso dedicar a uma instituição ou causa nobre. O tempo que eu poupo em frente aos ecrãs pode ser dedicado à oração ou a ir visitar uma pessoa sozinha, idosa ou doente. Parte da comida que eu compro pode ser oferecida à família que sabemos que passa necessidades.

Que novos hábitos e salutares poderei eu descobrir e cultivar? Leitura, desporto, voluntariado?...

Não se trata de cumprir preceitos ou obrigações. E também não queremos fazer as coisas apenas porque são custosas. Não é daí que lhes vem o valor! A penitência quaresmal deve ser vivida com o espírito certo: como uma oportunidade de crescimento pessoal, de aproximação a Deus e aos outros, de fortalecimento da nossa liberdade. Não estamos a bater recordes, nem a tentar impressionar os outros. Escusado será dizer que não se pretende que aproveitemos a aproveitar a Quaresma para uma dieta de emagrecimento ou para poupar para as férias ou o próximo computador!

Também no jejum e na abstinência temos de nos acautelar com um certo orgulho. Tenhamos presentes os ensinamentos de Jesus: “Tu, porém, quando jejuares, perfuma a cabeça e lava o rosto, para que os homens não percebam que jejuas, mas apenas o teu Pai, que está presente no que é oculto; e teu Pai, que vê o que está oculto, te dará a recompensa" (Mt 6, 18).

A recompensa começa já nesta vida terrena, em forma de saúde, equilíbrio, alegria, paz. E prolonga-se pela Eternidade a que Deus nos chama, todos os dias, em especial na Quaresma e na Páscoa!

 

Lúcio Gomes

Quaresma de 2025

A PALAVRA DE DEUS: FONTE DE ESPERANÇA

Talvez o homem que melhor compreendeu a relação entre a palavra de Deus e a esperança tenha sido um pagão, o centurião romano que, depois de ter suplicado a Jesus que curasse o seu servo doente, diante da disponibilidade imediata do Senhor, se declarou não digno que ele fosse a sua casa e lhe disse: “Diz uma só palavra e o meu servo será curado!” (Mt 8,8).

Bastava-lhe uma palavra de Cristo para ter esperança certa na salvação que Ele operou.

A fé permitiu ao centurião compreender que o que suscita esperança na palavra de Deus é o facto de ser, precisamente, uma palavra de Deus, isto é, a palavra que Aquele que faz todas as coisas dirige pessoalmente à nossa necessidade de salvação e de vida eterna.

Também Pedro o compreendeu num momento que poderia ter sido de desespero, porque todos tinham abandonado o Senhor e apenas alguns discípulos desajeitados e inseguros tinham ficado com Ele: “Senhor, a quem iremos? Tu tens palavras de vida eterna” (Jo6,68). As palavras de Jesus permaneciam para Pedro e os seus companheiros como o último fio de esperança numa plenitude de vida que podiam esperar apenas de Deus.

Mas porquê e como a esperança de Pedro, como a do centurião, podia agarrar-se à palavra de Cristo? O que é que dá à palavra do Senhor esta potência, esta solidez que permite abandonar-se a ela com todo o peso da vida com todo o peso da nossa vida que corre o risco de cair no desespero, na morte, no nada? O que é que permite a quem escuta esta palavra reconhecer que a Ele que a pronunciasse pode abandonar com toda a confiança? Isto é possível se a palavra do Senhor chega ao coração não como promessa de algo, mas como promessa de alguém, e de alguém que ama a nossa vida com um amor omnipotente, que pode tudo por aqueles que ama e se confiam a Ele. Muitos abandonaram Jesus, após o discurso sobre o pão da vida na sinagoga de Cafarnaum, dizendo: “Esta palavra é dura! Quem a pode escutar?” (Jo 6,60). Como é que a palavra de Jesus era para eles um motivo para se irem embora, quando para Pedro e os outros discípulos era a única razão para ficarem com ele?

O facto é que os primeiros tinham escutado a sua palavra, separando-a da sua fonte, o próprio Cristo. Pedro e os discípulos, pelo contrário, não podiam abstrair nenhuma palavra de Jesus da sua presença, isto é, da sua relação com Ele, da sua amizade. A palavra de Deus pode ser fonte de esperança se para nós Deus permanece a fonte da própria palavra. Só se escutamos a palavra da voz do Verbo presente, que nos olha com amor, é que ela pode alimentar em nós uma esperança inabalável, porque fundada numa presença que nunca falha. A palavra de Deus é uma promessa na qual não só aquele que promete é fiel, mas permanece incluído na própria promessa, porque Cristo nos promete Ele mesmo. “E eis que estou convosco todos os dias, até ao fim do mundo!” (Mt 28,20). A última palavra de Jesus, a última promessa antes de ascender ao céu, é a promessa de si mesmo à nossa vida, não só no fim dos tempos, mas cada dia, cada momento da vida.

Esta ligação indelével da palavra de Deus com a sua presença, tão radical desde que “o Verbo se fez carne e habitou entre nós” (Jo 1,14) até morrer na cruz por nós, é a consciência e a promessa de todo o Antigo Testamento. Como quando o Salmo 27 grita ao Senhor: “Se tu não me falas, sou como os que descem à sepultura!” (Sl 27,1). O homem tem dentro de si a consciência profunda, ontológica, de que, se Deus não lhe fala, se Deus não o cria a cada momento com a sua palavra, para ele é inevitável a morte, a dissolução da vida, porque Deus cria dizendo tudo no Verbo por meio do qual existem todas as coisas (cf. Jo 1,3).

Pode-se viver sem escutar a Palavra que nos faz com amor, mas assim faz-se experiência, como tantos hoje, de uma vida inconsistente, de uma vida dissipada, que escapa das nossas mãos incapazes de a segurar. Em vez disso, é-nos dada a graça de viver escutando, de viver no desejo de escutar o Senhor que está constantemente à porta da nossa liberdade, batendo e pedindo para entrar. É-nos dado viver escutando a sua voz que nos chama à comunhão com Ele (cf. Ap 3,20), a uma amizade infinita, permitindo assim que o Espírito gere em nós e entre nós uma vida nova, transbordante de esperança, não em alguma coisa, mas em Deus que cumpre a promessa da sua presença no mesmo instante em que a sua palavra a exprime.

 Dom Mauro-Giuseppe Lepori, OCist
A b a d e G e r a l d a O r d e m d e C i s t e r

Noções breves

A propósito do Jubileu e do seu significado espiritual ficam algumas palavras chave 

INDULGÊNCIA: remissão, perante Deus, da pena temporal devida aos pecados cuja culpa já foi apagada, que o fiel obtém mediante determinadas condições pela acção da Igreja. Pode ser parcial ou plenária, consoante liberta parcialmente ou na totalidade da pena temporal devida ao pecado.

   SATISFAÇÃO: A absolvição tira o pecado, mas não remedeia todas as desordens causadas pelo pecado. Para recuperar a perfeita saúde espiritual o pecador deve fazer mais alguma coisa para reparar os seus pecados – “satisfazer” ou “expiar” os seus pecados. A “satisfação” também se designa “penitência”.

   PENITÊNCIA: A penitência, ou satisfação, pode consistir na oração, num donativo, nas obras de misericórdia, no serviço do próximo, em privações voluntárias, sacrifícios e, sobretudo, na aceitação paciente da cruz que temos de levar. Tais penitências ajudam-nos a configurar-nos com Cristo.

   COMUNHÃO DOS SANTOS: O cristão que procura purificar-se do seu pecado e santificar-se com a ajuda da graça de Deus não se encontra só. Existe entre os fiéis que já estão na pátria celeste, os que foram admitidos à expiação no Purgatório e os que vivem ainda peregrinos na terra um constante laço de amor e uma abundante permuta de todos os bens, na qual a santidade de um aproveita aos demais. O recurso à comunhão dos santos permite ao pecador contrito ser purificado mais depressa e mais eficazmente das penas do pecado.

(Do Catecismo da Igreja Católica)

“…se defraudei alguém vou restituir-lhe quatro vezes mais.”

   O título deste artigo coloca-nos no episódio descrito por S. Lucas relativo à passagem de Jesus por Jericó, quando se dá o encontro com Zaqueu, chefe de cobradores de impostos.

   Esse encontro tem sido fonte inesgotável de reflexões, ensinamentos e inspiração para quantos o lêem e meditam, riqueza imensa para tantas homilias e comentários.

   São bem conhecidas as frases “Zaqueu, desce depressa”, “Tenho de ficar em tua casa”, “todos murmuravam entre si”, “era de pequena estatura”, “subiu a um sicómoro”, “Hoje veio a salvação a esta casa”.

   Mas, mais do que as atitudes, as frases ou os diálogos, é importante sublinhar o movimento no seu conjunto, que parte da inquietação interior de uma pessoa, passa por um arrependimento, leva a uma conversão e frutifica numa mudança de vida que se traduz em postura completamente nova para com o próximo.

   A vida de Zaqueu é o produto das suas opções e das circunstâncias em que vive. Ele não consegue alterar estas últimas, mas quer mudar as suas escolhas e procura uma ocasião, procura uma oportunidade, procura um caminho.

   Jesus sabe disso, conhece perfeitamente o que vai na alma de Zaqueu e não hesita em olhar com benevolência aquele que O procura cheio de esperança, não esperando um segundo para o chamar. Acolhendo com ternura o pecador que sente o peso da sua culpa, coloca-Se inteiramente junto dele, coloca-Se inteiramente na sua vida, partilhando a sua mesa, entrando em sua casa, passando a fazer parte da sua existência. Este é o momento de Deus, aquele em que se dá o milagre da transformação, da conversão, aquele em que o homem se encontra com Deus (tal como se canta no Precónio Pascal).

   Contudo, o processo não pára aqui. É um movimento que não termina, que prossegue sem cessar, que agora requer uma atitude de reparação. Zaqueu não larga esta oportunidade e, sentindo que foi perdoado por Deus, na pessoa do seu Filho, sentindo-se purificado pela misericórdia de Deus, quer reparar o mal que fez, quer contribuir para repor a justiça, quer pagar pelos danos que causou.

   Depois do PERDÃO, é a atitude de REPARAÇÃO. Esta é a atitude, é o movimento que o pecador arrependido sente na sua alma, que o leva a assumir gestos que sarem as feridas abertas pelo pecado. Ele sabe que o pecado foi perdoado, mas sente que há feridas por ele causadas. Esse impulso brota do fundo da alma, suscitado pelo Espírito Santo para completar a obra do Pai, concretizada pelo Filho na nossa humanidade.

   Na atitude expressa por Zaqueu, comum a todos os pecadores que se convertem, vemos o movimento que a Igreja ajuda a compreender como caminho para Deus e que o Magistério clarifica, tornando-o perceptível pelo uso da Razão.

   Este movimento nasce da inquietude no coração dos filhos de Deus, agita-se na nossa consciência pela noção do Bem e do Mal, leva a mente e o coração a procurar respostas, as quais surgem do nosso encontro pessoal com Deus, pela Pessoa de Jesus Cristo.

   Purificados do nosso pecado, reorientamos a nossa vida procurando desta vez fazer a vontade do Pai e, simultaneamente, reparar no tempo o mal causado, a chamada reparação temporal.

   A REPARAÇAO TEMPORAL pode ser concretizada de muitas formas e, tanto quanto nos é possível, fazemo-lo durante o nosso peregrinar terreno. Se o tempo da nossa vida na terra não no-lo permitir, essa reparação prosseguirá num “estado” de purificação depois da nossa sepultura, já fora do tempo e do espaço, num momento de PURGA (daí o termo “purgatório”).

   A fim de nos ajudar a concretizar essa reparação, que sentimos necessidade de fazer, para além dos actos penitenciais espontâneos e também da "satisfação" indicada pelo Confessor no Sacramento da Penitência, a Igreja apresenta-nos propostas que constituem para todos um precioso auxílio. São as chamadas “indulgências”, totais ou parciais, que fazem avançar, ou completam mesmo, o perdão da pena temporal.

   Com esse fim, são convocados regularmente tempos fortes de encorajamento e estímulo à conversão pessoal, actualmente a cada 25 anos, com o nome de “Ano Santo”, “Ano Jubilar” ou “Jubileu”. Durante os Jubileus somos convidados a realizar actos pessoais (“gestos de reparação”), que ajudem a completar a pena temporal.

   É precisamente aqui que entronca o que Zaqueu se comprometeu a realizar no movimento de conversão por ele vivido. Arrependido, perdoado pela Graça de Deus, pacificado com a Paz de Jesus, sente-se renascido e compromete-se a estender as suas mãos para o próximo, distribuindo pelos pobres metade dos seus bens.

   Além disso, compromete-se igualmente a restituir a quem ele prejudicou quatro vezes mais, num gesto penitencial para reparar o que fez de errado, concretizar o que devia ter feito e não fez, compensar o próximo pelo mal cometido, manifestando a alegria, o júbilo, pela salvação que lhe foi dispensada.

   O encontro de Zaqueu com Jesus foi, na verdade, um Jubileu de “salvação para aquela casa, por ele ser, também, filho de Abraão”, a quem “o Filho do Homem veio procurar e salvar” (cf. Lc 19, 10), possível a todos quantos O procuram.

Fernando Brites

Anos santos, anos jubilares ou Jubileus

   A tradição cristã de celebrar um ano jubilar, ou jubileu, começou no ano de 1300, no auge de uma época de ouro para a Europa, tendo sido instituído pelo Papa Bonifácio VIII na sequência de uma afluência de peregrinos aos túmulos de S. Pedro e S. Paulo muito superior ao habitual, desejosos de obter indulgências plenárias de reparação.

   A ida dessa enorme multidão a Roma no ano centenário do nascimento de Jesus Cristo, proveniente em grande parte do norte da Europa, foi possível devido à estabilidade política e social existente, à facilidade de viajar, ao desenvolvimento da agricultura e da produção de alimentos, ao florescimento cultural (criação de universidades, surgimento das catedrais góticas, florescimento da polifonia, da literatura e das artes plásticas), ao crescimento das cidades, permitindo uma atenção muito maior das pessoas para a vida espiritual.

   A intenção na altura seria a de convocar um jubileu a cada 100 anos, mas isso trazia o inconveniente de impedir várias gerações de o celebrar. Face a esse desejo natural, o jubileu seguinte foi celebrado em 1350, mas depressa se consolidou o costume de o convocar a cada 25 anos, prática seguida até aos dias de hoje.

   Nem sempre foi possível seguir este ritmo, havendo algumas ocasiões em que não foi convocado. O do ano de 1800 não se realizou e, até ao ano de 1900 apenas teve lugar o de 1825.

  Sendo uma ocasião propícia e reconhecida pelo Magistério da Igreja para a obtenção de benefícios espirituais e de redução das consequências temporais do pecado, torna-se um tempo de crescimento interior, de fortalecimento na fé e de aprofundamento da união com Deus e com o próximo. Por isso, deve ser aproveitado pelos fiéis como oportunidade de conversão e arrependimento, de exame de vida e de consciência, de redenção e de salvação, um tempo favorável, “um ano da graça do Senhor” (cf. Lc 4, 20).

Fernando Brites