Solenidade de todos os Santos e comemoração dos fiéis defuntos

Preparar os próximos dias: Porque é que a Igreja escolheu um dia para celebrar todos os santos?
E logo a seguir os fiéis defuntos?
Há alguma relação com festas pagãs como o Halloween?
É a estas perguntas que procuramos responder.

 

Se cada dia tem um santo para ser celebrado, porque há um dia de Todos os Santos?

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A Igreja acredita que todos aqueles que foram beatificados e canonizados estão junto de Deus e por isso vivem a experiência da plena santidade. Mas a Igreja acredita que nem todos os santos foram beatificados ou canonizados. Junto de Deus vivem muitos que ao longo da vida foram aquilo a que o Papa Francisco chama “santos ao pé da porta” (Gaudete et Exsultate,7), pais, mães, religiosas, religiosos, sacerdotes, leigos missionários, pessoas solteiras que foram fieis nas coisas pequenas e grandes da vida, acolhendo plenamente o dom da salvação que Jesus oferece gratuitamente.

São esses santos, que não estão nos altares mas que cruzaram a vida de tantos de nós deixando a marca de Jesus, que celebramos neste dia. A Igreja alegra-se porque neles se realizou o mistério pascal de Cristo. Entregando como Ele a vida pelos outros, são acolhidos plenamente na Sua Glória.


Desde quando se assinala esse dia e porquê no dia 1 de novembro?

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No começo da Igreja, a grande devoção dos fiéis era dirigida aos Mártires. O que se compreende porque nesses momentos os cristãos eram fortemente perseguidos e o exemplo dos mártires inspirava fidelidade e perseverança. Assim, nos primeiros séculos do cristianismo, a Igreja do Oriente dedicava um Domingo à celebração de todos os mártires.

No Ocidente, começou também a celebrar-se a festa de todos os mártires, apóstolos e anjos. Nos começos do século VII o Papa Bonifácio IV cristianizou o culto pagão de todos os deuses, celebrado no Panteão de Roma, dedicando-o à Santíssima Virgem e aos mártires. Uma vez que essa cristianização do culto pagão aconteceu a 13 de maio de 610, esse dia foi escolhido como a primeira data em que se celebraram todos os santos.

A celebração de todos os santos foi-se tornando mais popular e o seu culto foi-se espalhando. Foi então composto um ofício litúrgico próprio para celebração dos santos. Em 737, foi inserido no cânone da missa uma celebração de Todos os Santos. O Papa Gregório IV fixou a festa de todos os santos no dia 1 de novembro no século IX, data que já há algum tempo tinha sido escolhida em Inglaterra para celebrar os santos. Sisto IV daria a esta celebração o estatuto mais importante da Liturgia cristã passando a ser considerada uma solenidade.



Como podemos viver bem o dia de Todos os Santos?

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Uma das formas de viver este dia é celebrar a Eucaristia. Até porque, tratando-se de um dia Santo e de uma Solenidade, a Igreja convida todos os cristãos a participar neste Sacramento. É também um bom dia para recordar todas as pessoas que nos ajudaram a conhecer Jesus e que foram para nós testemunho de santidade, agradecendo a Deus o seu exemplo e celebrando a sua vida. Finalmente, podemos reconhecer que aspetos da nossa vida precisam de ser purificados para sermos mais fiéis à vontade de Deus, servindo gratuitamente os outros.


Porque é que o dia dos fiéis defuntos vem logo depois do Dia de Todos os Santos?

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Porque é a continuação lógica desse dia de Todos os Santos. Depois da alegria com que se celebrou a santidade dos que vivem a plena comunhão com Deus, a Liturgia dedica o dia seguinte à evocação da memória dos fiéis defuntos.

Estamos também em comunhão com aqueles que, em preparação para ver totalmente a Deus, são ainda purificados do que neles não é amor. Costumamos dizer que estão no purgatório. O início desta tradição está ligado à determinação dada, em 998, pelo Abade de Cluny, Santo Odilão, para que todos os mosteiros da sua ordem evocassem a 2 de novembro todos os fiéis defuntos. O costume foi-se generalizando e seria oficializado por Roma no século XIV.


Há alguma ligação entre o Halloween e o Dia de Todos os Santos?

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O Halloween ou Hallowe’en constitui uma forma abreviada da expressão escocesa Allhallow-even, – eve of all saints-, ou seja, “véspera de todos os santos”. Este termo aparece no século XVI, tendo origem numa festa celta, o Samhain, que marcava o fim do verão, das colheitas e o começo do Inverno. Era também a altura em que os celtas recordavam os seus antepassados. A essa festa celta estavam também associadas comida, doces e máscaras.

A emigração de povos de origem celta para os EUA fez com que essa tradição se enraizasse naquele país. Há por isso uma coincidência de nomes, mas a origem e a história de cada uma das festas são distintas.

Todos os santos e festa dos defuntos: o que celebramos exatamente?

Na festa de Todos os Santos celebramos os méritos de todos os santos, celebramos os dons de DeusNovembro é um mês que iniciamos com a lembrança da morte e dos nossos fiéis defuntos mesmo que, de fato, inicie não com a comemoração dos fiéis defuntos – dia 2 de novembro -, mas com a alegre celebração de todos os santos, dia 1 de novembro. Isto significa que antecipamos a vida em relação à morte; a vida em Deus, no Céu, de quantos são abertos, na vida e na morte, a sua bondade e a sua misericórdia, na fé, na esperança e no amor.

As duas celebrações nos colocam diante do mistério da morte e nos convidam a renovar a nossa fé e a nossa esperança na vida eterna.

Todos os Santos

Na festa de Todos os Santos celebramos os méritos de todos os santos, o que significa sobretudo celebrar os dons de Deus, as maravilhas que Deus operou na vida destas pessoas, a resposta deles à graça de Deus, o fato que seguir Cristo com todas as consequências é possível.

Existe uma multidão imensa de santos canonizados e de outros não canonizados. Chegaram à plenitude que Deus quer para todos. Celebramos e lembramos também o chamado universal à santidade que nos faz o Senhor: “Sede perfeitos como é perfeito o vosso Pai que está nos Céu” (Mt 5,48).

Finados

Na festa de finados, a Igreja nos convida a rezar por todos os defuntos, não apenas para aqueles da nossa família, ou pelos mais queridos, mas por todos, sobretudo aqueles que ninguém se lembra.

O hábito de rezar para os fiéis defuntos é antigo como a Igreja, mas a festa litúrgica foi instituída dia 2 de novembro de 998, por Sant’Odilone, monge beneditino e quinto abade de Cluny, no sul da França.

Roma adotou esta prática no século XIV, e a festa se difundiu em toda a Igreja. Neste dia comemoramos o mistério da Ressurreição de Cristo que abre a todos a via da ressurreição futura.

Nestes dias, uma das nossas tradições mais radicais é a visita aos cemitérios para ir encontrar os familiares defuntos. Momento de oração, momento para lembrar as pessoas amadas que nos deixaram, momento de união familiar.

Na comemoração dos Fiéis Defuntos, recordemos das almas

Origens 

Em vez de propor-nos, hoje, a veneração de um santo, a Igreja nos convida a comemorar, pelo nosso sufrágio, as almas dos fiéis já falecidos. A comemoração de todos os fiéis defuntos foi instituída neste dia a fim de socorrer, por boas obras gerais, os que não se beneficiam de preces especificamente dedicadas a eles. Deve-se a uma iniciativa tomada pelos monges beneditinos por volta do ano 1000. 

A data

O abade São Odilo, superior mosteiro de Cluny na França, deu ordem para que em todos os conventos filiados a esta Ordem se celebrasse um ofício pelos defuntos na tarde do dia 1º de novembro. Essa comemoração foi adotada pela autoridade da Igreja, de tal modo que, aos poucos, se tornou universal a dedicação de dois de novembro à memória dos irmãos já falecidos.

Exortação de Paulo

Essa exortação de Paulo é dirigida também a cada um de nós:

“Irmãos, nos diz São Paulo apóstolo, não queremos que ignoreis o que se refere aos mortos, para não ficardes tristes como os outros que não tem esperança. Se cremos que Jesus morreu e ressuscitou, cremos também que Deus levará com Jesus os que nele morrerem.” (ITs 4,13-14).

Dia dos Fiéis Defuntos: um dia para recordação, não tristeza

Dia de Saudosa Reflexão

O Dia dos Finados não é dia de tristeza nem lamúrias, como o é para aqueles que não tem fé, mas é dia de saudosa recordação, confortada pela fé, que nos garante que nosso relacionamento com as almas dos finados não está interrompido pela morte, mas é sempre vivo e atuante pela oração de sufrágio. A doutrina relativa aos finados põe em admirável luz a harmonia entre a justiça e a bondade de Deus Pai, de tal modo que também os corações mais frios não resistem hoje a um saudoso pensamento de piedade religiosa em favor dos irmãos falecidos.

Purgatório: o lugar de purificação

A fé nos ensina que existe um lugar de purificação pelas almas depois da morte, pois toda criatura que morre carrega faltas, misérias, dívidas espirituais por pecados cometidos, mesmo morrendo reconciliada com Deus. Essas faltas o impedem de entrar diretamente no Reino de Deus, que é o reino da santidade perfeita, da luz e felicidade. Deus, em Sua bondade, providenciou um lugar de purificação que a tradição da Igreja chamou de purgatório. O Catecismo da Igreja Católica afirma:

“O pecado grave priva-nos da comunhão com Deus e, portanto, torna-nos incapazes da vida eterna, cuja privação se chama «pena eterna» do pecado. Por outro lado, todo pecado, mesmo venial, traz consigo um apego desordenado às criaturas, o qual precisa ser purificado, quer nesta vida quer depois da morte, no estado que se chama Purgatório. Esta purificação liberta do que se chama «pena temporal» do pecado. Estas duas penas não devem ser consideradas como uma espécie de vingança, infligida por Deus, do exterior, mas como algo decorrente da própria natureza do pecado. Uma conversão procedente duma caridade fervorosa pode chegar à total purificação do pecador, de modo que nenhuma pena subsista (82).” (CIC 1472)

Temos condições de oferecer preces, sacrifícios em sufrágios das almas do purgatório

A Solidariedade Espiritual

Pela solidariedade espiritual que existe entre os batizados por força de nossa inserção no Corpo Místico de Cristo, temos condições de oferecer preces, sacrifícios em sufrágios das almas do purgatório que ficam assim beneficiadas em suas penas. Esta doutrina já era conhecida no Antigo Testamento. De fato, lemos, no Segundo livro do Macabeus que, depois de uma batalha do povo judeu contra os inimigos, Judas Macabeu mandou recolher ofertas a serem enviados ao Templo de Jerusalém solicitando orações e sacrifícios em sufrágio dos soldados tombados na guerra, pois ele concluiu: “É um pensamento santo e salutar orar pelos mortos para que sejam livres dos seus pecados” (2Mc 14,45). Também Jesus Cristo fez alusão aos pecados que não são perdoados nem nesta terra nem na outra vida.

Orações de  Sufrágio

Orações de sufrágio em favor das almas dos mortos sempre foram praticadas nas Igrejas desde os primeiros séculos. Nas catacumbas romanas onde se sepultavam os cristãos há inúmeras inscrições alusivas a preces que os defuntos solicitam dos irmãos na fé. Santa Mônica, mãe de Santo Agostinho, ao falecer perto de Roma, enquanto viajava para África, assim falava aos dois filhos que a acompanhavam: “Ponde meu corpo em qualquer lugar, e não vos preocupeis com ele. Só vos peço que, no altar de Deus, vos lembreis de mim, onde quer que estiveres”.

As almas dos nossos falecidos parecem dizer com o patriarca Jó: “Compadecei-vos de mim, ao menos vós que sois meus amigos, porque a mão do meu Senhor me tocou”.

“Santo e salutar é o pensamento de orar pelos mortos, para que sejam livres dos seus pecados.”

A Indulgência e a Oração pelos falecidos

Indulgência: 

No dia de Finados, “aos que visitarem o cemitério e rezarem, mesmo só mentalmente, pelos defuntos, concede-se uma Indulgência Plenária, só aplicável aos defuntos. Diariamente, do dia 1º ao dia 8 de novembro, nas condições costumeiras, isto é, confissão sacramental, comunhão eucarística e oração nas intenções do Sumo Pontífice; nos restantes dias do ano, Indulgência Parcial (Enchr. Indulgentiarum, n.13)”.

“Ainda neste dia, em todas as igrejas, oratórios públicos ou semipúblicos, igualmente lucra-se uma Indulgência Plenária, só aplicável aos defuntos; a obra que se prescreve é a piedosa visitação à igreja, durante a qual se deve rezar o Pai-Nosso e Creio, confissão sacramental, comunhão eucarística e oração na intenção do Sumo Pontífice (que pode ser um Pai-Nosso e Ave-Maria, ou qualquer outra oração conforme inspirar a piedade e devoção).” (pg. 462 do Diretório Litúrgico da CNBB).

Oração pelos falecidos:

Pai santo, Deus eterno e Todo-Poderoso, nós Vos pedimos por (nome do falecido), que chamastes deste mundo. Dai-lhe a felicidade, a luz e a paz. Que ele, tendo passado pela morte, participe do convívio de Vossos santos na luz eterna, como prometestes a Abraão e à sua descendência. Que sua alma nada sofra, e Vos digneis ressuscitá-lo com os Vossos santos no dia da ressurreição e da recompensa. Perdoai-lhe os pecados para que alcance junto a Vós a vida imortal no reino eterno. Por Jesus Cristo, Vosso Filho, na unidade do Espírito Santo. Amém! (Rezar Pai-Nosso e Ave-Maria.)

Dai-lhe, Senhor, o repouso eterno e brilhe para ele a Vossa luz! Amém.

Minha oração

“Senhor, nosso Deus, resgatai as almas dos nossos conhecidos e familiares do purgatório, além daquelas que necessitam das nossas orações. Pedimos também a intercessão para que sejamos santos e purificados nessa vida, a fim de chegar diretamente ao Céu. Amém.”

Almas do purgatório, rogai por nós!

Palavras caídas do Céu – Graça

Hoje falamos de graça, uma palavra que é a própria autocomunicação de Deus a nós, para nosso bem. Não são as coisas que Deus nos dá, mas a própria doação. Que graças estou eu a receber nesta fase da vida onde me encontro?

Hoje falamos de graça, uma palavra que é a própria autocomunicação de Deus a nós, para nosso bem. Não são as coisas que Deus nos dá, mas a própria doação. Que graças estou eu a receber nesta fase da vida onde me encontro? Novo episódio da rubrica Palavras caídas do céu todas as quintas-feiras. Palavras caídas do céu é um rubrica da autoria do P. Nuno Tovar de Lemos, sj produzido numa parceria Centro de Reflexão e Encontro Universitária (CREU-IL)/ Ponto SJ. Em cada episódio, uma palavra simples mas essencial ganha nova luz.

Novo episódio da rubrica Palavras caídas do céu todas as quintas-feiras.

Palavras caídas do céu é um rubrica da autoria do P. Nuno Tovar de Lemos, sj produzido numa parceria Centro de Reflexão e Encontro Universitária (CREU-IL)/ Ponto SJ. Em cada episódio, uma palavra simples mas essencial ganha nova luz.



Palavras caídas do céu – Deus

Deus: a maior palavra das palavras caídas do céu. Um Deus que é Pai, que nos escuta, com quem podemos falar. Jesus veio falar-nos Dele, trata-o por paizinho.

Neste quarto episódio, o P. Nuno Tovar de Lemos, fala-nos de Deus, o Pai de Jesus. Deus é um Ser pessoal, não é uma energia. É alguém, alguém que me conhece, alguém com quem posso falar.

Novo episódio da rubrica Palavras caídas do céu todas as quintas-feiras.

Palavras caídas do céu é um rubrica da autoria do P. Nuno Tovar de Lemos, sj produzido numa parceria Centro de Reflexão e Encontro Universitária (CREU-IL)/ Ponto SJ. Em cada episódio, uma palavra simples mas essencial ganha nova luz.

 P. Nuno Tovar de Lemos, SJ

Veja o episódio 1.

Veja o episódio 2.

Veja o episódio 3.

Nuno Tovar de Lemos nasceu em Lisboa em 1960. Licenciou-se em engenharia electrotécnica no Instituto Superior Técnico e em 1984 entrou na Companhia de Jesus. Estou teologia nos Estados Unidos (tendo o grau de Master of Divinity pela Weston School of Theology de Cambridge) e na Universidade Gregoriana, em Roma, onde se licenciou em teologia fundamental. Foi ordenado sacerdote em 1995 e durante 20 anos dedicou-se sobretudo à pastoral universitária. É autor de “O Príncipe e a Lavadeira” e “Textos para Rezar”. Actualmente vive em Portimão e trabalha na Paróquia de Nossa Senhora do Amparo desta cidade.

A vida são dois dias… como é que os vivemos?

O cristão não se define pelas suas próprias qualidades ou posses, mas por aquilo que se tornou ao responder ao amor de Jesus.

Pablo Neruda tem um poema muito interessante, onde fala sobretudo da forma como vivemos a vida. E diz, num dado momento, que cada dia deve ser vivido não como se fosse o primeiro, nem o último, mas como se fosse o único. Não sei se coincide exatamente com o “hoje” que Jesus nos convida a viver, como tempo favorável, mas faz-nos acertar o passo com o relógio biológico num tempo em que a pressa e a ditadura do imediato nos consomem a vida, nos dias corridos de insatisfações, de frustrações e outros “ões” que dão cabo de nós e nos tornam piores como pessoas e como humanidade.

No mês em que faço anos, lentamente a aproximar-me dos 60, mais disponível para ser avó do que mãe –  sem deixar de o ser, mas ainda contagiada pelo ritmo frenético da profissão que abracei e que não consigo deixar, embora agora noutra condição – este “hoje” e este “único” atiram-me para os braços de um certo existencialismo que tem pouco de existencial e muito de pragmatismo.

Não viverei outro tanto, embora na minha família o género feminino seja rijo e de grande longevidade, para mal dos homens que nos aturam até ao fim. Gostava de chegar mais longe na idade passando a fasquia dos setenta, naquela conta bíblica em que depois contaria mais sete e assim poderia imaginar-me a perdoar tantas vezes quantas a que Jesus aconselhou, aspirando a ganhar o Céu que Ele nos disse que estava garantido seguindo as bem-aventuranças e apenas isso, sem necessidade de andar atrás de códigos e outras leis que às vezes parecem bem longe da misericórdia de Jesus. Mas, o futuro a Deus pertence e por isso, o melhor que tenho a fazer é ser neste hoje o melhor que posso, sempre ciente de que Jesus me quer bem tal como sou, embora me reserve sempre o melhor que eu alguma vez possa ser.

Temos dificuldade em pressupor um mundo cristão como outrora.

Vem isto a propósito de um título que encontrei quando fazia uma pesquisa no Google sobre o Cristianismo e, em particular uma afirmação do Papa Francisco sobre o seu alegado fim. De facto, temos dificuldade em pressupor um mundo cristão como outrora. Não é que o Ocidente seja anti-cristão; ele é simplesmente não cristão, pela simples razão de que já não se conhece o conteúdo da fé e Jesus Cristo, muitas vezes apenas mencionado como uma figura do passado e não como uma realidade presente. O que nos deve fazer refletir sobre a dramática ausência da Igreja no mundo de hoje, especialmente entre os jovens. Contamos pouco ou nada, porque eles gostam pouco de estruturas, ainda menos de estruturas demasiado debruçadas sobre si mesmas. Vários estudos apontam para o facto dos jovens, a nível europeu, se dizerem não seguidores de qualquer religião, que parece estar razoavelmente moribunda, o que não é de todo, uma exclusividade católica.

Prosseguindo centrada nos jovens e procurando encontrar argumentos para uma resposta a este tão propalado problema, diria que eles são indiferentes à religião, não porque dispensem uma relação com o transcendente, mas porque nós, sobretudo os mais velhos, temos sido razoavelmente incompetentes em proporcionar-lhes, ou sequer permitir que eles vivam uma experiência de vida, pessoal e comunitária, graças à qual se possam tornar cristãos. É claro que o mundo de hoje não favorece, com os seus modelos de vida, a descoberta da fé, mas isso não pode ser pretexto para a falta de propostas de vida que caracteriza muitas vezes a Igreja atual.

A fé não é um ato cego, mas um despertar para a grandeza da realidade.

Na Evangelii gaudium, o Papa Francisco (tenho tantas saudades dele…) escreve que hoje o anúncio cristão deve preceder o compromisso de defender os valores morais da Igreja. No mundo secularizado, o encontro, o testemunho cristão dirigido a todos vem em primeiro lugar. À Igreja pede-se que crie as condições que favoreçam o encontro do homem de hoje com o acontecimento cristão. Não apenas com dogmas ou com “valores” cristãos, mas com uma renovada experiência de vida graças à fé. Este encontro com Jesus ressuscitado e vivo é o que faz de nós cristãos. Parece-me…

Como afirma Bento XVI na sua encíclica Deus caritas est: “Ao início do ser cristão, não há uma decisão ética ou uma grande ideia, mas o encontro com um acontecimento, com uma Pessoa que dá à vida um novo horizonte e, desta forma, o rumo decisivo” (§1).

A fé não é um ato cego, mas um despertar para a grandeza da realidade. Sempre que a sua verdade é colocada com simplicidade e determinação no âmago da existência cristã, a vida do homem é imbuída e reanimada por um amor que não conhece interrupções nem confins…. E o próprio universo revela uma “razão superior”.

“Cristão, que dizes de ti mesmo?” é uma pergunta que vai à essência da nossa identidade porque mais do que nos interpelar sobre nós mesmos nos coloca na relação com o amor de Jesus e na doação aos outros.

A interpelação que é feita aos cristãos açorianos no início de um ano pastoral, que é muito mais do que isso porque representa o começo de uma caminhada preparatória de uma celebração jubilar, – os 500 anos da diocese de Angra em 2034 (ainda não terei os tais 70 anos) –, ganha, neste contexto, uma importância acrescida.

“Cristão, que dizes de ti mesmo?” é uma pergunta que vai à essência da nossa identidade porque, mais do que nos interpelar sobre nós mesmos, nos coloca na relação com o amor de Jesus e na doação aos outros.

O cristão não se define pelas suas próprias qualidades ou posses, mas por aquilo que se tornou ao responder ao amor de Jesus. Não se trata de uma pergunta do género “quem sou eu”, centrada em mim, em cada um de nós, mas a partir da minha – da nossa – relação com o projeto de Deus e o amor que dá sentido à existência.

A pergunta que me é colocada desafia-me a questionar sobretudo as consequências do meu batismo, o que me diferencia de um não batizado e o que deve estar sempre presente na minha ação, que me torne diferente e seja capaz de contagiar outros nessa diferença. E as perguntas feitas a partir daquele que foi o legado da aprendizagem, sugerem-me novas questões todos os dias da minha vida: sou seguidora de Jesus porque O vivo como o caminho, a verdade e a vida ou porque me ensinaram assim? Sou colaboradora deste caminho e desta verdade ou apenas os anuncio doutrinalmente?

Interpreto o amor de Deus promovendo a sua justiça e a sua bondade ou sinto-me amada e guardo este amor para mim, sem o conseguir levar a quem me está próximo, fazendo dele um tesouro pessoal, que guardo a sete chaves como fazem os ricos, cada vez mais ricos, diante dos bens materiais, numa espécie de avareza “scroogeana”, tão em voga nos nossos dias?

Anuncio-O como a esperança da minha vida e da humanidade ferida ou transformo-o numa espécie de utopia doutrinária que espera pela eternidade sem impulsionar neste mundo o dinamismo pessoal e social que esta esperança sugere para todos e não apenas para alguns que merecem o Céu?

E poderia continuar com as várias interrogações com que me debato diariamente, diante desta interpelação que vai ao âmago do meu coração e da minha vida. Por isso, não há uma resposta única e definitiva e, porventura, a única certeza a que ela me conduz é que, para me dizer cristã e para falar de Jesus, ter a consciência de que não basta o saber acumulado de séculos e de tradição. Não basta o que aprendi na catequese e que a minha família me transmitiu. Para me dizer cristã preciso de escutar uma voz nova, a voz do espírito, todos os dias, evitando refrões em jeito de cartilha, porque é a tradição, porque sempre foi assim ou porque as coisas de Nosso Senhor não se discutem e estão escritas num código qualquer.

Regresso aos jovens porque apesar dos meus quase 60 anos continuou a perguntar porquê, como se não houvesse amanhã e uma simples resposta porque sim, me tira do sério. Dizem-me os mais próximos que é porque sou jornalista e estou deformada pela profissão. Talvez para suavizar a inoportunidade de certas questões que não podem ser nunca confundidas com atrevido relativismo.

Por isso, como sugeriu o Papa Bento XVI, que bom seria que durante os próximos tempos, enquanto pessoas que se dizem cristãs, pudéssemos ter abertura à dúvida, e que a pergunta desafiadora – Cristão, que dizes de ti mesmo? – nos impelisse a partir em busca da resposta e, neste desafio, conseguíssemos proporcionar as condições para este encontro pessoal e transformador, que é o que nos dá um novo horizonte à vida. Não em compêndios ou certezas canónicas, mas na experiência da vida e do encontro com o mundo. Porque é lá, sobretudo, que encontramos Jesus. Todos os dias.

A lâmpada do corpo são os olhos; se os teus olhos estiverem sãos, todo o teu corpo andará iluminado (Mt 6, 22)

Desconcertantes são estas palavras que Jesus pronunciou, quando lidas de maneira literal. Significarão elas que, se os olhos de uma pessoa estiverem doentes ela não recebe a compaixão de Jesus? Significará isso que, por razões de saúde, por dificuldades de visão ou por ser invisual, o Senhor não quer entrar na nossa vida? Será possível que Deus Se contradiga? Não pode ser! Não bate certo!

   Sendo assim, não serão “os olhos” da nossa cara que devem estar sãos, mas sim “o olhar”, ou melhor, “a expressão do olhar” e, mais profundamente ainda, “a maneira como olhamos” que, essa sim, reflecte a expressão da nossa alma e tudo o que vai dentro dela.

   Não é preciso muito esforço para nos lembrarmos de expressões faciais que já vimos e que nos revelaram imediatamente qual o estado de espírito da pessoa que as mostrou. Existem, até, expressões linguísticas que vão ao encontro daquilo que as expressões faciais revelam: “um olhar embevecido”, “um olhar fulminante”, “um olhar inexpressivo”, “um olhar mortífero”, “um olhar acolhedor”.

   Esta introdução leva-nos, de imediato, a mergulhar na Sagrada Escritura para procurarmos conhecer o olhar com que Jesus olhava para as pessoas, a expressão do olhar de Jesus perante as diversas situações, que é exactamente o mesmo olhar com que Jesus olha para nós e a mesma expressão do olhar com que Jesus olha para as situações que vivemos. 

   “Contemplando a multidão, encheu-se de compaixão por ela, pois estava cansada e abatida, como ovelhas sem pastor.” (Mt 9,36). 

   É a mesma compaixão que Jesus sente hoje pelas multidões, cansadas, abatidas, perseguidas, maltratadas por todos aqueles que não querem ouvir o Bom Pastor.

   “Fixando neles o olhar, Jesus disse-lhes: «Aos homens é impossível, mas a Deus tudo é possível.»” (Mt 19,26) 

   Imaginamos Jesus a dizer isto com a mesma autoridade com que afirmou «Há tanto tempo que estou convosco, e não me ficaste a conhecer, Filipe? Quem me vê, vê o Pai.» (Jo 14, 9), bem como o motivo por que devemos ser perseverantes na oração ao Pai, que “dará o Espírito Santo àqueles que lho pedem” (Lc 11, 11b)

   “Voltando-se, o Senhor fixou os olhos em Pedro; e Pedro recordou-se da palavra do Senhor, quando lhe disse: «Hoje, antes de o galo cantar, irás negar-me três vezes.» E, vindo para fora, chorou amargamente.” (Lc 22, 61.62)

   Este é, talvez, o momento mais intenso em que podemos conhecer o olhar de Jesus, a profundidade, a ternura, a compaixão, o amor, o perdão que transparecia do Seu olhar, que transparece do Seu olhar, sempre que alguém O olhava ou procurava com o olhar, que alguém O olha ou procura com o olhar, sempre que o Seu olhar se cruzava, ou se cruza, com o de alguém.

   Esse olhar compassivo, benevolente, misericordioso, de infinito amor que brota de Deus, foi sempre alimentado, sustentado, robustecido pela contínua comunhão que o Filho vivia com o Pai, fundada na oração íntima, na procura de corresponder sempre à Sua vontade, fruto da constante acção do Espírito presente em Si.

   O nosso desejo de encontrar o olhar compassivo, benevolente, misericordioso, do infinito amor de Deus, existe no íntimo de cada um e é possível de realizar, porque o Senhor acolhe sempre a oração do humilde. 

   Imagino muitas vezes o episódio vivido por S. João Maria Vianney quando perguntou ao humilde e iletrado camponês da paróquia de Ars porque é que estava tanto tempo sentado diante do Sacrário, sem orar, sem dizer nada, ao que ele terá respondido com total simplicidade: “Sento-me aqui, eu olho para Ele e Ele olha para mim.”

   Este é o olhar que Jesus espera de nós. É o olhar que devemos procurar ter porque, olhando para a Luz, deixamos que Ele nos ilumine interiormente com o seu Espírito, deixamos que Ele cure o nosso olhar e o torne são, a fim de que todo o nosso corpo ande iluminado.

   Essa procura, associada ao desejo de seguir a vontade do Pai, leva-nos a um contínuo estado de louvor que transforma a nossa vida numa oração continuada, permanente, sem palavras, mas com atitudes que revelam a saúde do nosso corpo, dos nossos olhos, porque fundada no olhar de Jesus que nos ensina a ver com os olhos de Deus e que nós próprios deixamos reflectir no nosso olhar.

Fernando Brites

MÊS DO ROSÁRIO - (conversas simples)

O que estás a fazer?
Estou a rezar a Jesus.
Mas não estás a rezar o Rosário?
Estou.
Então estás a rezar a Maria.
Não é bem assim.
Porquê?
Porque estou a rezar a Jesus, por Maria, Sua Mãe.
Mas o Rosário é uma oração mariana.
Claro que é! Mas o centro do Rosário é sempre Jesus.
Mas diriges-te a Maria na oração?
Dirijo-me a Maria para que Ela peça a Jesus o que eu necessito.
Como assim?
Então, repara que até rezo: “rogai por nós pecadores”.
Mas porque não rezas directamente a Jesus?
No fundo estou a fazê-lo, mas pedindo a intercessão de Sua Mãe.
Porquê?
Porque o meu pedir é frágil e aquilo que peço pode não ser de Sua vontade e assim a Mãe recebe o meu pedido e sabe melhor do que eu o que pedir.
Talvez por ser Mãe?
Exactamente! Porque por vontade d’Ele, não é só Sua Mãe, mas também minha Mãe e Mãe de todos nós.
Realmente!
Pois! Quem melhor do que uma Mãe para obter de um Filho aquilo que é realmente preciso!

Marinha Grande, 2 de Outubro de 2025

Joaquim Mexia Alves

Carlo Acutis

“Bendigo-Te, ó Pai, Senhor do Céu e da Terra,
porque revelaste estas coisas aos pequeninos” (cf. Lc 10, 21)

 

   Foi-me pedido que escrevesse um artigo a propósito da canonização de Carlo Acutis, jovem falecido em 2006 com 15 anos de idade, a ocorrer no dia 7 de Setembro em celebração presidida pelo Papa Leão XIV.

   Devo confessar que o que eu sabia sobre ele era muito pouco, para além do facto de ter sido um apaixonado pela informática, de ter produzido diversos “sites” para a internet, de ter morrido com leucemia e de ser italiano.

   Tive de ir pesquisar diversas fontes e, à medida que ia colhendo mais informação, mais ia ficando sem palavras que dizer, mais me ia sentindo pequenino, mais ficava assombrado pelo exemplo de vida que era descrito. A minha surpresa ia aumentando. Percebia que, por muito que escrevesse, não conseguiria nunca transmitir o suficiente em relação a este jovem, com alma de dimensão larga e profunda.

   Tudo o que lia levava-me a intuir que estava diante de uma criança, de um adolescente com as características de todos nós, os mesmos traços, os mesmos ambientes, as mesmas alegrias e esperanças, mas com uma percepção e sensibilidade das coisas de Deus às quais não foi indiferente na sua vida e que acolheu com uma espiritualidade que o levou a crescer no entendimento, na simplicidade, na entrega ao serviço dos irmãos, na certeza da presença de Cristo no meio de nós.

   Podemos sempre dizer que Deus lhe concedeu um dom especial e que, por isso, lhe foi possível ser como foi.

   Contudo, isso levar-nos-ia a concluir que Deus seria avarento, caprichoso, faria distinção de pessoas, só daria dons a alguns e, por isso, não poderia deixar de ser profundamente injusto. O que é totalmente absurdo!

   Sendo assim, sou levado a concluir que o dom que Deus concedeu a Carlo Acutis é o mesmo dom que concedeu a todos e a cada um de nós, que é o dom do AMOR.

   Então, o que é que torna o reconhecimento, pela Igreja de Cristo, de que este jovem é um testemunho de santidade de vida que merece ser olhado e seguido como exemplo?

    O que torna Carlo Acutis especial (e todos os Santos reconhecidos como tais) é a forma como usou esse dom, em plena liberdade, com plena vontade, inteiramente consciente, aplicando as suas capacidades para que esse dom produzisse fruto, e fruto abundante.

   Esta conclusão, fundada na Sagrada Escritura, leva-nos a tomar consciência da nossa responsabilidade em utilizar os dons, os talentos, as capacidades, a nossa inteligência e a Razão, a nossa liberdade, para correspondermos ao AMOR que é Deus.

   É exactamente essa medida que serve, e que a Igreja reconhece como tal, para aferir da santidade de uma pessoa e de que tal pessoa pode ser venerada como exemplo a seguir por todos ao longo da nossa vida.

   O conhecimento desse exemplo, o seu estudo e divulgação, a admiração por tal testemunho podem constituir, e certamente constituem, um encorajamento e um estímulo para nós, membros da Igreja peregrina, dotados igualmente de dons, capacidades e graças derramadas por Deus, a fim de as colocarmos ao serviço dos irmãos com o mesmo espírito de amor, de humildade, de entrega total a Deus nas pequenas coisas da vida, e que Deus se encarregará de engrandecer para o Bem de todos.

  Fernando Brites

LIGAÇÕES PARA INFORMAÇÕES DETALHADAS:

https://pt.wikipedia.org/wiki/Carlo_Acutis

 https://bibliotecacatolica.com.br/blog/destaque/site-carlo-acutis

 https://www.miracolieucaristici.org/pr/Liste/list.html

Beato Pier Giorgio Frassati

Pier Giorgio Frassati é um Santo dos nossos dias, um Santo do século XX.

Foi proclamado Beato pelo Papa João Paulo II em 1990.

 

Pier Giorgio Frassati nasceu em Turim em 6 de abril de 1901, filho de Alfredo Frassati, fundador e diretor do jornal "La Stampa".

A família era rica e vivia a fé de uma forma bastante formal e assim sendo tinha tudo para ser um jovem afastado dos problemas do mundo.

Desde novo, Pier Giorgio destacou-se pela sua vivacidade, altruísmo e capacidade de envolver os outros. Frequentou as escolas salesianas, onde se apaixonou pelos estudos e desenvolveu um forte sentido de justiça social.

 

Durante a adolescência, Pier Giorgio aproximou-se das atividades caritativas através da obra de São Vicente de Paulo, dedicando-se aos pobres dos subúrbios de Turim.

A sua fé nunca foi abstrata, mas tangível e concreta: estudante de engenharia de minas na Universidade Politécnica de Turim, empenhou-se em pôr em prática o Evangelho na vida quotidiana.

O seu dia é marcado pela oração, missa e comunhão, que considera "o seu pequeno-almoço".

Mas não deixa de ser também um jovem moderno, desportivo e amante da natureza. A sua paixão pelas montanhas tornou-se uma escola de vida: o sacrifício da subida, a beleza da criação, a fraternidade com os amigos era para ele um sinal do amor de Deus.

Organiza frequentemente excursões e momentos de reflexão, aliando alegria e espiritualidade de forma espontânea e contagiante.

 

Pier Giorgio vê o rosto de Cristo nos pobres. Dedica grande parte do seu tempo livre a ajudar os necessitados, levando alimentos, medicamentos, roupas, conforto e acima de tudo dignidade. Não se limita a gestos episódicos, mas cria relações de confiança e amizade. A sua caridade estava escondida: a sua família ignorava frequentemente os detalhes do seu apostolado, que só foram descobertos após a sua morte. Frassati também se empenhou na promoção da justiça, participando de movimentos católicos, manifestações políticas em defesa da fé e da liberdade, sempre com um estilo calmo e respeitoso.

O seu lema, “Verso l'alto” ou seja “Rumo ao alto” ou "Para cima", representa bem o seu caminho em direção à perfeição moral e espiritual, mas também o desejo de melhorar a sociedade.

 

A espiritualidade de Pier Giorgio é fortemente cristocêntrica. A relação com Jesus, vivida na Eucaristia e na oração pessoal, é a força motriz da sua existência. Escrevia frequentemente aos seus amigos exortações para viverem a fé não como um «rótulo», mas como uma experiência radical de amor e misericórdia. A sua devoção a Nossa Senhora era constante: recitava o Rosário, levava sempre consigo a imagem da Virgem e confiava as dificuldades da vida à sua intercessão.

Pier Giorgio viveu a fé com alegria e simplicidade: nunca se abandonou ao pessimismo, mesmo diante das dificuldades familiares, do fracasso escolar ou das deceções amorosas. O seu sorriso, a sua simpatia e a sua capacidade de trabalhar em grupo são instrumentos de evangelização.

 

Em junho de 1925, Pier Giorgio adoeceu com poliomielite fulminante. 

A família, empenhada em cuidar da avó moribunda, percebe a gravidade da situação tarde demais.

Faleceu em 4 de julho de 1925, cercado pelo carinho de seus entes queridos.

A notícia da sua morte espalhou-se imediatamente entre os pobres de Turim, que acorreram em massa ao funeral, tornando visível a extensão do seu apostolado oculto.

 

A reputação de santidade de Pier Giorgio Frassati cresceu rapidamente. Em 1932 iniciou-se o processo de beatificação, que culminou em 20 de maio de 1990 com a proclamação do beato pelo Papa João Paulo II. O Papa chama-lhe «o homem das oito bem-aventuranças», reconhecendo nele uma síntese viva da mensagem evangélica.

O corpo de Pier Giorgio, encontrado incorrupto, foi trasladado para a Catedral de Turim, onde muitos peregrinos vão pedir a sua intercessão.

Frassati tornou-se o Santo padroeiro dos jovens, estudantes universitários, montanhistas e aqueles que se dedicavam ao voluntariado social.

 

A mensagem de Pier Giorgio Frassati é muito importante neste mundo marcado pelo individualismo, pela superficialidade e pela busca do sucesso pessoal. A sua vida é um convite a redescobrir a beleza da gratuidade, do serviço, da fraternidade e da fé vivida com alegria. O seu testemunho mostra que a santidade é possível para todos, mesmo na vida comum, entre o estudo, o trabalho, o desporto e a amizade.

Pier Giorgio Frassati ensina que a fé não se opõe à alegria, mas realiza-a plenamente; que a caridade não é apenas assistência, mas partilha. Esse compromisso não é um sacrifício estéril, mas a construção do futuro.

 Joaquim Mexia Alves

Publicado pela primeira vez em 1943, ‘O Pequeno Príncipe’, apesar de destinado ao público infantil, se tornou um clássico para todas as idades.

O livro narra o encontro de um piloto de avião com um menino, habitante de um asteroide, que viaja pelo universo. Com diálogos cheios de reflexões, a obra tem como um dos temas centrais o valor da amizade. 

“Quero o bem para ti, como o quero para mim” é a fórmula que poderia definir a amizade, segundo Karol Wojtyla em sua obra “Amor e Responsabilidade”.

Para ele, a amizade “consiste num compromisso da vontade a respeito de outra pessoa, em atenção ao seu bem”. É um processo que exige “reflexão e tempo”. O autor difere a amizade da camaradagem, e ressalta que colegas/camaradas podem ser muitos, enquanto amigos pertencem a um grupo mais seleto.

“Foi o tempo que perdestes com a tua rosa que a fez tão importante”, diz a raposa ao menino. Para Wojtyla, esse é o primeiro ponto: o compromisso da vontade. 

O principezinho compreende que a rosa era diferente de todas as outras por simplesmente ser ela. Ele poderia olhar para muitas outras, mas a sua era única. Mesmo as suas falhas, queixas e vaidades não a diminuíram. Ela era irrepetível. Isso lhe motivava a se determinar por ela, e a amá-la de forma concreta, lhe dedicando o seu tempo. 

Uma amizade verdadeira se inicia quando os amigos se entendem como pessoas únicas e irrepetíveis, dignas de um compromisso da vontade, de uma determinação, justamente por serem quem são. 

O amigo é aquele que é capaz desse olhar diferente: consegue contemplar o mistério da pessoa, e por isso não quer “desperdiçar” o outro. Entende bem a máxima de Jesus: "Ninguém tem maior amor do que aquele que dá a sua vida pelos seus amigos (cf. Jo 15,13)." 

Mas não basta a determinação, é necessário ter em vista qual é a sua finalidade: segundo Wojtyla, a atenção ao bem do amigo. 

Qual é o bem supremo pelo qual ansiamos com todo o nosso coração?

O próprio Deus. 

O verdadeiro amigo deseja ao outro a comunhão com a Trindade, e luta para que a encontre. A verdadeira amizade tem como maior preocupação a salvação e santificação dos amigos. Isso se dá porque se possui a compreensão de que o amigo é alguém único, criado para o amor e de quem sou responsável pelo dom que é e que a mim foi confiado. 

Aqui está o terceiro ponto fundamental: a responsabilidade. 

“Tu te tornas eternamente responsável por aquilo que cativas. Tu és responsável pela tua rosa...”. De início esta frase pode assustar e parecer coercitiva. Mas, Wojtyla nos explica que todo ato de amor implica responsabilidade. Se amamos, somos responsáveis, chamados a criar a “consciência do dom recebido, que deve ser guardado”. 

Diante dos nossos amigos não podemos ter uma compreensão diferente. Aquele que está diante de mim não é algo, mas alguém. Alguém que carrega um mistério, incomunicável, que nem ele entende plenamente, e que deve ser reverenciado ao ser amado, ou seja, em um compromisso da vontade que visa o seu bem

A Solenidade do Santíssimo Corpo e Sangue de Cristo

A Solenidade do Santíssimo Corpo e Sangue de Cristo é também conhecida como Corpus Christi, ou Corpo de Deus. 

É uma festa católica que celebra a presença real de Jesus Cristo na Eucaristia e, por isso mesmo, exorta os fiéis a viverem mais real e verdadeiramente o Sacramento da Eucaristia.

Celebra-se 60 dias depois da Páscoa.

Esta Solenidade foi instituída pelo Papa Urbano IV, em 08 de setembro de 1264, através da Bula Papal “Trasnsiturus de hoc mundo”.

Sempre que possível, esta Solenidade é celebrada numa quinta-feira, para unir esta festividade à memória da Quinta-feira Santa, dia da instituição da Sagrada Eucaristia na Última Ceia de Jesus com os Seus Apóstolos. Quando tal não é possível, é transferida para o domingo seguinte.

No Vaticano, a Solenidade é marcada pela Missa presidida pelo Papa, seguida por uma procissão com a Hóstia consagrada.

Este ano, a Solenidade será celebrada no dia 19 de junho, com a celebração da Missa na Basílica de São João de Latrão e a procissão seguindo para a Basílica de Santa Maria Maior.

Lembra-se que existem por todo o mundo diversos milagres eucarísticos, ou seja, que mostram e demonstram a presença real de Jesus Cristo.

Aqui bem perto pode visitar-se o Milagre Eucarístico de Santarém que ocorreu no séc. XIII.

A Igreja Paroquial de Santo Estêvão é actualmente o Santuário do Santíssimo Milagre.

Joaquim M. Alves

Santíssima Trindade: Unidade no Amor

Neste domingo, 15 de junho, o primeiro após o Pentecostes, a Igreja celebra a Solenidade da Santíssima Trindade.

A palavra “Trindade” tem origem no latim e significa “três” ou “tríade”. O primeiro uso reconhecido do termo em sentido teológico coube ao bispo Teófilo de Antioquia, por volta do ano 170, para expressar a união das três Pessoas divinas em Deus.

“Há um só Deus e Pai de todos, que atua acima de todos, por todos e em todos” (Ef 4,5-6). A Santíssima Trindade não se refere, pois, a três “deuses”, mas a três pessoas distintas perfeitamente unidas numa só divindade: o Pai, o Filho e o Espírito Santo.

O Pai é o Criador, a fonte de toda a existência.

O Filho, Jesus Cristo, é o Verbo de Deus que se fez homem para nos salvar.

O Espírito Santo é o próprio Amor entre o Pai e o Filho, a força que procede de ambos e que nos inspira, guia e santifica.

Diz-nos o Compêndio do Catecismo da Igreja Católica (CCIC): “(…) As três Pessoas divinas são um só Deus porque cada uma delas é idêntica à plenitude da única e indivisível natureza divina. Elas são realmente distintas entre si pelas relações que as põem em referência umas com as outras: o Pai gera o Filho, o Filho é gerado pelo Pai, o Espírito Santo procede do Pai e do Filho” (CCIC, 48).

Sabemos que Deus é Amor, e o Amor é relação. A Trindade são três pessoas em relação íntima de Amor – e que anseiam pela relação com todos e cada um de nós. Somos chamados a reconhecer a nossa identidade de filhos de Deus-Pai, a configurarmo-nos com Cristo e a deixarmo-nos conduzir pelo Paráclito, o Consolador, o Espírito da Verdade que Jesus nos prometeu, antes de ascender aos Céus, e que foi enviado sobre os discípulos logo no Pentecostes – e ainda hoje sobre nós.

A Santíssima Trindade constitui um dos dogmas da doutrina católica, porque se trata de uma realidade em que a Igreja Mãe e Mestra, nos manda aceitar como verdade de fé, mesmo sem conseguirmos compreendê-la plenamente – não neste mundo, nem por meio da pura razão humana. É um mistério revelado por Cristo e em Cristo. Recorda o CCIC; “O mistério central da fé e da vida cristã é o mistério da Santíssima Trindade. Os cristãos são batizados em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo” (CCIC, 44).

O dogma foi estabelecido em duas etapas. No Concílio de Niceia (ano 325 da Era Cristã), a Igreja afirmou a divindade do Filho e compôs a parte do Credo que a Ele se refere, num tempo em que a heresia ariana afirmava que Jesus era um ser sobrenatural, mas não Deus. O I Concílio de Constantinopla (ano 381) reconheceu a divindade do Espírito Santo, contrariando a heresia do macedonianismo.

Glória ao Pai, ao Filho e ao Espírito Santo, como era no princípio, agora e sempre, amen!

Lúcio Gomes

Solenidade de Pentecostes

No domingo seguinte à Ascensão do Senhor, a Igreja festeja a Solenidade de Pentecostes, a descida do Espírito Santo sobre os Apóstolos, que estavam reunidos no mesmo lugar, em Jerusalém, «como um vento impetuoso, que encheu toda a casa e apareceram como que línguas de fogo que pousavam sobre cada um deles. Todos ficaram repletos do Espírito Santo e começaram a falar outras línguas conforme o Espírito Santo lhes concedia de se exprimissem». (conf Act 2, 1-4)

Pentecostes é uma palavra grega: Pentecoste, cujo significado é quinquagésimo dia; é uma solenidade celebrada no domingo, quarenta e nove dias após a Páscoa.

O Espírito Santo é a Terceira Pessoa da Santíssima Trindade, Deus com o Pai e o Filho.

O Pentecostes inicia a pregação evangélica feita pelos Apóstolos que, tendo recebido o Espírito Santo, não só vencem o medo, mas são também iluminados, inspirados, para pregarem a Boa Nova em todo o mundo.

Nasce assim a Igreja que chega até aos nossos dias.

Também hoje em dia o Espírito Santo se derrama sobre aqueles que O pedem, para serem testemunhas de Cristo em toda a sociedade.

Todo o cristão deve ser missionário no seu dia a dia, na família, no trabalho, no lazer, tendo a certeza de que o Espírito Santo lhe dará tudo o que for necessário para cumprir essa missão.

Por isso a oração diária de cada cristão deve ser sempre pedindo em primeiro lugar o Espírito Santo.

Vem Espírito Santo!

“Senhor, é agora que vais restaurar…” (Act 6, 1b)

  Esta frase é o início da pergunta feita pelos discípulos de Jesus no momento que marca a sua separação visual deste mundo (denominada “Ascenção”), mas que se repete em todos os tempos, por todas as pessoas, por nós também. Os primeiros escutaram as suas palavras, viram os seus sinais e testemunharam-n’O ressuscitado, mas ainda assim continuavam com o mesmo quadro de referências, perspectivas e sonhos. Estavam como Pedro e o outro discípulo na manhã de Páscoa quando “ainda não tinham entendido a Escritura” (Jo 20, 9a).

   A resposta que Jesus deu, também ela é surpreendente para quem a ouve: “Não vos compete saber os tempos nem os momentos que o Pai fixou…” Revela novas perspectivas, abre realidades diferentes, rasga novos horizontes, tal como acontecera com o véu do templo que se rasgou ao meio no momento em que Ele morreu na cruz (cf. Lc 23, 45).

   Isto ensina-nos a não querer ter o domínio dos acontecimentos, a não estabelecer planos para os desígnios de Deus, nem presentes nem futuros, mas coloca o essencial da nossa vida em primeiro plano.

   Convida-nos a uma atitude de confiança na autoridade do Pai e a uma atitude de esperança na vinda do Espírito, o qual ensinará tudo e recordará tudo o que o Filho disse (cf. Jo 14, 26).

   Encontramos aqui, então, a resposta para a pergunta que o título deste artigo nos evoca. Essa resposta requer de nós um esforço de mudança, não tanto de hábitos mas na forma de pensar, na forma de estar, na forma de agir, na forma de perceber a nossa relação com Deus e com os acontecimentos.

   Primeiro, confiar na autoridade do Pai, na Sua Providência amorosa, discreta, como um tesouro que é dispensado prodigamente aos seus filhos, mesmo quando estes não se apercebem de que isso acontece. É Ele que, com o Seu infinito amor, derrama graças abundantes sobre os que O temem, entrava o caminho aos pecadores, suscita o arrependimento e a conversão, chama todos a uma atitude de reconhecimento filial. Como se não bastasse, não regateia esforços para encontrar as ovelhas perdidas e, aflito com o seu bem-estar, envia a Sua Palavra feita Carne para as procurar.

   Descobrimos aqui a segunda condição para a nossa mudança fundamental: escutar o que diz o Bom Pastor, ouvir a Sua voz e segui-l’O. Ele, que é de condição divina, não Se valeu da Sua igualdade com Deus, mas aniquilou-Se a Si próprio tornando-Se semelhante aos homens. (cf. Fl 2, 6ss)

   É essa segunda condição que nos leva a procurar conhecer a Sagrada Escritura, a saborear a Palavra de Deus, a ouvir e ler o que o Filho ensinou, os sinais que deram (e dão) vista a quem não via (e não vê), a ouvir o que os antigos profetas desejaram ouvir. Para isso, é fundamental um contacto íntimo e uma leitura assídua dos textos sagrados, principalmente dos quatro evangelistas. Com razão disse S. Jerónimo: “Desconhecer a Sagrada Escritura é desconhecer o próprio Cristo.” E, se alguém desconhece o próprio Cristo, como poderá ser Sua testemunha (cf. Act 1,8; Lc 24, 48) ou “ensinar a cumprir tudo quanto Ele mandou”? (Cf. Mt 28, 20a). Ou, como a Mãe recomenda, “fazei tudo quanto Ele vos disser”? (Cf. Jo 2, 5b)

   Portanto, ler, meditar, saborear, rezar os textos sagrados não é simplesmente um exercício académico, intelectual ou religioso, mas um processo de “mergulhar” em Jesus, de “Conhecer” em intimidade profunda Jesus Cristo, Verbo incarnado, e com Ele tomar parte nas alegrias eternas, começando já, aqui e agora.

   Indissociável desta atitude, que nos convoca a ler os textos com o mesmo espírito com que foram escritos, surge a terceira condição que nos leva a pedir a Deus que nos encha com o Seu Espírito para podermos entender com o contributo dos Seus dons o que é efectivamente a Verdade (“O que é a Verdade?” – Jo 18, 38b), uma busca que inquieta o coração de todo o Homem enquanto não repousa n’Ele (cf. Sto Agostinho em “Confissões” - 1)

   Fundamental nesta terceira condição é a nossa oração, o hábito de O escutar no silêncio e nos acontecimentos, nas pessoas e nos gestos, o nosso pedido contínuo ao Pai do Céu que “dará o Espírito Santo àqueles que lho pedem” (Lc 11, 13b) e que abre o nosso Entendimento, aumenta a nossa Piedade, Fortalece as nossas almas, enche-nos de Sabedoria, dá Conselho aos nossos corações, derrama sobre nós a Ciência e preenche-nos com o seu santo Temor.

   Poderemos, então, sentir ressoar nos nossos corações a resposta de Jesus aos seus discípulos: “Mas ides receber uma força, a do Espírito Santo, que descerá sobre vós, e sereis minhas testemunhas em Jerusalém, por toda a Judeia e Samaria e até aos confins do mundo.”

   Assim se cumpra em nós a Sua vontade!

Fernando Brites

HABEMUS PAPAM

O Papa Francisco ficou extremamente doente… fiquei triste. Apesar de não ser médica e acreditar em Deus e no poder do Espírito Santo sabia que era grave. Foram muitos dias a “correr” para a televisão, para os jornais e para a internet para saber do seu estado de saúde. Melhorou e teve alta. Visivelmente debilitado, apesar de eu nunca o ter verbalizado, sabia que poderia não resistir, o que veio a acontecer no passado dia 21 de abril. Chorei imenso. Senti-me órfã de pai. Este foi para mim um sofrimento estranho acompanhado de uma acalmia igualmente diferente porque conclui: agora descansa meu pai; estás junto do Senhor com a tua rosa branca, que tanto gostavas: a pandemia (COVID), as guerras em vários países do mundo, os escândalos de pedofilia dentro da igreja que fez questão, e bem, de colocar à tona da água e a sua frágil e débil saúde tiraram-lhe a vida terrena.

Decorreram vários dias em que me senti órfã. Acompanhei, em direto, em casa ou no local de trabalho, através do @vaticannewspt, todas as notícias referentes ao seu funeral. Fui rezando, desejava-lhe a paz que tanto merecia. Após o Papa João Paulo II, o Papa Francisco, foi o meu Papa de referência (tinha o sonho, ingénuo, de lhe falar pessoalmente na companhia de um grande amigo). Deixou tudo o que pretendia escrito, morreu desprovido de bens terrenos e até encontrou um benfeitor para pagar as despesas da construção do seu túmulo para não gastar as verbas da Santa Sé.

Acompanhei todas as notícias de como iria decorrer a eleição do novo Papa, os prazos que tinham de decorrer, quando começaria o conclave, tudo, tudo, tudo.

No primeiro dia de conclave, dia 7 de maio, senti que seria impossível a maioria da votação dos cardeais convergir num só homem (como referiu o nosso saudoso e brilhante Papa Francisco numa entrevista o “voto do primeiro dia de conclave é um voto de cortesia”). Mesmo assim estive em frente da televisão das 18h às 20h, hora em que a pequena e singela chaminé instalada no telhado da Capela Sistina, expeliu fumo preto.

No segundo dia de conclave tinha a ideia, quase, real de que o Espírito Santo iria guiar os 133 cardeais, que se encontravam encerrados na Capela Sistina, para uma votação. Enquanto trabalhava, com pouca atenção é certo, o coração batia forte, não me conseguia concentrar. O telemóvel colocado em cima da secretária para ver em direto as notícias do Vaticano. As horas passavam e o meu estado de ansiedade também. Chegou a tarde. A desatenção do trabalho era quase total; aí já coloquei os auriculares porque tinha de, além de ver as imagens, ouvir o que o Vaticano me ia informando. Às 17h07 vi o fumo branco a sair da chaminé mais observada pelo mundo inteiro. Tremi, dei um salto da cadeira, gritei baixinho Habemus Papam; chorei de alegria, ininterruptamente. Estranhei uma vez mais a minha reação. Nunca me tinha sentido assim. Pensei imenso no Papa Francisco e, inevitavelmente, no nosso cardeal Tolentino de Mendonça. Apesar de saber que não importava quem seria o mais votado, desde que seguisse, na minha opinião, as linhas orientadoras do trabalho desenvolvido previamente pelo Papa Francisco, para que não se observasse um retrocesso na nossa Igreja, inadvertidamente puxei a “brasa à nossa sardinha” e pensei “que orgulho seria ver aparecer o nosso cardeal na varanda da Basílica de São Pedro”. Chorei ainda mais. A hora seguinte pareceu-me demorar várias horas a passar, o choro continuava, rezava pelos pobres, pelos necessitados, por todos os doentes e por todos os que sofrem com as guerras. Também rezei pelo Papa Francisco e pelo novo Papa, que ainda nem sabia quem era. Pensava apenas que o cardeal eleito iria ter um fardo pesado, que iria viver em exclusivo para os outros, que iria ser o responsável máximo da igreja católica e que iria ter um trabalho árduo e sério pela frente.

A janela da Basílica abriu-se e o cardeal Dominique Mamberti anunciou em latim, "Annuntio vobis gaudium magnum: Habemus Papam"; posteriormente anunciou o seu nome: Robert Francis Prevost. Não percebi. Os jornalistas transmitiram que era americano. Sem querer dei por mim desiludida: americano?!…. Tenho a imagem, sempre presente, e que me aterroriza, de um homem totalmente desequilibrado, de seu nome Donald Trump, à frente dos destinos de uma grande potência que são os Estados Unidos da América (eu que abomino a ligação que algumas pessoas fazem entre a igreja e a política estou a fazer o mesmo em silêncio… mea culpa). E não é que o novo Papa é americano? E também não era o nosso cardeal Tolentino de Mendonça... Um dia antes tinha dito, em jeito de brincadeira, se o nosso cardeal Tolentino fosse o eleito, iria à boleia a Roma só para o ver e agraciar. Após terminar o choro e me acalmar pensei no ditado “Deus escreve direito por linhas tortas” e possivelmente por isso foi eleito um cardeal americano que escolheu para seu nome Papa Leão XIV. Comecei a ver a sua imagem na varanda da basílica, uma imagem doce, um homem extremamente emocionado, na tentativa de esconder o nervosismo e com um discurso maravilhoso em que retive algumas frases: “A paz esteja com todos vocês”, “Portanto, sem medo, unidos de mãos dadas com Deus e entre nós, sigamos em frente. Somos discípulos de Cristo. Cristo nos precede. O mundo precisa de sua luz. A humanidade precisa dele como ponte para ser alcançada por Deus e seu amor. Ajudai-nos também vós, e depois uns aos outros, a construir pontes, com o diálogo, com o encontro, unindo-nos a todos para sermos um só povo, sempre em paz. Obrigado, Papa Francisco!

Cativou-me de imediato. Esqueci que era americano. Esqueci que não era o nosso cardeal Tolentino. Era agora o meu e nosso Papa. O Papa de todos os cristãos católicos e por isso pensei que também tinha o dever de o ajudar no que fosse possível e estivesse ao meu alcance. Recomecei a chorar novamente de alegria e de emoção. Habemus Papam. Olhei para o telemóvel e constatei a única mensagem do meu pai, com duas palavras “É americano”. Estas palavras demonstravam desagrado e desilusão (importa referir que o meu pai tem uma imagem muito própria da igreja e que não é muito simpática…). Sentimentos que eu tinha vivenciado há poucos minutos, mas que consegui, com discernimento, pensar que estava incorreta. Tentei argumentar junto do meu pai mesmo sem conhecer o Papa Leão XIV. Agora que foi eleito temos de lhe dar tempo. Esperemos que tenha um longo e profícuo pontificado; que Deus e o Espírito Santo o acompanhem a carregar esta pesada cruz.

Não me lembro da eleição do Papa Francisco e tinha 40 anos. Recordo que nessa altura era um assunto que nada me dizia, tantos anos perdidos de felicidade, penso agora. Relembro agora com carinho todo o seu legado. O Papa Francisco soube ser forte quando necessário, justo, doce e meigo e desempenhar um excelente pontificado. Até as pessoas que se autodenominam ateus ficaram genuinamente tristes com a sua morte.

Na minha opinião o nosso Papa Leão XIV terá de ter coragem para não retroceder na procura constante do caminho de uma Igreja una, séria, acolhedora, que conforta, que esteja presente, uma Igreja de todos para todos, todos, todos.  Também não nos podemos esquecer que é um chefe de um “microestado” e por isso deverá, sempre que possível, defender determinadas posições sempre em prol da paz e da igualdade entre os povos.

Não me lembro de ter tido tanto entusiasmo como no passado dia 8 de maio. Talvez quando o Papa João Paulo II veio a primeira vez a Portugal, em 1982, tinha eu 9 anos, também me tenha sentido assim. Tenho enormes lembranças desse momento transmitidas pelos meios de comunicação social. Há assuntos que mexem realmente connosco e com os nossos sentimentos e a eleição do Papa Leão XIV, para mim, foi um deles.

No meu coração, desde a eleição do Papa, que tenho uma voz que me continua a gritar constantemente Habemus Papam e que me deixa sempre emocionada. No meu telemóvel ouve-se música de louvor. Já não me sinto órfã. Não esqueci Francisco, como não esqueci João Paulo II, nem nunca esquecerei, mas agora tenho de ajudar o nosso Papa Leão XIV. Vamos arregaçar as mangas e colocarmo-nos à sua disposição e da nossa Igreja, obviamente numa dimensão mais reduzida que será a nossa paróquia. Estou de braços abertos e grito novamente Habemus Papam.

Quando olhei para o Papa Leão XIV pensei: este homem deixou de viver para ele, para os seus amigos, para a sua família, para os seus paroquianos, para as pessoas que ajudou enquanto missionário. Aceitou (desconheço se poderia recusar) ser o sucessor de Pedro com tudo o que isso implica. Estará exposto ao mundo, a sua vida será escrutinada pelos meios de comunicação social, vai ser alvo de julgamentos (já se houve falar da sua opinião acerca de determinados assuntos enquanto pôde ser o simples Padre Bob), vai ser alvo de cobranças, vai ter de servir e ser consumido por inteiro até chegar o momento da sua partida da terra. Mas também terá o direito de se sentir só e de sofrer. Irá viver para a mulher que é a Igreja e que também somos todos nós, cristãos, católicos. Que alegria, que coragem, que peso sobre um homem que apareceu na varanda da basílica e que escondia, com muita tranquilidade, os nervos que o estariam a assolar naquele momento. Espero que se rodeie dos melhores assessores para o ajudarem nesta árdua tarefa porque é demasiadamente pesada para um homem só.

Ainda não conheço o novo Papa. Os meios de comunicação social já procuram formar e transmitir ideias sobre o mesmo que não sabemos se são verdadeiras. Não quero ouvir. Não quero ser, mal, influenciada.

Já confio em ti Papa Leão XIV (peço-lhe desculpa em surdina por o estar a tratar com tanta proximidade). Meu Deus, por favor, acompanha-o nesta caminhada. Espírito Santo auxilia-o com o discernimento necessário na tomada de decisões, que deverão ser tantas.

Habemus Papam!

Até sempre Papa Francisco. Benvindo Papa Leão XIV!

Ana Umbelina Silva

Marinha Grande, 9 de maio de 2025

 

ESMOLA

Falamos em esmola e logo o nosso primeiro pensamento vai para o dinheiro, para as coisas materiais, para os bens de primeira necessidade.

E, sem dúvida, essa é uma esmola importante, sobretudo para aqueles que nada têm e precisam de tudo.

Mas também é verdade que é a esmola mais fácil, digamos assim, porque no fundo é “meter a mão no bolso” e tirar o pouco ou muito que nele se tem.

E quando pensamos nessa esmola material, também logo podemos arranjar uma qualquer desculpa para não a dar, porque não temos bens ou capacidades materiais para isso.

Mas e a “esmola” do tempo? A “esmola” da companhia? A “esmola” da paciência? A “esmola” do sorriso? A “esmola” do abraço? A “esmola” da solidariedade?

E um nunca acabar de “esmolas” que afinal todos podemos dar, porque não exigem nada dos nossos bens materiais, mas sim da nossa entrega pessoal, da nossa disponibilidade.

É tão cómodo haver gente que faz todo esse trabalho, que recebe as nossas muitas ou poucas dádivas, e as distribui àqueles que delas precisam.

Já perguntámos a alguém ou perguntámos a nós próprios, o que podemos fazer para ajudar?

Com certeza que não podemos ser todos a fazer as mesmas coisas, mas podemos, sem dúvida, ajudar em momentos pontuais, estando disponíveis para darmos essas “esmolas”.

E se há uma “esmola” que todos, sem excepção, podemos dar, essa é, sem qualquer dúvida, a oração pelos outros, pelos que precisam e por aqueles que os ajudam diariamente.

Joaquim Mexia Alves

PENITÊNCIA

E agora, pensamos nós, temos que colocar cinzas sobre a cabeça, vestir-nos de saco, e mostrar a toda a gente como estamos arrependidos e fazemos penitência.

Não, não precisa ser assim, e a penitência não é para “mostrar”, é para viver no nosso íntimo.

Hoje em dia, diz-se muitas vezes que Deus não quer o nosso sacrifício, que não quer que nós soframos, e isso é, obviamente, verdade.

Mas não deve constituir desculpa para não nos colocarmos perante as nossa faltas, delas pedirmos perdão e nos penitenciarmos por causa das mesmas.

E esta penitência que, mais do que devemos, precisamos fazer, é procurar em nós aquilo que, neste tempo de Quaresma, podemos prescindir com algum sacrifício, seja materialmente, seja socialmente, seja, sobretudo, espiritualmente.

Materialmente, prescindirmos de alguns prazeres rotineiros diários, (o café, o bolo, o doce, etc.), e oferecermos o que, por causa disso, poupamos aos que mais necessitam.

Socialmente, termos mais atenção aos outros, sobretudo àqueles com quem não conseguimos ter uma relação mais empática e, revestindo-nos de paciência, os ouvirmos e tentarmos compreender.

Espiritualmente, fazer um compromisso connosco próprios, para lermos e meditarmos diariamente a Palavra de Deus, para O procurarmos no sacrário sempre que nos for possível, rezarmos mais e melhor, ou seja, não de forma rotineira, mas como um verdadeiro diálogo com Deus que se dá a conhecer àqueles que O procuram «em espírito e verdade».

E depois, obviamente, o Sacramento da Confissão, plenamente celebrado, isto é, com um bom exame de consciência, a confissão de todos os pecados, um verdadeiro arrependimento, e um firme propósito de emenda. 

Seguros da Sua infinita misericórdia, viveremos uma penitência na Quaresma, que Ele recebe cheio de amor.

Joaquim Mexia Alves

Oração

ORAÇÃO

Entra dentro de ti e faz um deserto no teu coração, ou seja, esvazia-o de tudo o que é mundo te preocupa e angustia.

Em silêncio chama o Espírito Santo e deixa que Ele coloque, primeiro no teu coração, e depois na tua boca, as palavras que Ele te inspirar.

Aliás, não te preocupes muito com as palavras, mas muito mais com a intenção do teu coração, do teu viver.

O que tu queres é encontrar-te com Jesus, no deserto de ti mesmo, que te chama a viveres com Ele esta quaresma.

E quando o teu coração se eleva para Ele, se deixa envolver no amor do Pai e iluminar pelo Espírito Santo, então descansa, confia e espera, porque a oração tomou conta de ti, e tu estás agora no encontro pessoal com Jesus que tudo muda, tudo transforma, tudo pacifica.

Em paz, então, deixa que a oração saia de ti e se faça vida na tua vida, pela graça e o dom dAquele que a ouve e recebe.

Joaquim Mexia Alves

CONVERSÃO

Ao iniciar o tempo da Quaresma, partilhamos algumas notas sobre elementos chave para uma boa e frutuosa vivência Quaresma.

CONVERSÃO

Dá a mão a Jesus e deixo-te conduzir ao deserto onde Ele se quer encontrar contigo.

Ali, naquela imensidão não tens nada que te distraia, nada para veres ou ouvires, e assim, podes recolher-te e examinares a tua vida.

Vai percebendo, conduzido pelo Espírito Santo, aquelas coisas que estão mal na tua vida, as tuas fragilidades, as tuas fraquezas, aquelas coisas que te fazem cair, e que depois a tua consciência te faz querer emendar.

Não te preocupes com coisas grandes, porque essas tu conhece-las bem, e podes identificá-las sem grande dificuldade, corrigindo-as sem grande esforço.

Detém-te naquelas pequenas coisas, aquelas que quase não parecem erradas, quase não parecem pecado, e reconhece humildemente que são essas aquelas em que cais com mais facilidade e repetes quase continuamente.

Enumera-as para ti mesmo e, olhando para Jesus que está ao teu lado nesse deserto que vives neste momento, coloca-as nas Suas mãos e arrependido pede perdão.

Pede, sobretudo, ao Espírito Santo que te dê forças para venceres essas fraquezas, essas fragilidades.

Pede-Lhe mesmo, como criança ao Seu colo, que Ele te avise antes de caíres, para poderes estar bem atento e resistires a essas tentações.

Sim, tu sabes que vais cair mais umas vezes, mas Ele toma-te pela mão, aperta-te junto ao peito e diz-te suavemente: Eu sei, meu filho, eu conheço-te. Por isso te digo, a tua conversão é viveres para fazer a minha vontade.

 Joaquim Mexia Alves