O Papa Francisco ficou extremamente doente… fiquei triste. Apesar de não ser médica e acreditar em Deus e no poder do Espírito Santo sabia que era grave. Foram muitos dias a “correr” para a televisão, para os jornais e para a internet para saber do seu estado de saúde. Melhorou e teve alta. Visivelmente debilitado, apesar de eu nunca o ter verbalizado, sabia que poderia não resistir, o que veio a acontecer no passado dia 21 de abril. Chorei imenso. Senti-me órfã de pai. Este foi para mim um sofrimento estranho acompanhado de uma acalmia igualmente diferente porque conclui: agora descansa meu pai; estás junto do Senhor com a tua rosa branca, que tanto gostavas: a pandemia (COVID), as guerras em vários países do mundo, os escândalos de pedofilia dentro da igreja que fez questão, e bem, de colocar à tona da água e a sua frágil e débil saúde tiraram-lhe a vida terrena.
Decorreram vários dias em que me senti órfã. Acompanhei, em direto, em casa ou no local de trabalho, através do @vaticannewspt, todas as notícias referentes ao seu funeral. Fui rezando, desejava-lhe a paz que tanto merecia. Após o Papa João Paulo II, o Papa Francisco, foi o meu Papa de referência (tinha o sonho, ingénuo, de lhe falar pessoalmente na companhia de um grande amigo). Deixou tudo o que pretendia escrito, morreu desprovido de bens terrenos e até encontrou um benfeitor para pagar as despesas da construção do seu túmulo para não gastar as verbas da Santa Sé.
Acompanhei todas as notícias de como iria decorrer a eleição do novo Papa, os prazos que tinham de decorrer, quando começaria o conclave, tudo, tudo, tudo.
No primeiro dia de conclave, dia 7 de maio, senti que seria impossível a maioria da votação dos cardeais convergir num só homem (como referiu o nosso saudoso e brilhante Papa Francisco numa entrevista o “voto do primeiro dia de conclave é um voto de cortesia”). Mesmo assim estive em frente da televisão das 18h às 20h, hora em que a pequena e singela chaminé instalada no telhado da Capela Sistina, expeliu fumo preto.
No segundo dia de conclave tinha a ideia, quase, real de que o Espírito Santo iria guiar os 133 cardeais, que se encontravam encerrados na Capela Sistina, para uma votação. Enquanto trabalhava, com pouca atenção é certo, o coração batia forte, não me conseguia concentrar. O telemóvel colocado em cima da secretária para ver em direto as notícias do Vaticano. As horas passavam e o meu estado de ansiedade também. Chegou a tarde. A desatenção do trabalho era quase total; aí já coloquei os auriculares porque tinha de, além de ver as imagens, ouvir o que o Vaticano me ia informando. Às 17h07 vi o fumo branco a sair da chaminé mais observada pelo mundo inteiro. Tremi, dei um salto da cadeira, gritei baixinho Habemus Papam; chorei de alegria, ininterruptamente. Estranhei uma vez mais a minha reação. Nunca me tinha sentido assim. Pensei imenso no Papa Francisco e, inevitavelmente, no nosso cardeal Tolentino de Mendonça. Apesar de saber que não importava quem seria o mais votado, desde que seguisse, na minha opinião, as linhas orientadoras do trabalho desenvolvido previamente pelo Papa Francisco, para que não se observasse um retrocesso na nossa Igreja, inadvertidamente puxei a “brasa à nossa sardinha” e pensei “que orgulho seria ver aparecer o nosso cardeal na varanda da Basílica de São Pedro”. Chorei ainda mais. A hora seguinte pareceu-me demorar várias horas a passar, o choro continuava, rezava pelos pobres, pelos necessitados, por todos os doentes e por todos os que sofrem com as guerras. Também rezei pelo Papa Francisco e pelo novo Papa, que ainda nem sabia quem era. Pensava apenas que o cardeal eleito iria ter um fardo pesado, que iria viver em exclusivo para os outros, que iria ser o responsável máximo da igreja católica e que iria ter um trabalho árduo e sério pela frente.
A janela da Basílica abriu-se e o cardeal Dominique Mamberti anunciou em latim, "Annuntio vobis gaudium magnum: Habemus Papam"; posteriormente anunciou o seu nome: Robert Francis Prevost. Não percebi. Os jornalistas transmitiram que era americano. Sem querer dei por mim desiludida: americano?!…. Tenho a imagem, sempre presente, e que me aterroriza, de um homem totalmente desequilibrado, de seu nome Donald Trump, à frente dos destinos de uma grande potência que são os Estados Unidos da América (eu que abomino a ligação que algumas pessoas fazem entre a igreja e a política estou a fazer o mesmo em silêncio… mea culpa). E não é que o novo Papa é americano? E também não era o nosso cardeal Tolentino de Mendonça... Um dia antes tinha dito, em jeito de brincadeira, se o nosso cardeal Tolentino fosse o eleito, iria à boleia a Roma só para o ver e agraciar. Após terminar o choro e me acalmar pensei no ditado “Deus escreve direito por linhas tortas” e possivelmente por isso foi eleito um cardeal americano que escolheu para seu nome Papa Leão XIV. Comecei a ver a sua imagem na varanda da basílica, uma imagem doce, um homem extremamente emocionado, na tentativa de esconder o nervosismo e com um discurso maravilhoso em que retive algumas frases: “A paz esteja com todos vocês”, “Portanto, sem medo, unidos de mãos dadas com Deus e entre nós, sigamos em frente. Somos discípulos de Cristo. Cristo nos precede. O mundo precisa de sua luz. A humanidade precisa dele como ponte para ser alcançada por Deus e seu amor. Ajudai-nos também vós, e depois uns aos outros, a construir pontes, com o diálogo, com o encontro, unindo-nos a todos para sermos um só povo, sempre em paz. Obrigado, Papa Francisco!
Cativou-me de imediato. Esqueci que era americano. Esqueci que não era o nosso cardeal Tolentino. Era agora o meu e nosso Papa. O Papa de todos os cristãos católicos e por isso pensei que também tinha o dever de o ajudar no que fosse possível e estivesse ao meu alcance. Recomecei a chorar novamente de alegria e de emoção. Habemus Papam. Olhei para o telemóvel e constatei a única mensagem do meu pai, com duas palavras “É americano”. Estas palavras demonstravam desagrado e desilusão (importa referir que o meu pai tem uma imagem muito própria da igreja e que não é muito simpática…). Sentimentos que eu tinha vivenciado há poucos minutos, mas que consegui, com discernimento, pensar que estava incorreta. Tentei argumentar junto do meu pai mesmo sem conhecer o Papa Leão XIV. Agora que foi eleito temos de lhe dar tempo. Esperemos que tenha um longo e profícuo pontificado; que Deus e o Espírito Santo o acompanhem a carregar esta pesada cruz.
Não me lembro da eleição do Papa Francisco e tinha 40 anos. Recordo que nessa altura era um assunto que nada me dizia, tantos anos perdidos de felicidade, penso agora. Relembro agora com carinho todo o seu legado. O Papa Francisco soube ser forte quando necessário, justo, doce e meigo e desempenhar um excelente pontificado. Até as pessoas que se autodenominam ateus ficaram genuinamente tristes com a sua morte.
Na minha opinião o nosso Papa Leão XIV terá de ter coragem para não retroceder na procura constante do caminho de uma Igreja una, séria, acolhedora, que conforta, que esteja presente, uma Igreja de todos para todos, todos, todos. Também não nos podemos esquecer que é um chefe de um “microestado” e por isso deverá, sempre que possível, defender determinadas posições sempre em prol da paz e da igualdade entre os povos.
Não me lembro de ter tido tanto entusiasmo como no passado dia 8 de maio. Talvez quando o Papa João Paulo II veio a primeira vez a Portugal, em 1982, tinha eu 9 anos, também me tenha sentido assim. Tenho enormes lembranças desse momento transmitidas pelos meios de comunicação social. Há assuntos que mexem realmente connosco e com os nossos sentimentos e a eleição do Papa Leão XIV, para mim, foi um deles.
No meu coração, desde a eleição do Papa, que tenho uma voz que me continua a gritar constantemente Habemus Papam e que me deixa sempre emocionada. No meu telemóvel ouve-se música de louvor. Já não me sinto órfã. Não esqueci Francisco, como não esqueci João Paulo II, nem nunca esquecerei, mas agora tenho de ajudar o nosso Papa Leão XIV. Vamos arregaçar as mangas e colocarmo-nos à sua disposição e da nossa Igreja, obviamente numa dimensão mais reduzida que será a nossa paróquia. Estou de braços abertos e grito novamente Habemus Papam.
Quando olhei para o Papa Leão XIV pensei: este homem deixou de viver para ele, para os seus amigos, para a sua família, para os seus paroquianos, para as pessoas que ajudou enquanto missionário. Aceitou (desconheço se poderia recusar) ser o sucessor de Pedro com tudo o que isso implica. Estará exposto ao mundo, a sua vida será escrutinada pelos meios de comunicação social, vai ser alvo de julgamentos (já se houve falar da sua opinião acerca de determinados assuntos enquanto pôde ser o simples Padre Bob), vai ser alvo de cobranças, vai ter de servir e ser consumido por inteiro até chegar o momento da sua partida da terra. Mas também terá o direito de se sentir só e de sofrer. Irá viver para a mulher que é a Igreja e que também somos todos nós, cristãos, católicos. Que alegria, que coragem, que peso sobre um homem que apareceu na varanda da basílica e que escondia, com muita tranquilidade, os nervos que o estariam a assolar naquele momento. Espero que se rodeie dos melhores assessores para o ajudarem nesta árdua tarefa porque é demasiadamente pesada para um homem só.
Ainda não conheço o novo Papa. Os meios de comunicação social já procuram formar e transmitir ideias sobre o mesmo que não sabemos se são verdadeiras. Não quero ouvir. Não quero ser, mal, influenciada.
Já confio em ti Papa Leão XIV (peço-lhe desculpa em surdina por o estar a tratar com tanta proximidade). Meu Deus, por favor, acompanha-o nesta caminhada. Espírito Santo auxilia-o com o discernimento necessário na tomada de decisões, que deverão ser tantas.
Habemus Papam!
Até sempre Papa Francisco. Benvindo Papa Leão XIV!
Ana Umbelina Silva
Marinha Grande, 9 de maio de 2025