Festa é Festa

Tocam os sinos da torre da igreja,
Há rosmaninho e alecrim pelo chão.
Na nossa aldeia que Deus a proteja!
Vai passando a procissão.

Mesmo na frente, marchando a compasso,
De fardas novas, vem o solidó.
Quando o regente lhe acena com o braço,
Logo o trombone faz popó, popó.

 

Olha os bombeiros, tão bem alinhados!
Que se houver fogo vai tudo num fole.
Trazem ao ombro brilhantes machados,
E os capacetes rebrilham ao sol.

 

Tocam os sinos na torre da igreja,
Há rosmaninho e alecrim pelo chão.
Na nossa aldeia que Deus a proteja!
Vai passando a procissão.

 

Olha os irmãos da nossa confraria!
Muito solenes nas opas vermelhas!
Ninguém supôs que nesta aldeia havia
Tantos bigodes e tais sobrancelhas!

 

Ai, que bonitos que vão os anjinhos!
Com que cuidado os vestiram em casa!
Um deles leva a coroa de espinhos.
E o mais pequeno perdeu uma asa!

 

Tocam os sinos na torre da igreja,
Há rosmaninho e alecrim pelo chão.
Na nossa aldeia que Deus a proteja!
Vai passando a procissão.

 

Pelas janelas, as mães e as filhas,
As colchas ricas, formando troféu.
E os lindos rostos, por trás das mantilhas,
Parecem anjos que vieram do Céu!

 

Com o calor, o Prior aflito.
E o povo ajoelha ao passar o andor.
Não há na aldeia nada mais bonito
Que estes passeios de Nosso Senhor!

 

Tocam os sinos na torre da igreja,
Há rosmaninho e alecrim pelo chão.
Na nossa aldeia que Deus a proteja!
Já passou a procissão.

 

A nossa aldeia é uma cidade e não tem alecrim e rosmaninho pelo chão habitualmente. E eu sinto-lhe a falta do cheiro característico que me leva à infância. Também sinto falta de ver o poste ensebado com o valioso bacalhau lá no cimo para quem conseguisse trepaar. E a pólvora queimada. É o ingrediente que falta na minha memória para juntar ao rosmaninho e ao alecrim pisados pelos pés dos fiéis na procissão.

E saudades de mandar um foguete... outros tempos.

Mas a festa faz-se. E o cheiro é outro. Sobretudo o do odor de uma comunidade que sai corajosa e decidida.

O evangelho da semana fala de 10 homens que foram curados e rapidamente seguiram em frente a sua vida.

Apenas um voltou atrás de coração tocado, agradecido. Esse foi curado e salvo.

É-me impossível não pensar com expectativa na procissão de Domingo e no que significa. Para além de ser bonito e agradável à vista, precisa ser uma afirmação. Gostei desta coincidência do Evangelho.

Porque a primeira afirmação é a da Fé. Um gesto publico que é até de evangelização: “somos filhos de Deus, sabemos o segredo da vida e queremos partilhá-lo com o mundo, a começar nos nossos vizinhos”.

Este fim de semana podemos bem acrescentar uma procissão de gratidão. Não apenas um, mas todos voltam atrás. Reconhecidos pelo dom, pelo toque, pela cura.

Caminharemos certo que a confiança depositada no Senhor Jesus, trará respostas aos nossos anseios mais profundos. Cura para as mágoas. Perdão para o pecado. Cura para as feridas do passado. Aquelas que não contamos a ninguém e que assombram o coração nos dias cinzentos.

Caminharemos agradecidos. Caminharemos como comunidade que quer crescer.

Falámos ontem dos 425 anos da paróquia. Mudou tudo. A história da paróquia parece familiar, mas ao mesmo tempo completamente outra.

Ontem ao ouvir o Hermínio Nunes (grande estrela do Caxarias F.C.), contar como foi a restauração da festa da Padroeira, dei por mim a pensar que até a nossa igreja é outra.

É a mesma, mas outra! Ganhou luz, as vozes são mais percetíveis. Ganhou caras novas. Ganhou sotaques novos. Agora temos açúcar e canela nas vogais!

Mas caminhamos na mesma direcção: uma igreja missionária. Que se reconhece curada, que caminha em busca de cura. Que se sente transformada e quer transformar o mundo, a começar por cada um de nós.

Sonho com uma comunidade tão viva no dia a dia quanto a procissão que arrasta multidões.

Sonho com uma comunidade que queira processionar e que não fique satisfeita em assistir à procissão. Há tanto talento, potencial e ideias que devem ser aproveitados e colocados a render, por si e pelos outros.

Hoje rezo por todos nós.

Domingo levarei o Santo Lenho nas mãos e conto falar ao Senhor de cada um de vocês. Agradecerei, falarei das vossas lutas, das vossas vitórias. Dir-lhe-ei o quão extraordinária esta comunidade pode ser quando descobrir que é capaz de dizer sim ao convite que O Senhor nos faz.

Pe. Patrício Oliveira