A paróquia da Marinha Grande “Abraça a Cruz” nesta Quaresma

A nossa Paróquia recebeu de braços abertos uma réplica da Cruz Peregrina das Jornadas Mundiais da Juventude nos dias 14 e 15 de fevereiro de 2024.
O Serviço Diocesano da Pastoral Juvenil (SDPJ) lançou a proposta “Abraça a Cruz”, desafiando as vigararias e as paróquias a receberem esta Cruz, com o propósito de ajudar a viver a Quaresma, de reunir a comunidade e claro, de relembrar os momentos marcantes dos Dias nas Dioceses e da JMJ de Lisboa 2023. Foram muitos os momentos especiais recordados pelos presentes, ao escutarem e dançarem o Hino oficial da JMJ, no início da celebração da Quarta-feira de Cinzas.
A eucaristia teve início na rua, convidando a comunidade não apenas a carregar aquela Cruz, mas também a “abraçá-la”, não necessariamente aquela, mas a cruz de Jesus, que, por cada um de nós, abraçou a cruz que nos salva. E ao abraçar a cruz todos juntos, em comunidade, cada uma das nossas cruzes fica mais leve.
Este apelo ao sentido de comunidade, de entreajuda, foi também concretizado pelo pedido que cada um levasse um bem alimentar para o ofertório, que posteriormente foi entregue à Conferência de São Vicente de Paulo local.
No dia seguinte, dia 15, meditamos a Via Sacra com a ajuda dos textos da Via Sacra da JMJ de Lisboa 2023. As estações foram dinamizadas pelos diversos movimentos e serviços da paróquia: pastoral juvenil, Alpha, comissão da igreja, comité organizador local da JMJ, acólitos, movimento da Mensagem de Fátima, grupo de jovens que participaram na JMJ, secretariado da catequese, cursilhos de Cristandade, JOC, leitores, ministros da comunhão, escuteiros, catequese da infância e da adolescência e Conferência de São Vicente de Paulo.  Dos mais novos aos mais velhos, ninguém ficou indiferente aos temas que foram abordados nas meditações: futuro incerto, guerras, bullying, solidão, intolerância, escravidão, individualismo, entre outros. Seja qual for o problema que enfrentamos, as meditações deixam-nos uma mensagem de esperança, que podemos sempre olhar para Jesus e imaginá-Lo a dizer a cada um de nós: “Caio contigo para te levantar comigo. Vá, procura ajuda, põe-te de pé e avança. Vamos juntos.”

Rita Francisco

Receber a réplica da cruz das JMJ na minha paróquia foi, para mim, uma enorme emoção.
À alegria de recordar o amor de Jesus que morreu por nós, acresceu o sentimento inexplicável de relembrar a alegria e a fé que partilhei com tantos outros jovens durante a semana em Lisboa. Na minha opinião, não havia forma melhor de iniciar a quaresma do que junto a uma cruz tão especial e significativa, tanto para mim como para tantos jovens.
A celebração da quarta-feira de cinzas também me foi muito especial enquanto acólita, visto ter tido a oportunidade de transmitir às pessoas a importância de nos arrependermos e de acreditar no evangelho, por meio da imposição das cinzas, tendo sentido, assim, a partilha de uma mesma fé ao assinalá-las com o sinal da cruz.

Mariana Confraria

Peregrinação Surfistas no Amor

Vindos de vários grupos da nossa paróquia, aceitamos o desafio de peregrinar com outros adolescentes como Surfistas no amor e de nos mantermos firmes na onda que é Jesus. Em Espírito de Amor e partilha com outros grupos, caminhámos, rezamos, pensámos, cantámos e dançámos com os Missio, percorremos o santuário com dinâmicas, voltamos cansados mas de coração cheio.

Durante todo o dia a alegria o convívio fez-nos sentir mais próximos de Deus e parte de uma igreja viva e em que afinal existem muitos jovens dispostos a aceitar Jesus como nossa Onda.

Matilde: Que dia, experiência incrível! Obrigada, que venham mais desafios. Um dia inesquecível, cheio de momentos únicos!

Violeta: O dia de ontem foi inesquecível! Cheio de amor e companheirismo. Fez-me ver como somos uma comunidade de adolescentes católicos grande e cheia de amor a Deus e ao próximo.

Isabel Santos

Vem Ver + 2.0: para jovens que procuram o sentido da vida

No próximo dia 24 de fevereiro realiza-se mais um encontro Vem Ver + 2.0!
E se tens entre 14 anos (9º ano) e 30 anos isto é para ti. Irá ser no Seminário de Leiria, das 9h30 às 16h30.

O Seminário de Leiria oferece sopa e pão. Traz alguma coisa para partilhar connosco. Para te inscreveres, acede a este link: http://l-f.pt/PugF

O que precisas de saber sobre estes encontros? Que são destinados para jovens que procuram o sentido das suas vidas, que pretendem ter um dia para parar e terem a oportunidade de olhar para dentro, para aquilo que são e aquilo que Deus espera deles!

Por isso, se te inscreveres, estás a um passo de VER +! Queres saber o que é? VEM e arrisca e verás que não te vais arrepender.


Mas é sempre melhor ter a perspetiva daqueles que já participaram por isso deixamos aqui alguns testemunhos de jovens que participaram no primeiro encontro!

Quem sou eu? Qual o meu propósito? O que queres de mim Senhor? Estas são algumas perguntas que a certa altura assolam a cabeça da maior parte das pessoas, incluindo a minha. Há já algum tempo que me inquietam estas questões e foi com elas no pensamento e no coração que aceitei o desafio do Seminário Diocesano de Leiria e me juntei a mais alguns jovens para Ver +. O primeiro encontro deste desafio aconteceu no sábado passado e que bom que foi! Entre o convívio e a reflexão, houve silêncio. Por vezes é mesmo disto que precisamos para responder ao que o nosso coração pergunta. Junto a Cristo, em silêncio, tivemos espaço e tempo para fazer todas as perguntas que queríamos e para ouvir todas as respostas que estivemos dispostos a ouvir. Claro que não saí de lá cheia de certezas, talvez até tenha saído com mais perguntas. Mas saí com o ouvido mais afinado para ouvir as respostas e o coração mais aberto para as acolher.
Inês Gaspar, Colmeias, 26 anos

Participar, pela primeira vez, no encontro “Vem ver +” foi para mim uma grande alegria. Depois de deixar a vida religiosa há algum tempo, ter esta possibilidade de me poder reencontrar e reorganizar espiritualmente é de facto uma grande graça. Agradeço o convite e a possibilidade de ter estado lá, o mais difícil é agora, viver segundo a vontade do Pai. Rezem por mim! Nuno Azinheira, Fátima, 24 anos
O encontro “Vem ver +” realizado no passado dia 2 de dezembro, foi mesmo isso: um encontro com Jesus! Recordar a emoção vivida na JMJ Lisboa 2023, com a homilia do Papa no Parque Eduardo VII, na abertura das jornadas, foi sem dúvida um dos pontos altos do dia: ser lembrada que Jesus nos chama pelo nosso próprio nome, e que chama “todos, todos, todos”. Acho que para além de um encontro em que podemos conhecer novas pessoas, e caminhar com elas na fé, foi um encontro de Escutar o que Ele quer de nós e nos quer dizer. Um encontro de discernimento e até mesmo aprendizagem sobre nós próprios, pois é ali a contemplar o Santíssimo, a falar com Jesus e a tirarmos as nossas máscaras, angústias e/ou tristezas diante d’Ele, que nos reencontramos e voltamos a sentir o Seu amor por nós. As brincadeiras e o convívio também estiveram presentes, e sem dúvida que foi um encontro que deixou uma marca nos jovens que participaram. É uma ótima proposta para quem quer conhecer mais e aprofundar a sua fé.
Inês Carreira, Fátima, 25 anos

Foi um dia incrível, onde não dei pelo passar das horas. Com atividades espetaculares. Com pessoas incríveis. Com bastante riso e divertimento. Onde deu para esquecer os problemas por estar rodeada de pessoas ótimas e divertidas. Tudo neste dia foi ótimo e incrível, menos a parte de ir embora. Este encontro fez-me ver que aprender com Deus não é só ir à missa e à catequese, mas também haver estas dinâmicas de aprendizagem com Deus, com os testemunhos com a partilha, com música etc. Tenho muito a agradecer ao padre Rui Ruivo, ao seminarista Miguel Francisco e a todos que contribuíram para este evento acontecer, adorei este dia e gostaria que houvesse mais atividades como esta. Com toda a certeza que quero vir aos próximos eventos como este. E sim digo a Deus “eis-me aqui”.
Marisa Brás, Ortigosa, 14 anos

Mensagem de D. José Ornelas para a Quaresma de 2024

Livres, pelo Batismo, como Filhos e Filhas do Pai do Céu

Iniciamos, nesta Quarta-Feira de Cinzas, o caminho da Quaresma que nos conduz à Páscoa da libertação e da vida, por obra do Espírito do Senhor Jesus, morto e ressuscitado. É um tempo de caminho, de preparação, de dar consistência aos projetos, aos sonhos, à esperança. 

Tudo isso é simbolizado por duas imagens ligadas ao deserto, ao número 40 e à água que muda a vida: A primeira é a do deserto percorrido, durante 40 anos, pelo povo de Israel deixando para trás a escravidão do Egito, a caminho da terra da liberdade, da dignidade e da esperança. A segunda é a de Jesus, movido pelo Espírito, que passa 40 dias no deserto, no encontro orante com o Pai e no discernimento da sua missão. Em ambas as imagens, há um sinal fundamental ligado à água, que revela uma transição de vida e de perspetivas de futuro e cada uma tem um guia e mestre: na primeira é Moisés, na segunda é Jesus 1.

O deserto do encontro com o Deus da libertação

A primeira imagem é-nos apresentada sobretudo pelo livro do Êxodo (cf. especialmente os capítulos Ex 1-24 e 32-34), que narra a intervenção salvadora de Deus, que se revelou a Moisés e o enviou para libertar o seu povo da escravatura em que se encontrava no Egito. A Moisés, Deus diz: 7 Eu bem vi a opressão do meu povo que está no Egito, e ouvi o seu clamor aflito diante dos seus capatazes; conheço, na verdade, os seus sofrimentos. 8 Desci a fim de o libertar da mão dos egípcios e de o fazer subir desta terra para uma terra boa e espaçosa, para uma terra que mana leite e mel… 10 E agora, vai; Eu te envio ao faraó, e faz sair do Egito o meu povo, os filhos de Israel.” (Ex 3,7-10).

Na solidão do deserto, o pastor Moisés, escuta a voz de Deus, que lhe faz sentir que o grito de aflição do povo escravizado chegou até Ele e que vem libertá-lo. Moisés aprende que Deus não fica longe do grito de aflição dos injustiçados e escravizados. É a partir desse encontro que ele se sente chamado: a solidão imensa do deserto é povoada por Deus, que se faz presente porque decide agir através de Moisés. Por isso, a libertação será toda de Deus, mas tornar-se-á realidade através da liderança e da palavra proferida, em Seu nome, por Moisés.

Este é o primeiro sentido da nossa Quaresma: o encontro Tu a tu, com Deus. Ele conhece-nos melhor que nós mesmos. Moisés fala pouco, mas escuta muito, por isso, terá algo de novo e de válido para comunicar ao seu povo. Assim deve ser a nossa oração, nesta Quaresma e sempre: terá espaços e tempos em família e em comunidade, mas não pode prescindir do silêncio do encontro com o Pai do Céu, para escutar o que Ele tem a nos dizer e para olhar a vida como Ele a vê. O deserto desse encontro vital não precisa de ser um deserto de areia:  pode ter lugar no silêncio do nosso quarto ou de uma igreja, num passeio tranquilo… mas não nos esqueçamos que Ele está próximo, mesmo no meio do rebuliço da cidade, no ruido dos robôs da fábrica, no silêncio pesado de uma sala de exames, na aflição das urgências hospitalares. Em qualquer espaço ou situação, Deus continua a dizer, como a Moisés: “Eu ouvi… Eu vi… Eu conheço… Eu desci para libertar… Vai, liberta!”. Daí há de nascer a nossa missão e o nosso compromisso, como aconteceu com Moisés, com Maria, com os apóstolos e com tantos e tantas ao longo dos séculos, que, a partir do deserto fecundo do encontro com Deus, encontraram a força e a luz para transformar-se e transformar o mundo. 

O deserto do encontro com Deus, tem também de nos deixar inquietos, de nos mover à compaixão libertadora tornando-nos sensíveis à situação da nossa família e da Igreja, bem como aos dramas concretos das multidões vítimas de perseguição e injustiça, da fome, da guerra, da degradação do nosso planeta. O deserto do encontro com Deus não é um refúgio cómodo, estéril ou alienante diante da realidade da vida, mas tem de ser povoado pela realidade que nos rodeia, tentando vê-la com os olhos de Deus.

O encontro de Moisés com Deus no deserto terá consequências para todo o povo, como libertação e como aprendizagem e preparação, para viver como povo na terra da promessa. Guiados por Moisés, o chamado e enviado de Deus, os israelitas puseram-se a caminho e foram acompanhados e salvos pela ação prodigiosa de Deus, na passagem do mar (cf. Ex 14), cujas águas, significaram o fim da escravidão e começo do caminho do deserto que leva à liberdade, à constituição de um povo, com dignidade, justiça e solidariedade: o povo de Deus, com o qual Ele celebrou uma aliança eterna.

Caminhar no deserto não foi fácil nem linear. O caminho entre a libertação do Egito e a formação de um povo e de uma nação consagrada a Deus, numa terra própria é um deserto de avanços e recuos, de confiança, de dúvidas e de oposições. Em todo esse percurso, através de Moisés, Deus foi dando constantemente rumo e força a Israel, mesmo quando este sentia “saudade” do tempo da escravidão e se rebelava ou desanimava pelo caminho. Apesar da infidelidade do povo, Deus permaneceu fiel, porque é “Deus misericordioso e clemente, lento para a ira e cheio de misericórdia e de fidelidade” (Ex 34,6).  

A nossa Quaresma recorda, não apenas a história de Israel, mas também a história pessoal, familiar, e da nossa comunidade Igreja, como lugares e tempos em que experimentámos fracassos, erros e desvios, mas igualmente a presença inabalável da fidelidade amorosa de Deus, a força renovadora da água com que fomos libertados e integrados na Sua família, e sobretudo a presença renovadora do Seu Espírito que torna possível retomar, com nova confiança e coragem, o caminho a que fomos chamados. É tempo de recordar, de agradecer, de traçar caminhos de coerência e de futuro.

Impelido pelo Espírito, Jesus discerne, no deserto, o projeto do Pai

Jesus tem bem presente a memória e a esperança do seu povo e associa-se aos israelitas que respondem à pregação de João Batista e se fazem batizar no rio Jordão, como sinal de mudança de vida e como expressão de disponibilidade para colaborar na transformação que essa mudança significava.

Mas traz algo de mais vital, libertador e transformador. Representa o cuidado de Deus que “Vê, ouve e conhece” a situação dolorosa do seu povo e da humanidade, com que se revelara a Moisés. Mas, em Jesus, é presença autêntica de Deus no seio da humanidade, para refazê-la pelo Espírito. É isso que testemunha a voz do Pai, na presença do Espírito, quando Jesus sai da água do Jordão: “Este é o Meu Filho muito amado, o Meu Escolhido” (Mc 1,9-11). 

Estas palavras são dirigidas a cada pessoa que, pelo batismo, recebe o Espírito de Jesus: “tu és meu filho querido… minha filha querida”. É essa passagem pela água do batismo, prefigurada pelas águas do mar, no tempo de Moisés, que nos permite responder também a Deus, como nos diz S. Paulo: “Vós não recebestes um Espírito que vos escravize e volte a encher-vos de medo; mas recebestes um Espírito que faz de vós filhos. É por Ele que clamamos: Abbá, ó Pai” (Rm 8,15). Sem deixar de ser parte desta humanidade, fomos transformados com um princípio vital novo, que é da natureza do Deus vivo e imortal. É pelo Seu Espírito que nos vamos transformando e aprendendo a viver ao ritmo de Deus, guiados pelo exemplo de Jesus, o Seu Filho e nosso irmão.

Os 40 dias do deserto de Jesus têm um sentido novo e programático, para Ele e para os que o seguem. Ele é impelido e guiado pelo Espírito, para discernir, em comunhão com o Pai, qual é a Sua vontade (projeto) na missão pública que está a iniciar. Os evangelhos de Mateus e Lucas identificam o conteúdo desse tempo de discernimento, com três áreas que marcam a atitude de Jesus, no confronto com perspetivas humanas de vida, felicidade, sucesso. No seu buscar a vontade/projeto do Pai, Jesus deixa-se guiar pela Palavra que encontrava na Escritura e que iluminava o seu modo de pensar e de agir. Desse modo, Ele propõe-nos o sentido da nossa Quaresma e da nossa vida, como filhos e filhas de Deus. O primeiro meio para encontrar o nosso caminho é conhecer e viver a Palavra de Deus.

Fiel ao seu ser “Filho querido”, Jesus age segundo os critérios do Pai, e não dos critérios humanos de felicidade: riqueza, sucesso e poder. Por isso este confronto no deserto é presentado como modelador do nosso discernimento e busca do projeto de Deus para a nossa vida.

Jesus não se aproveita da própria posição e poder para acumular riqueza ou manipular pessoas – “Diz que estas pedras se tornem em pão” (Mt 4,3). Como Filho, Ele sabe que o Pai alimenta até as aves do céu (Mt 6,26) e que a felicidade dos filhos e filhas de Deus se nutre de “toda a Palavra que sai da boca de Deus”(Mt 4,4).

Não se deixa levar pela tentação efémera da vaidade e da fama, para se tornar uma “estrela” ofuscante e maravilhosa: “Deita-te daqui abaixo… os anjos suster-te-ão nas suas mãos” (Mt 4,6). Ele foi enviado pelo Pai, para realizar sinais e prodígios em favor dos que precisam e não para usar deles para se tornar grande. O grande milagre será estar ao lado dos que sofrem fome, sede e injustiça, partilhando as suas dores e dificuldades, multiplicando pão, saúde, vida, até entregar totalmente a sua vida em favor deles. Os sinais maravilhosos que realiza, servem para revelar o prodigioso amor do Pai pelos mais pequenos e carenciados.

Finalmente, Jesus rejeita totalmente a ideia de conquista do poder, que leva sempre a adorar os deuses do dinheiro, da violência, da guerra, da repressão: “Tudo isto te darei, se prostrado me adorares” (Mt 4,9). O Filho Jesus conhece e vive em comunhão com o Único Deus e Senhor. Os que se colocam em lugar de senhores para dominar os outros usurpam posições que não lhes pertencem: Há um único Senhor e Pai, “só a Ele adorarás e servirás”. A rutura de Jesus com a tentação corrupta do poder, para dominar e reprimir a liberdade dos filhos e filhas, é radical e sem conciliação: “O Filho do Homem não veio para ser servido, mas para servir e dar a sua vida em resgate pela multidão” (Mc 9,45). 

Como Filho do Pai do Céu, Jesus mostra-se livre em relação a tudo e a todos, até livre de Si próprio como homem e daquilo que poderia ser a “tentação” manipuladora do sucesso ou da dor, da glória ou da humilhação, da vida e da morte. Toda a sua vida tem um único sentido e um objetivo: trazer a todas as pessoas que o aceitem – porque Ele não obriga ninguém – a alegria, o amor e a vida do Pai do Céu. 

O caminho pelo qual Jesus se decide, a Quaresma do deserto não é negação da autoestima, ou uma vida de lamentações deprimentes. Também não quer ser uma via triunfante de conquista de troféus por meritocracia. É, pelo contrário, uma “Boa Notícia” de vida, de consciência de ser amado pelo Pai do Céu; de sentir-se irmão numa fraternidade sem muros nem exclusões; de multiplicação do pão da mesa, da dignidade, da educação, da ciência e dos outros dons de Deus para todos; de fundada esperança numa vida que não promete facilidades, mas que está nas mãos carinhosas e poderosas do Pai do Céu.

O Espírito que gera filhos e filhas de Deus, em Igreja

O deserto de Jesus, como Homem e Filho de Deus, é-nos oferecido como caminho de Quaresma e de vida em Igreja. Assumir o Espírito do nosso batismo, que nos torna filhos/as do Pai do Céu, em Jesus, torna-nos irmãos e irmãs uns dos outros. Não renunciamos à família onde nascemos, mas integramo-nos numa família alargada, nascida do mesmo Espírito de Jesus gratuitamente oferecido a todos. Uma Igreja que, no dizer do Papa Francisco em Fátima, se assemelha à capelinha da Cova da Iria: tem colunas para sustentar um teto que dá abrigo, mas não tem muros, de modo que esteja sempre aberta a todos, todos, todos.

O discernimento de Jesus no deserto, guia o nosso discernimento e prepara-nos para construir a Igreja em que nascemos pelo Batismo, como filhos e filhas de Deus e irmãos e irmãs uns dos outros. Nesta Igreja todos temos uma função e uma missão, desde o bebé que é levado ao batismo àquela pessoa de quem nos despedimos num funeral. É importante ser livres para entrar nesse deserto de comunhão com o Pai, e deixar que Ele nos guie na descoberta daquilo que Ele quer de nós. É importante que este encontro seja expressão do desejo de realizar esse projeto de Jesus a nosso respeito, rezando como Jesus nos ensinou – “seja feita a vossa vontade” – de coração livre para buscá-la e segui-la, com alegria e fidelidade.

A nossa Igreja está em caminho de renovação e conversão pastoral. Nesta altura, é particularmente importante a participação ativa de todos, em espírito sinodal, como foi apresentada na “Carta Pastoral” 2 do início deste ano pastoral. Deus conta com o papel de todos e de cada um, segundo a função que lhe pede na Igreja. Não fiquemos a ver, mas participemos ativamente no caminho sinodal da nossa Igreja.

Maria, a Mãe de Jesus e Mãe da Igreja, também nos guia com a sua atitude de disponibilidade, idêntica à de Jesus, para aderir ao projeto de Deus e para realizá-lo na sua vida. Ao anjo que transmite o convite de Deus, ela responde: “Eis a serva do Senhor, aconteça em mim segundo a tua palavra” (Lc 1,38).

A peregrinação diocesana a Fátima, a 16 e 17 de Março, é uma ocasião para renovar em nós a atitude de adesão meditada e assumida ao projeto de Deus de Maria e a sua prontidão para pô-la em prática partindo apressada para a montanha, levando Jesus ao seu povo e ao mundo.

Abertos à solidariedade fraterna com quem mais precisa

Um sinal de conversão quaresmal e de vida é a partilha dos dons que recebemos de Deus para atender às necessidades de quem precisa. Por isso se pede às pessoas e famílias que, em espírito de libertação solidária, se privem de algo de seu para acudir a essas situações de carência. Na nossa Diocese de Leiria-Fátima, costuma-se destinar o produto destas ofertas feitas nas paróquias, parte para uma situação no interior da nossa Diocese e outra para uma situação particularmente carenciada, na Igreja e no mundo.

Este ano as duas situações serão para os seguintes destinos:

a) Para a Cáritas Diocesana de Leiria-Fátima, a fim de acudir às necessidades das muitas pessoas que pedem auxílio;

b) Para acudir, através da Igreja na Palestina, aos desalojados da devastadora guerra que deixou dezenas de milhares de pessoas mortas e privou mais de 1 milhão de outras dos mais elementares bens de subsistência.

Que o Senhor abençoe e multiplique a vossa generosidade para com quem precisa!

Bom caminho de Quaresma, em direção à Páscoa do Senhor!

Leiria, 14-02-2024

† José Ornelas Carvalho
Bispo de Leiria-Fátima

Mensagem para o dia dos namorados

Comissão Episcopal do Laicado e Família

  1. Em termos cristãos e eclesiais, qualquer dinâmica pastoral ou mensagem pastoral digna deste nome tem de ter sempre como trampolim a Palavra de Deus recolhida na Escritura Santa, que traz até nós o testemunhorendilhado da mão de Deus na nossa vida, nas nossas mãos, no nosso rosto, no nosso coração, no nosso sangue, na nossa cultura, na nossa linguagem, no nosso quotidiano.

  2. É assim que chega até nós a atestação de que «Deus é amor» (1 João 4,8 e 16) e «nos amou primeiro» (1 João 4,19). Considerando o mundo cultural de Platão e Aristóteles, dizer que Deus ama é entrar no domínio do absurdo, pois, segundo este tipo de pensamento, Deus pode ser amado, mas não amar. E dizer agora que Deus ama primeiro, é afirmar que Deus ama gratuitamente, com um amor gratuito e descensional, o que significa ainda que a razão do amor de Deus reside em Deus, e não naqueles sobre quem recai o seu amor. Entenda-se semelhante paradoxo: o infinito caudal do amor que há em Deus, e de Deus brota, é sem retorno, não existe em ordem à sua autorrealização ou autossatisfação mediante a escolha dos destinatários desse amor entre os mais belos, os mais ricos, os mais amáveis (que é o horizonte em que o nosso mundo se movimenta), mas procura a felicidade de todos, sobretudo dos mais pobres, necessitados e fracos, e alarga-se aos estrangeiros e inimigos.

  3. Se é assim, se «Deus é amor» (1 João 4,8 e 16), e «nos amou primeiro» (1 João 4,19), a toada do amor que há em nós «vem de Deus» (1 João 4,7), e «nós amamos, porque Deus nos amou primeiro» (1 João 4,19). Então, o amor que está aqui, o amor que está aí, o amor que está em mim, o amor que está em ti, o amor que está em nós, «vem de Deus» (1 João 4,7), e «quem ama nasceu de Deus» (1 João 4,7) e «de Deus foi gerado» (João 1,13). Deus amou-nos primeiro, ama-nos e continua a amar-nos sempre primeiro com amor-perfeito, isto é, amor preveniente, concomitante, fiel, consequente, permanente. Ama-nos a nós, que estamos aqui, e foi assim que nós começámos a amar. Se não tivéssemos sido amados primeiro, e não tivéssemos recebido o testemunho do amor, não teríamos começado a amar, e nem sequer estaríamos aqui, porque «quem não ama, permanece na morte» (1 João 3,14). Portanto, quem não ama vai em sentido contrário, ou em sentido nenhum, sem sentido, atraído, fascinado e seduzido pela morte (cf. Sabedoria 1,16; 15,6), escolhendo a morte em detrimento da vida (cf. Deuteronómio 30,19). Significa isto que a morte a que aqui se refere a Escritura Santa não é apenas o termo da vida biológica ou psicobiológica, mas aquilo que, desde o começo, impede de nascer para a vida verdadeira e para o amor. E o que é que te impede de nascer para a vida verdadeira e para o amor? É seguramente o que te impede de amar, de sair de ti, da tua prisão interior, cela interior, autossuficiência, autorreferência, tu, encadeado pelas leis da natureza, ao mesmo tempo dono e escravo de ti mesmo, pura idolatria, opressão maior do que a do Egito, que também impedia de nascer (Êxodo 1,16.22).

  4. A tartaruga acaba de deixar o seu esconderijo para um passeio noturno. O sapo vê-a sair de casa àquela hora, e adverte-a: «A esta hora não é muito aconselhável sair, tartaruga». Mas a tartaruga continua, e, arriscando um passo mais longo, vê-se virada de patas para o ar, sobre a sua própria couraça. O sapo exclama: «Eu bem te avisei, tartaruga; é uma imprudência sair a esta hora; morrerás aí!». «Bem sei», respondeu a tartaruga com um olhar entre a malícia e a delícia; «Bem sei, mas é a primeira vez que estou a ver o céu estrelado!». A tartaruga ensina que não nos podemos contentar em viver mais ou menos tranquilamente com a cabeça enterrada na areia do céu ou da terra.

  5. Sair de casa como a tartaruga, extasiar-se e desviar-se do caminho como Moisés para ver a visão grande e nova daquela sarça que ardia, mas não se consumia (Êxodo 3,2-3), ouvir a voz daquela chama que chama (Êxodo 3,4)! Aí está a maravilha que nos excede, que nos acende os olhos e o coração. Por isso, cantamos; por isso, contamos; por isso, repetimos e trauteamos, não por monotonia, nem por mera pedagogia, mas porque a maravilha reclama a poesia. Bem sabemos, de resto, que a humanidade não está destinada a morrer por falta de conhecimento, mas por falta de assombro e de maravilha. O mundo que atravessamos parece todo escuro, desencantado, sem Deus e sem profetas, sem amor, sem pais nem mães, filhos e irmãos, sem namorados. Só com armas e soldados!

  6. É preciso urgentemente trazer de volta a Palavra de Deus: «Tu és bela, minha amada,/ terrível como um exército em ordem de batalha» (Cântico dos Cânticos 6,4), que não nos deixa na presença de um amor banal, de plástico, de bolso, enlatado, mas de um amor que faz estremecer e implica o risco de morrer. O amor verdadeiro é agónico. Implica luta, porque implica decisões a todo o momento. Quando o amor não é agónico, então é egoísta. E, sintomaticamente, no mundo bíblico, a nascente do mal não reside na paixão, no coração que bate forte, mas no coração duro, empedernido, empedrado, esclerosado, um «coração de pedra», oxímoro vertiginoso que o profeta Ezequiel usou para classificar o coração empedernido e embotado de Israel (Ezequiel 36,26).

  7. Habitados por um coração de pedra! Alles in Ordnung [«tudo em ordem»] pode dizer-se apenas das lápides no cemitério! Se o matrimónio é indissolúvel, não é porque a lei de Deus proíba de o romper, mas porque o amor é fiel eternamente. Amar não é só estar apaixonado. Estar apaixonado não significa necessariamente amar. Estar apaixonado é um estado; amar é um ato. Sofre-se um estado; decide-se um ato. É, por isso, que o Deus da Escritura manda amar. Se amar fosse simplesmente apaixonar-se, tal mandamento seria um absurdo, pois ninguém pode exigir a alguém que se apaixone. Amar é uma sucessão de atos em cadeia: uma guerra, portanto. Não é por acaso que agápê (amor) e agôn (luta) podem ter a mesma etimologia. Paradoxo do amor, que é uma luta, a luta do amor, do amor novo, que não é contra ninguém, mas a favor de todos: o amor faz-te feliz, matando-te! Quanto mais amas, lutas, e te matas a amar, mais te encontras: «Quem quiser salvar a sua vida, perdê-la-á; ao contrário, quem perder a sua vida por causa de mim, salvá-la-á» (Lucas 9,24). Aí está o verdadeiro ícone do amor, Jesus Cristo, que não se salvou a si mesmo para me salvar a mim e a ti.

  8. Atravessamos hoje uma cultura solipsista e narcisista, que traz consigo, como obsessão dominante, viver cada um no seu naco de tempo e para si mesmo, descurando quer as gerações precedentes quer as seguintes, verificando-se assim uma acentuada perda de sentido de integração numa sucessão de gerações, numa família, numa comunidade, numa Igreja, valorizando-se em vez disso cada vez mais o sacrossanto direito de cada um à sua própria realização pessoal, sem implicar compromissos. Na verdade, vendo bem, estamos rodeados de homens e mulheres que se recusam a tornar-se adultos, e, por isso, negligenciam a tarefa mais importante de um adulto, que é preparar a nova geração para poder assumir o seu lugar no mundo.

  9. Sede felizes, jovens enamorados! Acolhei o amor de Deus, e, no meio de tantas guerras, empenhai-vos vós na guerra do amor!

«Não é conveniente que o homem esteja só».Cuidar do doente, cuidando das relações

MENSAGEM DE SUA SANTIDADE PAPA FRANCISCO
PARA O XXXII DIA MUNDIAL DO DOENTE
(11 de fevereiro de 2024)

 «Não é conveniente que o homem esteja só» (Gn 2,18). Desde o início, Deus, que é amor, criou o ser humano para a comunhão, inscrevendo no seu íntimo a dimensão das relações. Assim a nossa vida, plasmada à imagem da Trindade, é chamada a realizar-se plenamente no dinamismo das relações, da amizade e do amor mútuo. Fomos criados para estar juntos, não sozinhos. E precisamente porque este projeto de comunhão está inscrito tão profundamente no coração humano, a experiência do abandono e da solidão atemoriza-nos e olhamo-la como dolorosa e até desumana. E isto agrava-se ainda mais no tempo da fragilidade, da incerteza e da insegurança, causadas muitas vezes pelo aparecimento dalguma doença grave.

Penso, por exemplo, em todos aqueles que permaneceram terrivelmente sós durante a pandemia de Covid-19: pacientes que não podiam receber visitas, mas também enfermeiros, médicos e pessoal auxiliar, todos sobrecarregados de trabalho e confinados em repartições isoladas. E não esqueçamos quantos tiveram de enfrentar sozinhos a hora da morte, assistidos pelos profissionais de saúde, mas longe das suas famílias.

Ao mesmo tempo associo-me, pesaroso, à condição de sofrimento e solidão de quantos, por causa da guerra e suas trágicas consequências, se encontram sem apoio nem assistência: a guerra é a mais terrível das doenças sociais e as pessoas mais frágeis pagam-lhe o preço mais alto.

Contudo, é preciso assinalar que, mesmo nos países que gozam da paz e de maiores recursos, o tempo da velhice e da doença é vivido frequentemente na solidão e, por vezes, até no abandono. Esta triste realidade é consequência sobretudo da cultura do individualismo, que exalta a produção a todo o custo e cultiva o mito da eficiência, tornando-se indiferente e até implacável quando as pessoas já não têm as forças necessárias para lhe seguir o passo. Torna-se então cultura do descarte, na qual «as pessoas já não são vistas como um valor primário a respeitar e tutelar, especialmente se são pobres ou deficientes, se “ainda não servem” (como os nascituros) ou “já não servem” (como os idosos)» (Francisco, Carta enc. Fratelli tutti, 18). Esta lógica permeia também, infelizmente, certas opções políticas, que não conseguem colocar no centro a dignidade da pessoa humana com as suas carências e nem sempre proporcionam as estratégias e recursos necessários para garantir a todo o ser humano o direito fundamental à saúde e o acesso aos cuidados médicos. Ao mesmo tempo, o abandono das pessoas frágeis e a sua solidão acabam favorecidos ainda pela redução dos cuidados médicos apenas aos serviços de saúde, sem serem sapientemente acompanhados por uma «aliança terapêutica» entre médico, paciente e familiar.

Faz-nos bem voltar a ouvir esta frase bíblica: «não é conveniente que o homem esteja só». É pronunciada por Deus ao início da criação, revelando-nos assim o significado profundo do seu projeto para a humanidade, mas ao mesmo tempo também a ferida mortal do pecado, que se introduz gerando suspeitas, fraturas, divisões e consequente isolamento. Este atinge a pessoa em todas as suas relações: com Deus, consigo mesma, com o outro, com a criação. Tal isolamento faz-nos perder o significado da existência, tira-nos a alegria do amor e faz-nos provar uma sensação opressiva de solidão nas sucessivas passagens cruciais da vida.

Irmãos e irmãs, o primeiro cuidado de que necessitamos na doença é uma proximidade cheia de compaixão e ternura. Por isso, cuidar do doente significa, antes de mais nada, cuidar das suas relações, de todas as suas relações: com Deus, com os outros – familiares, amigos, profissionais de saúde –, com a criação, consigo mesmo. É possível? Sim, é possível; e todos somos chamados a empenhar-nos para que tal aconteça. Olhemos para o ícone do Bom Samaritano (cf. Lc 10,25-37), contemplemos a sua capacidade de parar e aproximar-se, a ternura com que trata as feridas do irmão que sofre.

Recordemos esta verdade central da nossa vida: viemos ao mundo porque alguém nos acolheu, somos feitos para o amor, somos chamados à comunhão e à fraternidade. Esta dimensão do nosso ser sustém-nos sobretudo no tempo da doença e da fragilidade, e é a primeira terapia que todos, juntos, devemos adotar para curar as doenças da sociedade em que vivemos.

A vós que vos encontrais na doença, passageira ou crónica, quero dizer-vos: Não tenhais vergonha do vosso desejo de proximidade e ternura. Não o escondais e nunca penseis que sois um peso para os outros. A condição dos doentes convida-nos a todos a abrandar os ritmos exasperados em que estamos imersos e a reentrar em nós mesmos.

Nesta mudança de época que vivemos, especialmente nós, cristãos, somos chamados a adotar o olhar compassivo de Jesus. Cuidemos de quem sofre e está sozinho, porventura marginalizado e descartado. Com o amor mútuo que Cristo Senhor nos oferece na oração, especialmente na Eucaristia, tratemos das feridas da solidão e do isolamento. E deste modo cooperamos para contrastar a cultura do individualismo, da indiferença, do descarte e fazer crescer a cultura da ternura e da compaixão.

Os doentes, os frágeis, os pobres estão no coração da Igreja e devem estar também no centro das nossas solicitudes humanas e cuidados pastorais. Não o esqueçamos! E confiemo-nos a Maria Santíssima, Saúde dos Enfermos, pedindo-Lhe que interceda por nós e nos ajude a ser artífices de proximidade e de relações fraternas.

 

Roma – São João de Latrão, 10 de janeiro de 2024.

FRANCISCO

Através do deserto, Deus guia-nos para a liberdade

MENSAGEM DO PAPA FRANCISCO
PARA A QUARESMA DE 2024

 Queridos irmãos e irmãs!

Quando o nosso Deus Se revela, comunica liberdade: «Eu sou o Senhor, teu Deus, que te fiz sair da terra do Egipto, da casa da servidão» (Ex 20, 2). Assim inicia o Decálogo dado a Moisés no Monte Sinai. O povo sabe bem de que êxodo Deus está a falar: traz ainda gravada na sua carne a experiência da escravidão. Recebe as «dez palavras» no deserto como caminho de liberdade. Nós chamamos-lhes «mandamentos», fazendo ressaltar a força amorosa com que Deus educa o seu povo; mas, de facto, a chamada para a liberdade constitui um vigoroso apelo. Não se reduz a um mero acontecimento, mas amadurece ao longo dum caminho. Como Israel no deserto tinha ainda dentro de si o Egito (vemo-lo muitas vezes lamentar a falta do passado e murmurar contra o céu e contra Moisés), também hoje o povo de Deus traz dentro de si vínculos opressivos que deve optar por abandonar. Damo-nos conta disto, quando nos falta a esperança e vagueamos na vida como em terra desolada, sem uma terra prometida para a qual tendermos juntos. A Quaresma é o tempo de graça em que o deserto volta a ser – como anuncia o profeta Oseias – o lugar do primeiro amor (cf. Os 2, 16-17). Deus educa o seu povo, para que saia das suas escravidões e experimente a passagem da morte à vida. Como um esposo, atrai-nos novamente a Si e sussurra ao nosso coração palavras de amor.

O êxodo da escravidão para a liberdade não é um caminho abstrato. A fim de ser concreta também a nossa Quaresma, o primeiro passo é querer ver a realidade. Quando o Senhor, da sarça ardente, atraiu Moisés e lhe falou, revelou-Se logo como um Deus que vê e sobretudo escuta: «Eu bem vi a opressão do meu povo que está no Egito, e ouvi o seu clamor diante dos seus inspetores; conheço, na verdade, os seus sofrimentos. Desci a fim de o libertar das mãos dos egípcios e de o fazer subir desta terra para uma terra boa e espaçosa, para uma terra que mana leite e mel» (Ex 3, 7-8). Também hoje o grito de tantos irmãos e irmãs oprimidos chega ao céu. Perguntemo-nos: E chega também a nós? Mexe connosco? Comove-nos? Há muitos fatores que nos afastam uns dos outros, negando a fraternidade que originariamente nos une.

Na minha viagem a Lampedusa, à globalização da indiferença contrapus duas perguntas, que se tornam cada vez mais atuais: «Onde estás?» (Gn 3, 9) e «Onde está o teu irmão?» (Gn 4, 9). O caminho quaresmal será concreto, se, voltando a ouvir tais perguntas, confessarmos que hoje ainda estamos sob o domínio do Faraó. É um domínio que nos deixa exaustos e insensíveis. É um modelo de crescimento que nos divide e nos rouba o futuro. A terra, o ar e a água estão poluídos por ele, mas as próprias almas acabam contaminadas por tal domínio. De facto, embora a nossa libertação tenha começado com o Batismo, permanece em nós uma inexplicável nostalgia da escravatura. É como uma atração para a segurança das coisas já vistas, em detrimento da liberdade.

Quero apontar-vos, na narração do Êxodo, um detalhe de não pequena importância: é Deus que vê, que Se comove e que liberta, não é Israel que o pede. Com efeito, o Faraó extingue também os sonhos, rouba o céu, faz parecer imutável um mundo onde a dignidade é espezinhada e os vínculos autênticos são negados. Por outras palavras, o Faraó consegue vincular-nos a ele. Perguntemo-nos: Desejo um mundo novo? E estou disposto a desligar-me dos compromissos com o velho? O testemunho de muitos irmãos bispos e dum grande número de agentes de paz e justiça convence-me cada vez mais de que aquilo que é preciso denunciar é um défice de esperança. Trata-se de um impedimento a sonhar, um grito mudo que chega ao céu e comove o coração de Deus. Assemelha-se àquela nostalgia da escravidão que paralisa Israel no deserto, impedindo-o de avançar. O êxodo pode ser interrompido: não se explicaria doutro modo porque é que tendo uma humanidade chegado ao limiar da fraternidade universal e a níveis de progresso científico, técnico, cultural e jurídico capazes de garantir a todos a dignidade, tateie ainda na escuridão das desigualdades e dos conflitos.

Deus não Se cansou de nós. Acolhamos a Quaresma como o tempo forte em que a sua Palavra nos é novamente dirigida: «Eu sou o Senhor, teu Deus, que te fiz sair da terra do Egipto, da casa da servidão» (Ex 20, 2). É tempo de conversão, tempo de liberdade. O próprio Jesus, como recordamos anualmente no primeiro domingo da Quaresma, foi impelido pelo Espírito para o deserto a fim de ser posto à prova na sua liberdade. Durante quarenta dias, tê-Lo-emos diante dos nossos olhos e connosco: é o Filho encarnado. Ao contrário do Faraó, Deus não quer súbditos, mas filhos. O deserto é o espaço onde a nossa liberdade pode amadurecer numa decisão pessoal de não voltar a cair na escravidão. Na Quaresma, encontramos novos critérios de juízo e uma comunidade com a qual avançar por um caminho nunca percorrido.

Isto comporta uma luta: assim no-lo dizem claramente o livro do Êxodo e as tentações de Jesus no deserto. Com efeito, à voz de Deus, que diz «Tu és o meu Filho amado» (Mc 1, 11) e «não haverá para ti outros deuses na minha presença» (Ex 20, 3), contrapõem-se as mentiras do inimigo. Mais temíveis que o Faraó são os ídolos: poderíamos considerá-los como a voz do inimigo dentro de nós. Poder tudo, ser louvado por todos, levar a melhor sobre todos: todo o ser humano sente dentro de si a sedução desta mentira. É uma velha estrada. Assim podemos apegar-nos ao dinheiro, a certos projetos, ideias, objetivos, à nossa posição, a uma tradição, até mesmo a algumas pessoas. Em vez de nos pôr em movimento, paralisar-nos-ão. Em vez de nos fazer encontrar, contrapor-nos-ão. Mas existe uma nova humanidade, o povo dos pequeninos e humildes que não cedeu ao fascínio da mentira. Enquanto os ídolos tornam mudos, cegos, surdos, imóveis aqueles que os servem (cf. Sal 115, 4-8), os pobres em espírito estão imediatamente disponíveis e prontos: uma força silenciosa de bem que cuida e sustenta o mundo.

É tempo de agir e, na Quaresma, agir é também parar: parar em oração, para acolher a Palavra de Deus, e parar como o Samaritano em presença do irmão ferido. O amor de Deus e o do próximo formam um único amor. Não ter outros deuses é parar na presença de Deus, junto da carne do próximo. Por isso, oração, esmola e jejum não são três exercícios independentes, mas um único movimento de abertura, de esvaziamento: lancemos fora os ídolos que nos tornam pesados, fora os apegos que nos aprisionam. Então o coração atrofiado e isolado despertará. Para isso há que diminuir a velocidade e parar. Assim a dimensão contemplativa da vida, que a Quaresma nos fará reencontrar, mobilizará novas energias. Na presença de Deus, tornamo-nos irmãs e irmãos, sentimos os outros com nova intensidade: em vez de ameaças e de inimigos encontramos companheiras e companheiros de viagem. Tal é o sonho de Deus, a terra prometida para a qual tendemos, quando saímos da escravidão.

A forma sinodal da Igreja, que estamos a redescobrir e cultivar nestes anos, sugere que a Quaresma seja também tempo de decisões comunitárias, de pequenas e grandes opções contracorrente, capazes de modificar a vida quotidiana das pessoas e a vida de toda uma coletividade: os hábitos nas compras, o cuidado com a criação, a inclusão de quem não é visto ou é desprezado. Convido toda a comunidade cristã a fazer isto: oferecer aos seus fiéis momentos para repensarem os estilos de vida; reservar um tempo para verificarem a sua presença no território e o contributo que oferecem para o tornar melhor. Ai se a penitência cristã fosse como aquela que deixou Jesus triste! Também a nós diz Ele: «Não mostreis um ar sombrio, como os hipócritas, que desfiguram o rosto para que os outros vejam que eles jejuam» (Mt 6, 16). Pelo contrário, veja-se a alegria nos rostos, sinta-se o perfume da liberdade, irradie aquele amor que faz novas todas as coisas, a começar das mais pequenas e próximas. Isto pode acontecer em toda a comunidade cristã.

Na medida em que esta Quaresma for de conversão, a humanidade extraviada sentirá um estremeção de criatividade: o lampejar duma nova esperança. Quero dizer-vos, como aos jovens que encontrei em Lisboa no verão passado: «Procurai e arriscai; sim, procurai e arriscai. Neste momento histórico, os desafios são enormes, os gemidos dolorosos: estamos a viver uma terceira guerra mundial feita aos pedaços. Mas abracemos o risco de pensar que não estamos numa agonia, mas num parto; não no fim, mas no início dum grande espetáculo. E é preciso coragem para pensar assim» ( Discurso aos estudantes universitários, 03/VIII/2023). É a coragem da conversão, da saída da escravidão. A fé e a caridade guiam pela mão esta esperança menina. Ensinam-na a caminhar e, ao mesmo tempo, ela puxa-as para a frente. [1]

Abençoo-vos a todos vós e ao vosso caminho quaresmal.

Roma – São João de Latrão, no I Domingo do Advento, 3 de dezembro de 2023.

FRANCISCO

 

[1] Cf. Charles Péguy, Il portico del mistero della seconda virtù, Milão 1978, 17-19.

Visita à prisão de Leiria

No passado dia 06 de janeiro os “Samaritanos” associação de fiéis visitadores dos Estabelecimentos Prisionais de Leiria, juntamente, com o capelão, padre Jorge Fernandes, o nosso vigário paroquial, apresentaram os seus cumprimentos/votos de um bom ano de 2024 aos jovens reclusos e entregaram uma pequena lembrança a todos os reclusos. Esta dinâmica foi antecipada de um encontro e atividade com os jovens reclusos que os sensibilizava para o sentido do Natal e o nascimento de Jesus para as suas vidas.

Este ano tivemos a alegria de poder contar com a presença de alguns adultos, jovens e adolescentes da nossa paroquia que aceitaram o desafio de conhecerem de mais perto a realidade do que é a prisão e quem são os presos.

O resultado foi muito positivo e motivador para ambos os lados: presos e visitadores e, como resultado desta ação, fica o testemunho da Mariana e da Maria Inês:

No decorrer do projetoPés quentes” tivemos a oportunidade de, no passado dia 6 de janeiro, visitar os reclusos do Estabelecimento Prisional de Leiria para Jovens, entregando-lhes os donativos angariados e transmitindo mensagens de esperança e alegria para o ano que se inicia. Para nós, esta foi uma oportunidade única de interação e partilha. Todos os reclusos a quem entregámos uma pequena lembrança e com quem conversámos foram dinâmicos e interessados em ouvir a mensagem que trazíamos sobre Cristo, questionando-nos e apresentando as suas próprias perspetivas.

Foi uma experiência enriquecedora e positiva!”.

 

A celebração do quinto Domingo da Palavra de Deus, instituído pelo Papa Francisco em 30 de setembro de 2019, será realizada em 21 de janeiro de 2024. O lema desta edição foi tirado do Evangelho de João: "Permanecei na minha Palavra" (Jo 8,31). No domingo, dia 21 de janeiro, às 9h30 hora italiana, (05h30 hora do Brasil), o Papa presidirá a celebração eucarística na Basílica de São Pedro e, em seguida, com o objetivo de reavivar a responsabilidade que os fiéis têm no conhecimento da Sagrada Escritura, presenteará os participantes da Missa com o Evangelho de Marcos.

Os ministérios de Leitor e Catequista serão conferidos a leigos

Durante a celebração, os ministérios de Leitor e Catequista serão conferidos a homens e mulheres leigos, em particular duas pessoas receberão o ministério de Leitor e nove o de Catequista. Os fiéis leigos representam o povo de Deus e vêm do Brasil, Bolívia, Coreia, Chade, Alemanha e Antilhas. A Missa será transmitida ao vivo, com comentários em português, através do nosso site e dos nossos canais no YouTube e no Facebook.

Subsídio litúrgico-pastoral gratuito 

O setor para as questões fundamentais da evangelização no mundo do Dicastério para a Evangelização, encarregado pelo Papa de promover o evento, disponibilizou online um subsídio litúrgico-pastoral gratuito, útil para a vivência da Palavra de Deus e da oração na comunidade, na família e pessoalmente. O texto, disponível este ano somente em versão digital, pode ser baixado on-line em italiano, inglês, espanhol, português, francês e polonês no site www.evangelizatio.va. Uma ferramenta que oferece propostas para incentivar um encontro profundo com a Palavra de Deus na comunidade, na família e na vida cotidiana, além de incluir artigos, meditações, textos para Adoração e sugestões pastorais.

O "Ano da Oração"

No Domingo da Palavra de Deus, espera-se que o Papa estabeleça oficialmente o Ano da Oração, em preparação para o Jubileu de 2025. Depois de promover a reflexão sobre os documentos e o estudo dos frutos do Concílio Vaticano II em 2023, por vontade do Papa Francisco, 2024 será dedicado, nas dioceses do mundo, a redescobrir a centralidade da oração.