Veio confessar-se só porque sim

A liturgia deste domingo aparenta um tom assustador “Deus fará justiça aos seus eleitos, que por Ele clamam”, mas vem cheia de esperança.

Este fim de semana celebramos o Dia Mundial das Missões entendidas como as “campanhas” de evangelização dos povos do Mundo. Recordamos de modo especial as congregações missionárias, padres, freiras, voluntários missionários que levam a mão e a voz de Jesus a quem não teve oportunidade de O ouvir, e com isso na bagagem levam cuidados, ajuda, medicina, educação.

Lá longe, fora da civilização da velha europa.

Nos anos 70 disse-se que França, era país de Missão. O mundo mudou. E o movimento missionário também. Agora importamos padres de “lá” para “cá” porque, por aqui, a manta está curta.

Curta e desanimada. Os meios tradicionais parecem já não resultar. A Pastoral da Igreja parece ter dificuldade em acompanhar a linguagem e o ritmo dos jovens e dos maduros!

Mas sabemos que o tesouro que partilhamos é precioso e imutável, pelo que ficamos perdidos, certos de que temos as respostas para as perguntas que já nem se colocam!

A mensagem de esperança deste Domingo vem ao nosso encontro como um refresco em dia de deserto.

Somos chamados a crescer na perseverança, a não desistir. Porque a missão não é nossa. E também não depende só de nós.

É oportuno, em tempo de crise, situarmo-nos bem, rever, consultar o mapa.

A igreja foi criada por Jesus quando enviou os seus discípulos a ir, a anunciar, a baptizar e ensinar tudo o que Ele ensinou.

A igreja existe para servir a Missão, não apenas para preceito. A igreja existe para transformar o mundo, criar espaço para o Reino se instalar e não apenas para cumprir preceitos e nos dar a sensação de satisfação de dever cumprido. A nossa satisfação virá de frutos de vidas transformadas.

Há muitos sinais de cansaço e insatisfação. Mas há também muito sinais positivos que confirmam que o segredo, o sucesso, se é que se pode falar assim, vem de sermos fiéis a Cristo. desejarmos ser discípulos, e discípulos missionários. Gente que se apaixona e encontra vida nova e que arregaça as mangas para que outros tenham a mesma oportunidade. Não de uma forma proselitista[1] no sentido pejorativo do termo, mas sobretudo a partir do entusiasmo e do testemunho.

Há uns anos presidi a umas promessas de Escuteiros em Amor, no fim fui abordado por um senhor que me dizia: “não sou muito de frequentar, mas tenho que lhe dizer isto: o que quer que ande a fumar, eu também quero!”

Com isto partilho convoco que precisamos de nos redefinir como Paróquia e comunidade cristã, em ordem a sermos uma comunidade de discípulos missionários. Tudo o que fazemos será para crescer no Amor de Deus e na transformação do nosso coração e em dar testemunho, para que outros mais queiram dar a sua vida a este Jesus Cristo que nos chama e envia.

Uma igreja missionária não é apenas ter um “departamento” que se dedica à missão. A igreja é missionária por natureza. Somos todos parte desse todo maior, todas as funções, trabalhos, grupos, devem contribuir activa e conscientemente para essa missão. Desde a limpeza, ao acolhimento até à pregação, que é sempre o mais visível, mas não necessariamente o mais importante.

O sorriso de bom dia à entrada da igreja pode operar maravilhas em quem teve uma semana difícil e vive isolado.

Se formos corajosos para reprogramar todo o nosso pensamento em chave missionária, o cansaço será só físico e não de coração. Os olhos passam a ver beleza e pequenos sinais de esperança.

Termino com episódio de quarta-feira. Chego ao cartório e tinha uma mãe e a filhota à minha espera, para a menina se confessar. Achei que era a propósito da primeira comunhão e vinha já com tempo (que a vida anda complicada para todos).

O corpo era de tamanho standart de menina, mas os olhos por detrás das lentes, deixavam ver mais maturidade e um brilho tímido mas confiante.

Falámos. Abriu o coração e foi muto articulada e consciente. E veio confessar-se só porque sim.

Ainda há esperança, quando a sabemos procurar, ou nos colocamos a jeito de se manifestar.


Pe. Patrício Oliveira

[1] proselitismo

(pro·se·li·tis·mo) nome masculino

1. Zelo ou esforço para fazer prosélitos ou converter pessoas a uma religião, a um partido, a uma causa ou a uma ideia.


Proselitismo é o esforço de converter pessoas a uma religião, causa ou ideologia. Pode ser entendido tanto como a atividade de atrair adeptos, quanto como o conjunto de convertidos ou seguidores. Em termos de significado, pode ter conotação negativa quando envolve manipulação, coerção ou desrespeito a outras crenças, mas também pode ser visto como sinónimo de apostolado, que envolve o testemunho e a partilha de uma fé com respeito pela liberdade do outro.