A Irmã Susana continua a aventura Romana do Jubileu dos Jovens, pelo que a minha semana foi desafiante e ocupada, confesso não ter tido tempo para me sentar a pensar na vida.
Mas penso na Irmã Susana e nos miúdos e no Tiramisú que sei que eles já comeram e na pontinha d inveja de não ser jovem como eles.
Mas penso sobretudo nela e no desafio de ser uma galinha a cuidar dos pintainhos na Cidade Eterna, conhecendo bem eu aquele pintainhos.
A pensar neste desafio maternal, cruzei-me com um artigo que partilho convosco. Pareceu-me interessante e desafiador, a meio da leitura quase desisti da ideia, mas que “diacho!”, talvez seja mesmo o desafio necessário.
Até porque os miúdos andam por lá a trocar coisas também. Já vão perceber.
Amar os filhos sem lhes dar coisas
Sei que pareço má mãe quando eles não têm dossiers e mochilas novas quando querem. Mas acredito que valorizam o compromisso que temos, enquanto família, para com a sustentabilidade e os destinos do planeta.
Às vezes, aos olhos dos outros, sou uma má mãe. Porque não compro ao meu filho mais velho um casaco bom para o frio, camisolas e calças novas para a minha filha adolescente, uma caneca barata do Benfica para o pequenino, de 5 anos, que a pediu e não tem uma caneca com o seu nome como os irmãos.
É difícil dizer que não a uma criança. Sobretudo quando insiste. E sobretudo quando o que pede aparenta ser (quase) uma necessidade prática. E mais ainda quando essa criança é um filho nosso que se porta bem e merece e tudo o mais.
Mas a verdade é que acabo sempre por me arrepender xmuito mais quando cedo do que quando resisto por fidelidade aos meus princípios. Por exemplo, cedi no Natal, quando ofereci ao meu filhote mais novo um “panda de peluche gigante”, como ele tinha pedido na sua lista de presentes, apesar de eu achar que era uma prenda pateta, à qual ele ia deixar de achar graça rapidamente, que iria ficar só a apanhar pó aos pés da cama sem servir para nada. E infelizmente, assim foi. Não lhe quis dar o desgosto de não receber o panda gigante, mas arrependi-me. É mais um brinquedo que é como se fosse lixo antes de o ser, pois está para ali sem que se brinque com ele, só pelo capricho de uma criança que viu um peluche semelhante no quarto de um amigo e quis ter um também. Mãe tola, que não soube arranjar uma estratégia para dar a volta à coisa, em vez de contribuir para a loucura de consumismo e desperdício que é, atualmente, o Natal
Melhor fiz quando ele pediu a caneca do Benfica e eu lhe disse que não.
– Porquê, mãe?
– Porque cá em casa não compramos coisas de que não precisamos.
– Mas eu preciso, porque não tenho nenhuma caneca minha, mãe.
– Não “precisas”. Tu “queres”, que é diferente. Não precisas realmente de uma caneca só tua, quando no armário temos umas 15 canecas diferentes, que podes usar.
Mas…
… e mas e mas. A argumentação continuou, ao longo de vários dias, até que ele desistiu e deixou de pensar no assunto. E eis que então aparece uma caneca nova na cozinha. Nova, mas velha, pois veio de um saco cheio de loiça e talheres que, juntamente com dezenas de outros sacos, vasos e cadeiras, eu trouxe de uma casa que fui ajudar a esvaziar. Era da minha antiga vizinha de baixo, que agora foi para um lar e que deixou centenas de milhares de objetos na casa onde viveu, sozinha, toda a vida. É uma caneca amarela com flores brancas, que o Tomé viu no armário e que adorou:
– Pode ficar para mim, mãe?
– Sim, boa ideia, de agora em diante será a Tua caneca.
Ficou radiante, aos pulos, não se lembrando nem remotamente que um dia tinha querido tanto, tanto, uma caneca do Benfica.
E foi este episódio que me deu a ideia de escrever este artigo. Porque precisamos sempre de nos lembrar que a grande maioria das nossas prementes “necessidades” são só caprichos, e basta esperar um pouco para que se resolvam. Ou porque acabamos por nos esquecer delas, dada a sua insignificância, ou porque, com criatividade, arranjaremos outra forma de as resolver. Feiras de garagem, lojas e sites de vendas em segunda mão, mensagens para amigos e conhecidos que sabemos que têm filhos um pouco mais velhos do que os nossos e que ficarão todos contentes por passarem para outra casa a roupa que já ficou pequena.
Há anos e anos que não compro roupa nova, nem para mim, nem para os meus filhos, tirando os ténis de desporto federado. E recebo tantos sacos de roupa “herdada”, por parte de colegas meus de trabalho, pais de amigos dos filhos, etc, que vos garanto que nunca há falta lá em casa e eles até têm muito por onde escolher. Mas é preciso ter um bocado de lata (e sei que para algumas pessoas não é fácil esta iniciativa de andar a pedir roupa aos colegas e afins), fazer desta atitude rotina e cultivar nos filhos este espírito, fazendo-os compreender o porquê. Compreender que cada uma das coisas que compramos (e poderíamos não comprar) é mais um objeto cuja produção teve um custo ecológico enorme (7.000 litros de água só para umas calças de ganga, por exemplo) e que irá acabar por atolar em lixo a nossa Casa Comum.
Saber o porquê e assumir hábitos anti-consumistas leva a que os nossos filhos, quando precisam de algo novo, saibam que o procedimento é: mãe, pode mandar mensagens a pedir roupa para eu herdar? No espaço de uma semana, no máximo, haverá calças e camisolas novas, casacos e pijamas, garantindo uma economia circular em vez de contribuirmos para a lógica da extração, produção, poluição e desperdício que tão bem foi retratada no recente documentário: “Buy Now! The shopping conspiracy”, que aconselho todos a ver na Netflix.
À semelhança da roupa, também toda a mobília da minha casa (incluindo os quartos dos miúdos) e até de um anexo que remodelei foi herdada, apanhada na rua, restaurada (por mim ou por carpinteiros) ou comprada em segunda mão. O olhar nosso sobre um candeeiro recuperado, uma porta a que foi dada nova vida ou um beliche comprado no OLX é de ternura e orgulho. O olhar deles, dos filhos, é de naturalidade. É claro que a minha cama não foi comprada nova! É claro que, quando preciso de algo para o quarto (uma nova prateleira, uma nova cadeira, uma nova secretária), vou procurar numa feirinha ou no OLX. Nem outra coisa faria sentido.
Sei que pareço má mãe quando eles não têm dossiers novos e mochilas novas quando querem. Quando as festas de anos lá em casa não são temáticas e não estão cheias de balões e decorações a condizer. Mas acredito que eles valorizam o compromisso coletivo que temos, enquanto família, para com a sustentabilidade e com os destinos do nosso planeta. Será o deles, muito mais do que o meu, pois são eles que têm a vida toda pela frente.
Joana Rigato, no site www.pontosj.pt