Mínimos Olímpicos

Ninguém gosta de obrigações, nem de fazer o que seja por obrigação. Movemos mundos e fundos por alguém, damo-nos sem medida e sem pesar o cansaço quando é oferta gratuita, dom da nossa generosidade, sinal do carinho e do amor que nos une aos que nos são queridos. Mas, obrigatório? Bem chegam os impostos!

Sinto que esta é uma das maiores lutas que a Igreja enfrenta. Educar pelo obrigatório, pelo que sim, que se traduzia no famoso: “enquanto viveres debaixo do meu teto fazes o que eu te mandar”. Cria imunidade. E podemos bem ter imunizado demasiadas gerações.

Mas o contrário também não é bom, uma vez mais, no meio estará a virtude. Porque ele há dias de manhã que uma pessoa se precisa obrigar, a sair da cama, a enfrentar o dia e a vida. Se esperarmos por inspiração, que esteja mesmo a apetecer, então não vamos longe.

Ouvi o Joe Rogan dizer que não é a inspiração que nos move e que nos alcança sucesso, é a disciplina. Ele falava do seu programa de treino “Há dias em que acordamos cheios de energia, com vontade e o treino é óptimo e corre bem. Mas esses dias são a minoria. Na esmagadora maioria dos dias, não apetece, estamos cansados, temos sonos ou outra desculpa válida. É a disciplina que faz a diferença”.

De algum modo, somos nós que abraçamos a obrigatoriedade na medida em que percebemos que para chegar mais longe, temos que nos colocar a caminho.

É este salto interior que sinto que falta à nossa catequese, à nossa pratica dominical. De algum modo somos capazes de fazer uma lista de coisas que temos que fazer em ordem a ser católico comprometido e regular (o que quer que seja isso).

Diz o Catecismo:

II. Os preceitos da Igreja

2041. Os preceitos da Igreja inserem-se nesta linha duma vida moral ligada à vida litúrgica e nutrindo-se dela. O carácter obrigatório destas leis positivas, promulgadas pelas autoridades pastorais, tem por fim garantir aos fiéis o mínimo indispensável de espírito de oração e de esforço moral e de crescimento no amor a Deus e ao próximo. Os preceitos mais gerais da Igreja são cinco:

2042. O primeiro preceitoOuvir missa inteira e abster-se de trabalhos servis nos domingos e festas de guarda») exige aos fiéis que santifiquem o dia em que se comemora a ressurreição do Senhor, bem como as principais festas litúrgicas em honra dos mistérios do Senhor, da Bem-aventurada Virgem Maria e dos Santos, que a Igreja declara como sendo de preceito, sobretudo participando na celebração eucarística em que a comunidade cristã se reúne e descansando de trabalhos e ocupações que possam impedir a santificação desses dias (86).

O segundo preceitoConfessar-se ao menos uma vez em cada ano») assegura a preparação para a Eucaristia, mediante a recepção do sacramento da Reconciliação que continua a obra de conversão e perdão do Baptismo (87).

O terceiro preceitoComungar ao menos pela Páscoa da Ressurreição») garante um mínimo na recepção do Corpo e Sangue do Senhor, em ligação com as festas pascais, origem e centro da liturgia cristã (88).

2043. O quarto preceitoGuardar abstinência e jejuar nos dias determinados pela Igreja») assegura os dias de ascese e de penitência que nos preparam para as festas litúrgicas e contribuem para nos fazer adquirir domínio sobre os nossos instintos e a liberdade do coração (89).

O quinto preceitoprover as necessidades da Igreja, segundo os legítimos usos e costumes e as determinações») aponta ainda aos fiéis a obrigação de prover, às necessidades materiais da Igreja consoante as possibilidades de cada um (90).

 

Simples. Mas deixa-me cheio de comichão que isto seja os “mínimos olímpicos” pedidos. Então mas a gente agora contenta-se com os mínimos? Temos os miúdos aí de volta de exames e notas, ficamos felizes porque eles fizeram o mínimo ou queremos que se superem e possam alcançar o seu maior potencial?

Onde é que o padre quer chegar com isto, pergunta o leitor mais assíduo e perspicaz.

À vida sacramental, a Eucaristia (também como estilo de vida), a Confissão, a oração.

Agora que presido a todas as missas, sinto mais falta de pessoas. Até aqui achava que tinham ido à missa do padre Jorge.

E não se trata de apontar dedos, embora sinta falta dos acólitos todos e dos catequistas, e daqueles que me estão a mandar sms a dizer que vão a Fátima ou a outra que deu mais jeito.

A questão é que fazem falta na Missa e na Eucaristia (para quem ouviu no Corpo de Deus) da comunidade.

Não penso na questão da presença, ou da contagem de presenças. Mas na riqueza de uma Eucaristia que é da comunidade. E uma comunidade que quer mais que cumprir preceito.

Uma comunidade que cresce junta, porque entende a importância do laço, do estar presente. Mais do que ir à missa, cumprindo o preceito certinho, mas comprometendo a sua vida, o seu tempo, o seu dom na construção de algo especial aqui no nosso cantinho.

Acho que no fundo me incomoda a facilidade com que não sentimos falta de ir semanalmente, ou nos outros dias de preceito.

Não porque é obrigatório, mas porque me faz falta.

Porque mais do que tem de ser, é o “faz-me bem”.

Gente comprometida com o seu crescimento espiritual, humano, a sua relação com Deus, que se recusa perder uma oportunidade, de encontro, de Graça. Porque somos mais do que o que nos apetece, queremos ser aquilo que Deus sonhou para nós: Santos, inteiros, missionários.

E justamente quando o tempo escasseia, a vida parece virada do avesso, com turnos e actividades, o preceito semanal, traz ordem à vida. A semana organiza-se em torno da participação. Não porque é obrigatório, mas porque é saudável, porque queremos ser donos do nosso crescimento e não nos satisfazemos com migalhas.

Queremos fazer o mínimo para que o coração se alargue e dê espaço ao desejo do máximo, à medida do amor de Deus que morreu na cruz por mim e por cada um de vós.

 

Pe. Patricio Oliveira