Pequeno pormenor

Esta semana noto um padrão à minha volta, um padrão positivo, um tom de esperança.

O vizinho Joaquim falava de esperança na segunda-feira. A irmã Susana celebrou 30 anos de consagração e dos seus votos. A Agência Ecclesia deu nota deste título: “Papa indica atitude «caridosa, compreensiva e paciente», em relação a desafios atuais, aos participantes de um congresso na Colômbia[1]”. E ontem a memória de S. Pio X.

A nota no missal Romano dizia:

Pio X nasceu na aldeia de Riese, na região de Veneza, em 1835. Depois de ter desempenhado santamente o ministério sacerdotal, foi bispo de Mântua e patriarca de Veneza. Em 1903 foi eleito papa. Adotou como lema do seu pontificado «instaurar todas as coisas em Cristo», ideal que orientou o seu pontificado. No motu próprio Tra le sollecitudini (1903) afirma que a participação nos santos mistérios é a fonte primeira e indispensável da vida cristã. Incentivou os fiéis a intensificar esta vida com a participação na Eucaristia, a dignidade da sagrada liturgia e a integridade da doutrina. Morreu no dia 20 de agosto de 1914.

Efectivamente no início do Século XX, já o pai do Joaquim tinha 3 anos, o panorama da participação na vida da Igreja era bastante diferente do que conhecemos hoje.
Foi um tempo marcado pelo século XIX, ateísmo comunista, secularização, perseguições, filosofias nihilistas, etc, criaram um ambiente bastante difícil.
De modo especial a participação nos sacramentos, Eucaristia, comunhão, era reduzida.
Assim de grosso modo: “ia-se pouco”, comungar era ainda mais reduzido. Daí a referência do trabalho de Pio X em intensificar a participação na Eucaristia, a dignidade da sagrada liturgia e a integridade da doutrina.

Pensava justamente nesta memória de como o mundo e o nosso ambiente mudou. É certo que 100 anos, é muito tempo, mas ao mesmo tempo é relativo. Os minutos de qualquer das minhas homilias fazem qualquer pessoa achar que os 100 anos do século XX foram rápidos. E quando olhamos a história como um todo, chegamos ao hoje e aqui bem depressa.

Apesar das dificuldades culturais, dos ateísmos, perseguições, houve também simultânea e estranhamente movimentos que cresceram e frutificaram ora cem, ora sessenta, ora trinta[2].

Começou o movimento ecuménico, e de modo muito especial o litúrgico.
Numa altura que parecia de derrota, um burburinho de confiança germinou e foi ganhando força, quase silenciosa, mas crescente e determinada.
Tudo isto levou à enorme revolução do Concílio Vaticano II e o resto já vocês conhecem.
Pensemos na origem do Concílio, uma ideia peregrina de um Papa, João XXIII, que era tido como um Papa de passagem.

Penso na quantidade de pequeninas coisas que foram moldado a história, que foram sendo instrumentos de Deus.
Hoje vivemos em tempos também eles conturbados, são de crise que é uma palavra assustadora para dizer de oportunidade e de Graça, porque não dizê-lo?

É verdade que somos esmagados por tanto que não controlamos e é mais forte que nós, gente humilde que não joga no tabuleiro da globalização. Mas lá diz a voz do povo: se achas que és demasiado pequeno para fazer a diferença, pensa numa melga que te visita de noite.

Não seremos nós chamados à esperança, à perseverança? A reconhecer que somos todos, todos, todos, chamados a sermos Pedras Vivas, mesmo que pequeninas? E a pedra no sapato faz muita diferença.

Voltar a olhar a beleza dos Sacramentos, a Eucaristia como fonte e lugar privilegiado de Graça e encontro com Deus, com e nos irmãos. Não como um preceito obrigatório, mas como oportunidade, onde somos chamados a participar com os olhos da Fé.

 

Imagem que esta semana comungam de olhos fechados, não é o Patrício, ou um ministro extra-ordinário, é o próprio Jesus que se coloca na palma da mão. Como comungar só com uma mão ou à pressa e sem reverência?

Devíamos todos de tremer na fila da comunhão, de temor, de entusiasmo, antecipação, mas cheios de confiança.

Um exame de consciência honesto, consciente. Uma confissão de coração aberto.

Pequeninas pedras que fazem a diferença em nós e na nossa vida e com ela, na grande construção que é a nossa família, a paróquia comunidade, a cidade e o mundo!

Olhemos com esperança, com confiança os sinais dos tempos. Vamos conscientes da dificuldades, dos desafios e das responsabilidades, mas certos e confiantes da misericórdia, da paciência e do Amor de Deus. De coração aberto à acção do Espírito Santo.

Pe. Patrício Oliveira

1] XVII Congresso Internacional de Teologia Moral
[2] Mt 13, 23

E um poema da cultura Pink/Rock portuguesa:

Pequeno Pormenor

Pequenas coisas que faltam na vida
Tornam-se as grandes incompletas
Pequenas coisas fazem parte
Não te esqueças
A grande ponte para lado nenhum
Fica distante da pequena estrada
Esburacada, onde arriscas a vida
necessáriamente
E se tudo é um todo
E o todo é que importa
Não ponhas de lado
Aquilo que falta

Mesmo que não tenhas tempo
Pensa o que tens a fazer
Mede bem a importância
Dum pequeno pormenor
Um parafuso no foquetão
Um beijo ao deitar, um papel no chão
Uma prenda com cartão, um voto aqui
Ali um não

A justiça em grande faz sombra à pequena
Frágil, diária de todos
Tantas pequenas injustiças
tornam falso o sistema
A pequena dor nunca aliviada
Nas filas de espera do grande hospital
torna a doer, mesmo que te digam
vais ser atendido mais lá pro outro natal

Se tudo é um todo
E o todo é que importa
Não ponhas de lado
Aquilo que falta

Mesmo que não tenhas tempo
Pensa o que tens a fazer
Mede bem a importância
Dum pequeno pormenor
Um parafuso no foquetão
Um beijo ao deitar, um papel no chão
Uma prenda com cartão, um voto aqui
Ali um não